Nesta sexta-feira (11), durante o programa Hora do Esporte, na Sagres, o presidente executivo do Goiás Esporte Clube, Marcelo Almeida, concedeu entrevista exclusiva ao repórter André Rodrigues. O dirigente esmeraldino falou sobre diversas situações do clube, pressionado pelos mais resultados no Campeonato Brasileiro e que amarga a última posição da Série A após nove rodadas.

Frustrações no cargo

De início, Marcelo Almeida frisou que “relutei muito em fazer essa entrevista, porque essa foi uma semana muito difícil. Difícil porque muitas inverdades foram ditas da minha pessoa e dos meus pares e, quando é uma inverdade, isso dói, isso dói profundamente”. O dirigente acrescentou que “uma coisa que tem me decepcionado muito no futebol é a falta de respeito e hombridade de muitas pessoas, e a decepção de às vezes você estar lidando com pessoas que não têm caráter”.

Na sua visão, “o futebol não foi feito para gente séria e acho que, sinceramente, não estou no lugar adequado, porque sou um cara sério, que construiu uma vida pautada em responsabilidade e trabalho. Estava comentando isso até com o Mauro (Machado, vice-presidente de futebol do Goiás), que eu trabalhei no Goiás durante vários anos de graça quando era médico e tenho uma folha corrida de prestação de serviços que poucos têm. Não estou falando que sou o que mais tenho, sou um dos que tem muito”.

Na minha reta final, parece que tudo aquilo que fiz nada mais funcionou, nada mais é certo e, aliás, parece que tudo foi errado, e isso me entristece muito. O Goiás me roubou tempo, saúde, amigos, enfim, me tirou muitas coisas. Me devolveu outras, uma das quais, e é até ruim dizer, foi eu poder conhecer mais a essência do ser humano. O futebol te faz às vezes conhecer a essência do ser humano e a podridão que é o ser humano”.

De acordo com Marcelo, “isso tem me trazido muita decepção, porque poucas pessoas sabem o suor que deixei no Goiás. Errei? Lógico que errei, todos erram. Atire a primeira pedra aquele que não erra. Mas é muito ruim às vezes parecer que só você errou sozinho. Isso é mentira e uma falácia, porque, se cometi erro, pode ter certeza que várias pessoas cometeram o mesmo erro junto comigo. Ou será que aquele conselho de administração foi montado de araque? Talvez tenha sido, então. Mas, não”.

“Ali dentro tenho amigos e conselheiros, e conselheiros que falo é aquele que dá conselho para mim, que às vezes não me deixam fazer coisas que não eram para terem sido feitas. Quero, por exemplo, agradecer a figura do Rogério Santana (vice-presidente para assuntos administrativos), que é um cara que todas às vezes que ele vê que tem alguma coisa que pode sair errado me puxa a orelha e fala ‘não faz assim não, faz daquele outro jeito’, e procuro fazer daquele outro jeito”, completou.

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“Me sinto um Sérgio Rassi”

Segundo o próprio, “o Marcelo Almeida indicou zero jogadores. Tentei vetar vários e fui vencido (pelo conselho)”. Sem citar nomes de atletas, destacou que “vetei alguns por problemas médicos e questões técnicas, mas de que adianta às vezes você vetar se existe um conselho que no voto te vence? Tenho certeza que aqueles que compõem o nosso conselho de vices sabe do que estou falando, mas essas verdades não vêm à tona. Parece que os assuntos à tona são aqueles que são mais convenientes, os inconvenientes não”.

“É com muita tristeza que estou aqui hoje e, digo mais: eu, hoje, e não sei nem se posso falar desse jeito, me sinto um Sérgio Rassi. Volto no tempo para compartilhar o sofrimento daquele cidadão, que via nos seus olhares, porque não tinha muita proximidade dele, mas o pouco que convivia via o sofrimento daquela figura, que é um médico extremamente respeitado e que não precisava daquilo. Ele não precisava passar pelo passou, da mesma forma que eu não preciso passar pelo que estou passando”, ponderou.

Questionado sobre o ex-presidente do Goiás passou, que Marcelo Almeida sucedeu de forma interina a partir de agosto de 2017 antes de ser eleito para o triênio 2018-2020, o atual principal comandante executivo do clube esmeraldino afirmou que Sérgio Rassi “passou pela síndrome do presidente da reta final, aquele que não pode chegar na bandeirada final, porque de repente pode estar fazendo alguma coisa que seja lembrada. Eu, particularmente, me considerado um cara que, queiram ou não, serei lembrado”.

