Foi aprovada a Emenda Constitucional que aumenta o número de vereadores Embora envolvidos em situações que colocam em xeque sua imagem perante a população, os congressistas brasileiros parecem não temer o controverso e aprovaram duas Propostas de Emenda Constitucional (PECs) polêmicas. A primeira, PEC 333, aumenta o número de vereadores do país de um total de 51988 para 59611, justamente no momento em que as pessoas mais questionam a eficiência e a importância das casas legislativas. E, se por um lado o projeto aprovado sacia, ao menos em parte, a sede por cargos, por outro parece jogar para a plateia ao diminuir os gastos dos legislativos municipais através da PEC 336, que reduz o percentual máximo das receitas tributárias e das transferências municipais para financiamento da Câmara de Vereadores. As duas PECs foram aprovadas no último dia 9, em primeiro turno.

A União dos Vereadores de Goiás (UVG) ainda prepara um levantamento de quantos municípios goianos seriam atingidos pelas PECs, mas a estimativa é que sejam entre 60 e 63, abrangendo praticamente todas as cidades com mais de 20 mil habitantes, sendo que Goiânia permanecerá com as atuais 35 cadeiras. Com relação à questão do financiamento, a Confederação Nacional dos Municípios (CNM) realizou estudo abrangendo 90% das cidades brasileiras e demonstra que foram liberados R$ 10.4 bilhões às Câmaras em 2008, mas apenas R$ 6,28 bilhões foram gastos, um valor bem abaixo até mesmo do novo limite, que seria de R$8.97 bilhões. Isso significa que, a redução ocorre no papel, mas não deve ocorrer na prática, já que o novo valor ainda está acima do que é realmente utilizado. Ou seja, poderemos ter até um aumento de custos. E dentro da lei.

Presidente da Frente de Mobilização Municipalista (FMM), o prefeito de Quirinópolis, Gilmar Alves (PMDB), concorda que, na prática, nada deve mudar em termos de custos, e defende um percentual maior de redução, pois existe sobra de recursos principalmente nos municípios maiores, que tem dificuldade em usar toda a verba destinada ao seu poder Legislativo. Com relação ao aumento de vagas ele não quis dizer que a entidade é favorável, mas afirmou que também “não é contrária”.

Já o presidente da UVG, Eliezer Fernandes (DEM), discorda da CNM. Para ele, a entidade não tem autoridade para falar sobre vereadores, por se tratar de uma representação dos poderes executivos. Afirma ainda que a CNM se disfarça de municipalista quando na verdade “a maioria dos prefeitos não se interessam em ter câmaras fortes e atuantes”. Por isso, para Fernandes só o que vale são os estudos feitos pela Câmara dos Deputados para a aprovação da PEC, que apontariam uma economia de mais de R$1,5 bilhão.
A UVG é favorável à aprovação da nova lei que, segundo seu presidente, corrige distorções provocadas pela resolução 21702/04 do TSE, que teria desnivelado os legislativos municipais ao promover um corte no número de vereadores. “O Tribunal não conhecia a realidade dos municípios”, diz Eliezer, dando o exemplo de Goianésia, que passou a ter os mesmos 9 parlamentares de Anhanguera, menor cidade goiana.

Num ponto Eliezer e Gilmar Alves concordam: a divisão atual dos vereadores não é justa, colocando no mesmo patamar municípios muito pequenos e de médio porte. Gilmar vai além. Ele acredita que, da mesma forma como alguns poderiam ter um número maior de vereadores, outros, como Anhanguera, poderiam ter menos. “Seis ou sete vereadores estariam de bom tamanho”, afirma. Com a diminuição Eliezer não concorda. “É preciso um número mínimo para manter as atividades. Somente os anti-democratas querem a diminuição”. Para o político, não haverá aumento de vagas, mas uma recomposição. “Essa medida é necessária para manter o Legislativo debatendo, forte e atuante.”

