O tradicional assalto à mão armada nas agências bancárias foi substituído por uma nova modalidade que assola Goiás: o uso de explosivos para roubo e furto de caixas eletrônicos. Só nos dois primeiros meses desse ano, os ataques já representam um aumento de 433,34% em relação ao mesmo período de 2012. O modus operandi não só coloca a segurança pública a um novo patamar de risco, como também expõe a fragilidade da fiscalização no uso de explosivos e a facilidade que os criminosos têm para obter este arsenal.
Apenas nos dois primeiros meses desse ano, somados ainda com os primeiros dias de março, já ocorreram 20 ataques a caixas eletrônicos no Estado. No ano passado, nos meses de janeiro, fevereiro e março, foram registradas 13 ocorrências. Se for comparar os dois primeiros meses do ano, 2013 registrou 16 casos, enquanto que no ano passado, foram apenas 3 ataques. O saldo final dos ataques a agências bancárias em 2012 é preocupante: das 117 notificações, 80 foram com o uso de explosivos. A maioria dos casos ocorreu nos municípios do interior.

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Alarmada, a Polícia Civil anunciou recentemente um reforço nas investigações a fim de estancar as ações. O delegado do Grupo Antirroubo a Bancos (GAP) da Delegacia Estadual de Investigações Criminais (Deic), Valdemir Pereira já se reuniu com representantes do Exército Brasileiro – responsável pela fiscalização da fabricação, o comércio e o uso de explosivos -, para traçar o mapa da onda de ataques.

Delegado - Valdemir PereiraPelo menos uma informação já deve servir como o ponto de partida para as investigações. De acordo com Valdemir, grande parte dos explosivos utilizados pelos criminosos é originária do extravio ou roubo às pedreiras, garimpos e obras. “Nós temos informações, por meio de investigações, que bananas dinamites estão saindo de pedreiras, por furtos ou por desvio de próprios funcionários, que passam isso para as quadrilhas”. Corre em sigilo a prisão de três integrantes de uma quadrilha especializada nos ataques a caixas eletrônicos. O delegado acredita que a partir dessas prisões, será possível identificar uma quadrilha.

A polícia também não descarta que os criminosos são de outros Estados, já que os crimes são semelhantes. “Já levantamos que bandidos dos Estados de São Paulo, de Minas Gerais e também da Bahia estão atacando o nosso Estado”.

Outro agravante constatado pela polícia é que a onda de ataques não é só interestadual, ela ultrapassa fronteiras internacionais. O delegado tem informações que as quadrilhas compram explosivos com facilidade no Paraguai. Em Pedro Juan Caballero, cidade paraguaia na fronteira com o Mato Grosso do Sul, criminosos encontram bananas de dinamite para comprar de vendedores em plena luz do dia.

Em Goiás, segundo levantamento do Exército, 80 quilos de dinamites, uma caixa de cordel detonante e espoletas foram parar nas mãos de criminosos em 2012. Os furtos aconteceram na zona rural de Formosa e no município de Cabeceiras. Porém, para se ter uma ideia que a nova modalidade criminosa ganhou força no Estado é que no mês passado, 10 ladrões renderam, de madrugada, funcionários de uma empresa de mineração em Cocalzinho, a 129 quilômetros de Goiânia, e levaram 75 quilos de dinamites, uma espoleta e dez metros de cordel detonante. A quantidade chega quase à registrada no ano passado pelo Exército – e isso só nos primeiros meses de 2013.

A polícia ainda não conseguiu identificar os assaltantes e, de acordo com o delegado da cidade, Aliomar Borges Correia, ele aguarda o resultado da perícia realizada no local da ocorrência. “Ainda não tivemos avanço. Não temos ideia de onde vieram os assaltantes. A gente aguarda o resultado da perícia para levantar se teve impressões digitais no local, se tivemos alguma felicidade de encontrar esses vestígios como as impressões digitais. Com elas é que a Polícia Civil vai confrontar com o banco de dados de criminosos que já agem dessa maneira”, explicou.