“Vou ser lembrado por quê? Quando peguei o Goiás, (o time) estava caindo para a Série C. Infelizmente, o Sérgio renunciou, e entendo o porquê que ele fez isso, por muita pressão e muita injustiça. O Sérgio nunca falou isso, e acho que nunca falará, como muitos outros lá de trás nunca falaram, mas é a síndrome da reta final”. Perguntado sobre de onde vem isso, destacou que “o Goiás é formado por um sistema. O Goiás é um sistema, um sistema pesado”.

Segundo Marcelo, “está acontecendo uma coisa interessante: a partir do momento que foi criado esse conselho, as pessoas veem os meus sofrimentos e o tanto que é pesado esse cargo. Aqueles que gostariam de ser presidente vão ficando pela metade do caminho, porque começam a pensar ‘gente, espera um pouquinho, eu não preciso passar por isso’. O Mauro precisa passar por isso? O Rogério precisa passar por isso? O Dyogo Crosara precisa passar por isso, um advogado renomado aqui de Goiânia? Não precisa”.

“Não precisamos passar por isso, porque amamos o Goiás. É diferente, e não precisamos do Goiás para viver. Aliás, o Goiás me tomou dinheiro, saúde e tempo. Mas não posso reclamar, porque ninguém colocou a faca no meu pescoço para ir lá assumir o cargo, fui porque quis. Só que poucos sabem qual é a verdadeira realidade de quando você está lá dentro”, completou o presidente executivo esmeraldino.

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Arrependimento

Marcelo Almeida diz que “me arrependo muito, mas, em contrapartida, digo: por que o Goiás não pode ser diferente? Alguma pessoa já parou para pensar que o Goiás talvez é o que é por causa do sistema? O torcedor já parou para pensar que, daqui a pouco, o Goiás não conquista mais nada dali para frente porque o Goiás é emperrado? Acho que o torcedor está precisando pensar mais nesse sentido”.

“É coincidência demais ter acontecido com o Syd (de Oliveira), com o João Bosco (Luz), com o Sérgio Rassi e estar acontecendo comigo. Vai acontecer com todos os outros se continuar do jeito que está. O Goiás precisa aprender a reconhecer as pessoas que se doam para o clube. Todos sabem que não ganho nada no Goiás: o meu salário é zero e tiro meio período da minha vida para doar para o Goiás nesses três anos e meio. Quantas pessoas fazem isso? Você conta na mão direita só, porque nas duas não dá”, ponderou.

O dirigente finalizou ainda que “estou injustiçado porque o que estou fazendo é de coração, e as pessoas não estão reconhecendo. Se pudesse pedir hoje ‘você quer dar um presente para o torcedor e tem o direito de escolher: quer dar um estádio ou um título?’. Eu queria um título, mas a matemática não fecha. Olha o exemplo do Cruzeiro. Com relação a arrependimento, é pelas angústias e sofrimentos. Me arrependo do que não fiz, e uma das coisas que não fiz, e deveria ter feito, era ter participado um pouco mais do futebol”.

Desavenças no grupo de WhatsApp

A respeito do grupo em uma aplicativo de mensagens instantâneas, que agrega alguns conselheiros do clube e membros da atual diretoria, Marcelo recordou da época da contratação do atacante peruano Kevin Quevedo, “que está todo mundo descendo o ‘cacete’. Não sei por que, porque não foi testado, principalmente agora. E vi que apenas uma pessoa, o Edminho (Pinheiro (vice-presidente do Conselho Deliberativo), foi contra. Disse que o jogador era muito indisciplinado e que talvez não se encaixasse no nosso elenco”.

“O Adriano (Rodrigues de Oliveira, vice-presidente de patrimônio) também, e até alegou que se o Seu Hailé (Pinheiro, presidente do Conselho Deliberativo) fosse contra ele também era contra, e sou contra esse tipo de decisão. Tem que ser essa decisão sua, não porque o outro falou que é ruim. Só que deu maioria e todos achamos que ele deveria ser contratado, tanto que a partir desse dia o Edminho ficou ‘puto da vida’ e saiu do grupo. Beleza, ele se posicionou, só que, dentro de um sistema democrático de direito, onde monta-se um processo de votação onde a maioria ganha, ponto, a maioria ganha”, avaliou.