O cientista político Pedro Célio Borges, da Universidade Federal de Goiás (UFG), avalia que a formatação do Legislativo merecia debate mais amplo. “O desenho do sistema representativo deveria também constar do debate da reforma política, a começar pela base, as câmaras de vereadores, mas isso nunca aparece na agenda”, avalia. Para ele, não se trata apenas de aumentar a quantidade. “Há questões de fundo que ultrapassam as ondas de momento e vão desde a ausência de autonomia do Legislativo perante os demais poderes até à remuneração dos vereadores”. No entanto, o professor acredita ainda que “elegendo muitos vereadores a população teria mais condições de cobrar e fiscalizar, de encaminhar demandas”

Em Jataí, vagas quase dobram
Na cidade de Jataí a quantidade de vereadores deve quase dobrar, passando de 10 para 17. A vereadora Vilma Feitosa (PR), vice-presidente da Câmara afirma que quem deve se pronunciar sobre a aplicação ou não da nova PEC é o Congresso e o Judiciário, não cabendo à Câmara Municipal questioná-la, mas cumpri-la. Segundo Vilma, a Câmara de Jataí recebe aproximadamente R$ 500 mil mensais, mas cerca de R$ 100 mil são devolvidos aos cofres públicos. 

No momento as PEC’s aguardam para ir à votação em segundo turno na Câmara dos Deputados. Caso a medida entre em vigor já a partir de 2010, ela pode ir um pouco além da simples posse de suplentes. O aumento de vagas altera o coeficiente eleitoral. Desta forma, vereadores podem acabar tendo de ceder a vaga a outro. Suplentes fazem pressão e querem ver a medida votada até o início de outubro, para que entre em vigor no próximo ano. Apesar disso, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Gilmar Mendes, já declarou que a PEC não deve entrar em vigor antes de 2012, ou seja, os atuais suplentes dificilmente passarão à condição de titulares.

Imagem distorcida afeta parlamentares
Para o analista político Luiz Signates, o aumento do número de parlamentares não altera de forma alguma a questão da representatividade. Segundo o professor, o principal problema dos vereadores está em como eles são vistos pela população. Por serem considerados mais próximos da sociedade, acabam sofrendo maior assédio. No entanto, eles possuem poucas condições de responder a esta demanda e acabam se tornando verdadeiros “despachantes” da população, que possui pouca visão para enxergar essa dificuldade. “Para o povo, político é governo”, diz.

Signates faz questão de deixar claro que as pessoas não tem obrigação de entender essa divisão dos poderes, que acaba nem sendo colocada de forma tão clara por quem os exerce. Outro problema grave é a pouca preocupação dos vereadores com a própria imagem. “Eles nem mesmo fazem pesquisa qualitativa”, afirma, ressaltando que um maior cuidado com a imagem poderia ajudar neste processo. E não é apenas no Brasil que os políticos são mal vistos. “Isso ocorre no mundo todo. Faz parte da democracia contemporânea”, afirma o professor.

Diante disso, é possível imaginar que a aprovação de temas polêmicos como a criação de mais cargos políticos poderia resultar num verdadeiro tiro no pé desses próprios políticos, agravando ainda mais a crise de confiança em curso. A classe vem sofrendo visível degradação moral nos últimos tempos, culpa da sequência quase infinita de escândalos que não vêm escolhendo partido nem matiz ideológico

O especialista acredita que a aprovação de tais medidas vem pela sobreposição de interesses, algo bastante comum na vida política. Além disso, por não terem ligação direta com ilicitudes, corrupção, ou outras coisas do gênero, acabam não preocupando tanto. Também se faz necessário analisar o quanto de destaque determinado tema terá nos meios de comunicação para que se possa medir o desgaste provocado. Signates conclui ainda que, especialmente depois do episódio em que o deputado Sérgio Moraes (PTB-RS) disse se lixar para a opinião pública, parece existir a sensação de que qualquer desgaste é superável.

Fonte:Tribuna do Planalto