Outro fato curioso é que a maioria dos ataques ocorre em cidades pequenas, onde as agências bancárias não dispõem de grandes aparatos de segurança e contam com um número reduzido de seguranças e policiais. Alguns grupos chegam a acionar a polícia para relatar uma falsa ocorrência na área rural, para ter mais tempo de executar a ação criminosa na cidade.

Na delegacia de Cocalzinho, por exemplo, o delegado Aliomar se queixa da falta de agentes. Hoje ele conta apenas com dois agentes e um escrivão, que são responsáveis também pelas ocorrências do município de Alexânia.

Sindibrita - Flavio RassiFiscalização é falha
Pelas primeiras conversas com representantes do Exército Brasileiro, o delegado Valdemir explica que os roubos e os desvios nas empresas de mineração facilitam o acesso de criminosos aos explosivos. No ano passado, a Polícia Militar de Porangatu conseguiu desarticular um grupo que planejava explodir caixas eletrônicos no interior do Estado. Quem fornecia as dinamites era um funcionário de uma empresa que atua na construção de pontes.

Já o presidente do Sindicato das Indústrias Extrativas de Pedreiras do Estado de Goiás, o Sindibrita, Flávio Rassi discorda da constatação do delegado. “Eu posso te dizer que 90% dos casos não vêm da ponta, ou seja, das empresas de mineração. Podemos afirmar, com toda a certeza, que os explosivos são contrabandeados de países dessa fronteira seca”. Para ele, os explosivos vêm do mesmo lugar onde os criminosos conseguem armas de grosso calibre.

A afirmação de Flávio é embasada na forma como as empresas utilizam hoje os explosivos. De acordo com ele, nas pedreiras não se usa mais explosivos encartuchados, e sim um produto em forma de emulsão, bombeado a granel de caminhões-tanque, que reage com a adição de outro produto. “A pedreira prepara a perfuração da rocha e, no dia da detonação, o caminhão bombeia esse explosivo dentro do buraco. A detonação é feita em ato contínuo, no mesmo dia. É impossível isso ser utilizado contra os caixas eletrônicos”.

Flávio diz ainda que o produto em forma de emulsão não requer só conhecimento técnico dos criminosos, como também esbarra na impossibilidade física de utilizá-los, já que é necessário o caminhão-tanque e a perfuração do buraco. “Nas pedreiras de Goiás, o Exército e Polícia Federal podem confirmar que não tem bananas dinamites nos depósitos, não existe. Se alguém for nesses locais, não vai encontrar nada”.

Porém, como explicar o roubo ou desvio de dinamites nas pedreiras do Estado, como a que ocorreu em Cocalzinho? O presidente do sindicato justifica que se existe esse tipo de explosivo em outras pedreiras, elas não fazem parte do ramo de extração de britas.
Além disso, Flávio assegura que há um controle rígido por parte do Exército em relação à aquisição, ao transporte e ao uso de produtos explosivos. “São normas muito rígidas, o Exército é muito rígido na fiscalização, a Polícia Federal também tem a parte dela de controle. Eu vou te dizer que talvez o ramo mais fiscalizado seja o da mineração. Neste quesito de manuseio de explosivos, chega a ser absurda a quantidade de normas que nós temos que seguir”. Aproximadamente 35 pedreiras são cadastradas hoje no Sindibrita.

Exército promete intensificar fiscalização
Procurado pela reportagem da Rádio 730, o Exército informou que a fiscalização está sendo intensificada com a realização de operações interagências. Uma das medidas propostas pelo Exército é a alteração de multas, aumentando substancialmente os valores para dissuadir o ilícito com explosivos.

Outras alterações de controle de explosivos já foram publicadas no Diário Oficial da União, como a exigência de um plano de segurança por todas as empresas que exercem atividades com explosivos. O plano deve descrever todos os elementos do sistema de segurança, assim como abranger as instalações internas, as áreas de operação e as rotas de transporte.

Atualmente, as empresas precisam ainda ser cadastradas e licenciadas pelo Exército, além disso, em todas as compras é necessária a emissão de uma guia de tráfego. As empresas ainda devem fazer relatórios mensais ao Exército, listando tudo o que foi comprado e usado.