Segundo André Rodrigues, Edminho confidenciou que sua saída do grupo se deu por achar que era sempre um ‘voto vencido’, porém Marcelo frisou que “não concordo com isso. Esse que fui contra (alegadamente Henrique Almeida), ele também foi contra. O Ney Franco queria esse jogador e o Seu Hailé falou que o futebol tem uma coisa, que é cultural, que quando um técnico pede um jogador e você não dá, lá na frente, se as coisas não acontecem, ele joga na sua cara que não aconteceu porque você não deu aquilo para ele”.

“Todos ficaram com a esperança de que o jogador iria melhorar. Não melhorou até hoje e não vai melhorar se não tomar uma medida cirúrgica, no meu entendimento, mas isso é particular. O que estou querendo dizer é que as decisões são colegiadas e são feitas porque o grupo definiu que fosse assim. Foi com esse atleta, com o Quevedo, com o Rafael Moura e com relação a vários. Então só peço uma coisa: não apedrejem uma ou duas pessoas, porque isso é uma injustiça muito grande”, completou.

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Relação com Paulo Rogério e Seu Hailé

No momento, embora não de forma oficial, apenas Paulo Rogério Pinheiro aponta como um candidato à presidência executiva do Goiás para o próximo mandato. Sobre ter uma transição na gestão, Marcelo ponderou que “esse está sendo um ano atípico, porque entrego (o cargo) em novembro ou dezembro e o campeonato prossegue até março, mais ou menos. O interessante seria que sim. Agora, é uma coisa muito perigosa, porque preciso do meu lado um irmão, um camarada, um parceiro, um cara que confie, olhe no olho e vejo que daquele olhar está emanando verdade e compromisso, é esse caro que quero”.

Questionado sobre o filho de Hailé Pinheiro ter as qualidades apontadas, o atual presidente esmeraldino ressaltou que “estou carente de amigo. Amigo, descobri que no futebol não existe. Eu esperava mais do Paulo Rogério. Vi algumas declarações dele que esperava que ele ligasse e falasse para mim. O Paulo Rogério frequenta a minha casa, o seu filho do é um dos melhores amigos do meu filho. Até acredito muito que os meus filhos, que são muito ingênuos ainda, sejam muitos amigos de verdade, porque a amizade da infância é muito verdadeira. O Paulo Rogério me decepcionou muito e, se estiver ouvindo: Paulo Rogério, preciso muito falar com você”.

Por falar no presidente do Conselho Deliberativo, Marcelo recordou que “o Seu Hailé, graças a Deus, saiu muito bem da covid-19. O Paulo Rogério me passava algumas gravações falando do estado do pai dele e todos os dias eu falava ‘força, continuamos aqui, Deus no comando’. Era o meu discurso para ele, porque, de fato, o Seu Hailé é uma pessoa que o Goiás não pode ficar sem ele de jeito nenhum por agora. O Goiás precisa muito da força daquele cara”.

Durante o período, “percebi uma coisa: o Seu Hailé foi acometido dessa doença e, tadinho, muito fragilizado, se afastou, o que é normal. Mas esse pequeno afastamento dele fez com que tudo isso que está acontecendo fosse por causa da ausência dele. Esse é o meu pensamento, para você ver o tanto que o Seu Hailé tem força, porque o Seu Hailé bate na mesa, apesar da fragilidade, e não deixa certas coisas acontecer”.

“Ele, pela vivência, experiência, caráter, grande homem e estadista que é, ele sabe que esse tipo de coisa não é bom para aquilo que mais gosta e tem até no nome: Goiás. Ele não deixaria. Por esse afastamento dele, parece que as coisas aconteceram exatamente na hora que ele sai. Ele não deve estar me ouvindo, mas continuo aqui com as minhas orações e semana que vem quero ver ele no Goiás. Está precisando dele, porque a ausência dele causa esse tumulto todinho, e espero que ele venha”, finalizou.

Insatisfação com Harlei

Espaço também para falar sobre o atual gestor de futebol do Goiás, Harlei Menezes, que assumiu a função pela terceira vez no clube. Emocionado, Marcelo Almeida ressaltou que “o Harlei é um irmão meu. Quando entrei, trouxe ele para dentro. O Harlei tinha rejeição, bati no peito, assumi a bronca e gostaria de ter uma retribuição maior por tudo aquilo que eu fiz. Não sei se a mensagem será capitada, mas eu gostaria de ser mais reconhecido por tudo aquilo que fiz para ele”.

Confira a entrevista de Marcelo Almeida à Sagres na íntegra