Caixas reviradas, gavetas abertas, papéis espalhados, a mão na cabeça e aquela dúvida: onde coloquei minha carteira de trabalho? Já havia esgotado todos os locais possíveis e impossíveis que a bendita azulzinha poderia estar. A urgência de encontrar um documento importante, mas que não é usualmente solicitado, vinha de um pedido de demissão de um dos empregos. Como parte do processo de desligamento da empresa precisava apresentar o documento em no máximo três dias.

Tentei puxar na memória a última vez que a vi. Em vão. Minha esperança era a ter deixado com o departamento pessoal do último trabalho em que fui contratada.

– Bom dia! Por acaso a minha carteira de trabalho ficou aqui? – questionei esperançosa.

– Acredito que não, mas como tivemos troca de funcionários neste setor e uma recente reforma há a possibilidade de estar guardada em uma dessas caixas. – apontou para uma pilha de pastas lotadas de documentos antigos.

Desencorajei-me só de ver a quantidade de caixas, mas ainda sim procurei em algumas. Desisti. A rinite não permitia abrir uma pasta a mais. Me convenci que era hora de tirar a segunda via. Segui direto para o Ministério do Trabalho.

– Bom dia! – sorri pra atendente.

– Bom dia. – sem nenhuma expressão.

– Gostaria de tirar a segunda via da carteira de trabalho.

– O que aconteceu com a primeira?

– Perdi.

– Onde?

– Gostaria de saber também.

– Você fez o agendamento pela internet?

– Não. Precisa?

– Sim. Mas posso fazer pra você aqui no sistema.

– Ah, quero sim. Obrigada.

– Temos uma vaga para daqui 10 dias.

–  Dez dias? Moça, preciso disso essa semana.

– É a única data mais próxima. Mas se tem tanta urgência pode ir ao vapt vupt, eles fazem a solicitação sem precisar de agendamento.

– Certo. Muito obrigada.

No dia seguinte fui ao vapt vupt mais próximo da minha casa.

– Bom dia! – esperançosa.

– Bom dia. – sem nenhuma expressão.

– Gostaria de solicitar a segunda via da carteira de trabalho.

–  Onde está a primeira?

– Perdi.

– Trouxe todos os documentos? RG, CPF, comprovante de endereço, certidão de nascimento, boletim de ocorrência, número do PIS/PASEP?

– Hum, acho que não. – olhando dentro da bolsa.

– Então não tem como. Próóóóóóóóximo! – gritou.

Saí cabisbaixa. Se não sabia onde estava a carteira que fiz recentemente, imagina a certidão! Mas fui atrás do que faltava. Segui para a delegacia mais próxima. Que sorte! Apenas uma mulher na minha frente.

– Olá, tem muito tempo que a senhora está esperando? – ajeitando-me ao lado dela.

– Umas duas horas mais ou menos. – respondeu desanimada.

– Duas horas? – indignei-me.

– É um absurdo né, mas perdi todos os meus documentos. Agora é esperar.

Longínqua a voz de um funcionário chegava até a recepção: – Quem vem na delegacia não pode ter pressa!

“Era só o que me faltava ter que conformar com a lentidão dos serviços públicos” – pensei revirando os olhos. Uma hora e meia depois fui atendida.

– Olá!

– Olá!

– O que aconteceu?

– Perdi minha carteira de trabalho.

– Onde?

“Por que sempre essa pergunta? Claro que se eu soubesse não estaria aqui.” – apenas pensei.

– Não sei. – real resposta ao atendente.

– Preciso de um lugar mais exato pra colocar aqui no boletim. – sorriu.

– Então coloca perto da minha casa.

– Mas foi lá? – irônico.

– Não faço ideia, mas precisa colocar algum lugar, não é? – sem paciência

Em menos de dez minutos o procedimento foi concluído. De lá, passei na Caixa Econômica Federal e solicitei o número do meu PIS/PASEP. Uma hora de espera.

Agora faltava a certidão. Voltei para casa. Revirei as caixas novamente. Nada.

Liguei desesperada para a minha mãe, que seria a única alternativa de não ter que ir até a minha cidade natal, no cartório onde fui registrada, para tirar também a segunda via do documento.

– Mãe, pelo amor de Deus, a senhora guardou minha certidão de nascimento, não é mesmo?

– Não sei, já tem tantos anos que você nasceu. Mas posso procurar. – desligou sem me dar muita esperança.

Minutos depois ela retorna e a noticia é boa. A certidão estava lá. Ótimo. Contudo, não tinha mais tempo suficiente de ir buscá-la antes da reunião do desligamento. Teria que contar com a boa vontade do advogado da empresa de fazer o processo sem a carteira de trabalho. No início foi resistente, mas depois compreendeu. Me desliguei da empresa. Porém, a saga da segunda via só estava começando.

Três dias depois…

Coloquei todos os documentos solicitados para fazer a segunda via dentro de uma pastinha. Voltei ao vapt vupt confiante. Os 2.5 de miopia não me permitiram ler o cartaz que estava na porta. Aproximei-me já ficando nervosa com o que poderia estar escrito ali. Ao lado tinha uma atendente. O cartaz informava que o vapt vupt estava fechado para reforma. Com as mãos no rosto e sem acreditar naquilo reforcei a informação com a atendente:

– Que dia começou essa reforma? – quase exaltada.

– Hoje! – lixando as unhas.

– Qual a previsão pra terminar?

– Dizem que dez dias, mas você sabe como é reforma né. – respondeu sem nenhuma preocupação.

A vontade era de eu mesma ajudar a quebrar aquele lugar. Contive minha raiva e calada procurei outro vapt vupt.

– Olá! – sem nenhuma expressão.

– Bom dia! O que deseja?  – muito atenciosa.

– Gostaria de solicitar a segunda via da carteira de trabalho. – pela milésima vez.

– Aqui não emitimos. – sorriu.

– Como assim? – querendo chorar.

– Somente alguns vapt vupts fazem esse serviço. E aqui não faz. Tente outro lugar. – concluiu.

Não sabia se desistia de vez ou tomava isso como uma missão impossível para a minha vida. Persisti. 

No dia seguinte…

Acordei convicta que algo ia dar errado de novo. Já estava imaginando qual seria o próximo empecilho, o próximo atendimento péssimo, a próxima má resposta. Mas só porque fui preparada para ouvir que não daria certo, aconteceu o contrário. Enfrentei uma pequena fila, o atendente não me questionou onde perdi a carteira. Só pediu os documentos. Me entregou uma senha. Esperei meia hora. A funcionária realizou todo o processo em menos de dez minutos.

– Tudo pronto, moça. Daqui vinte dias pode voltar aqui e buscá-la. – entregando-me o papel da solicitação.

– Certeza? – sem acreditar.

– Sim. Está tudo certo. – confusa.

– Nossa! Muito obrigada. – radiante.

Pensei até jogar na mega sena, porque parecia ser meu dia de sorte.

Vinte dias depois…

– Bom dia! Vim buscar a segunda via da minha carteira de trabalho. – convicta.

– Bom dia. Só um instante. – pegou a solicitação e foi procurar em uma caixa.

A atendente volta de mãos vazias.

– Ainda não está pronta. Oriento vir aqui todos os dias para saber se chegou. Próóóóóximo!