A cidade se expande cada vez mais e o fato é que o poder público está mais preocupado com o seu caixa e menos atento às necessidades sociais e urbanísticas. Em menos de um ano, as administrações goiana e goianiense tentam rifar 61 junto ao mercado imobiliário.

O pote de ouro almejado tem valores distintos, mas revelam cobiça semelhante. O Estado tem chances de abocanhar cerca de meio bilhão, enquanto o Paço de Goiânia algo em torno de R$ 250 milhões. É isso aí, quase um bilhão.

A justificativa é que as áreas seriam inservíveis à administração, mas de quebra poderiam engordar os erários, resultando em obras à comunidade. Anunciar um cadastro digital das áreas públicas ninguém propõe. A grita, geralmente, serve mais para demarcar terreno político partidário do que preservar as questões ambientais e sociais. O chumbo é grosso e municia a todos os envolvidos na busca por um naco do poder.

Exemplo deste cenário? Quando o Estado anunciou a relação das 43 áreas a serem desafetadas, quase que a Câmara dos Vereadores de Goiânia veio abaixo. Dois vereadores faltaram sair do plenário do Legislativo e insultar pessoalmente os dirigentes da administração estadual envolvidos na questão. A área do Batalhão Anhanguera foi estampada nas bandeiras desfraldadas em prol do meio ambiente, da sociedade e contra os supostos monstros de olhos vermelhos do setor imobiliário.

A convulsão foi tão grande, que os vereadores se uniram e aprovaram um lei que obriga a gestão estadual dizer ao Legislativo goianiense quando, como e por que venderá a área do Batalhão Anhanguera, caso o espaço vá à praça. Um deputado estadual, por sua vez, decidiu fazer cruzada e apresentou um projeto de lei estabelecendo a necessidade de se realizar audiência pública e estudo de impacto ambiental e social para a alienação de áreas públicas pertencentes ao Estado. Pelo projeto o Ministério Público Estadual (MPGO) e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) subseção de Goiás deverão ser informados do evento.

Agora, o município de Goiânia decide fazer de um tudo para comercializar 18 áreas devolutas e a grita é quase inaudível, apesar da similaridade dos fins. Confrontando os números, os quase 20 espaços públicos na capital renderão pouco mais da metade do que o Estado intenciona com suas 43 áreas. O que chama a atenção é que políticos de todos os matizes gritaram pelo solo militar em área urbana hipervalorizada.

Não se viu um desses políticos pedir explicações sobre um prédio com seis apartamentos de luxo em Belém (PA), ou mesmo, sobre as 11 salas comerciais na capital do Rio de Janeiro. Ninguém questionou sobre as áreas urbanas no interior, cuja maior parcela são lotes, com metragem médfia de 400 metros quadrados, dispersas por Anápolis, Itauçu, Paraúna e Goianira.

Mesmo assim, caso a curiosidade simples não aflorasse, os nobres políticos que se insurgiram outrora contra a negociação do público com o privado não se permitiram ficar desconfortáveis com a possibilidade de um espaço coletivo ser comercializado e uma comunidade perder o direito de ter uma praça, uma creche ou mesmo um hospital?

O que o município ganha em troca doando área para instituições públicas construírem suas sedes nababescas? A população, provavelmente, sabe o que perde ao ver o terreno próximo a sua comunidade se transformar em concessionário de veículos.

O assunto desafetação recepcionou o ano e, agora, está fechando o ano. Discutir o mérito, em ambas situações, é fazer prosperar o monólogo do desabafo sem qualquer reverberação nos ouvidos dos que já decidiram o que quer e pouco, ou quase nada, se permitem ouvir do coletivo. É preciso, neste instante, o cidadão eleitor, aquele que acha que somente é cidadão por que vota, descobrir e começar a praticar a cidadania da fiscalização e da cobrança. Dá trabalho, mas as gerações vindouras agradecem a não omissão.