Você já parou para pensar na importância do papel das mulheres nas ciências? A igualdade de gênero é um tema importante e que precisa ser debatido, inclusive é um dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU).

A primeira mulher a ganhar o Prêmio Nobel, por suas descobertas sobre os efeitos da radiação, foi Marie Curie. O fato aconteceu em 1903, de lá para cá, apenas 17 outras mulheres ganharam o prêmio nas áreas de física, química ou medicina. Já o número de homens que repetiram o feito foi de 572.

Segundo um relatório da Unesco as mulheres representam quase a metade, 46%, do total de pesquisadores nos países da América Latina e do Caribe. Isso fez com que a região conquistasse, na última década, a igualdade de gênero na ciência. Mesmo com essa conquista meninas e mulheres ainda enfrentam uma série de desigualdades no que diz respeito ao acesso a temas científicos.

No Brasil, 54% dos títulos de doutorado foram obtidos por mulheres, mas apenas 25% dos diplomas se concentrem nas áreas de matemática e ciência da computação.

O que é ciência

Para entender mais sobre essa relação de mulheres e meninas com a ciência precisamos compreender que ela não se resumi em áreas ligadas a química ou física.

Segundo a pós-doutoranda pela Faculdade de História da Universidade Federal de Goiás, Vanessa Clemente, há um senso comum de que somente as ciências exatas e biológicas sejam de fato ciências, excluindo ou colocando em outro patamar as ciências humanas.

“Se tratando de História, com o advento da tecnologia e das redes sociais, é frequente a confusão entre opinião e ciência e a disseminação de Fake News. História é uma ciência que requer análise e interpretação crítica de fontes, processos e dados. Não se trata de uma especulação desconexa do historiador”, explica.

Criadas para o cuidado

A professora do Instituto de Química da Universidade Federal De Goiás (IQ/UFG), Anna Benites, pontua que muitas práticas costumam afastar as meninas da ciência fazendo com que elas não se vejam lá.

“Um exemplo claro disso é que meninas são estimuladas desde jovens ganhando bonecas, fogões e panelinhas para treinar funções domésticas. Já os meninos recebem modelos para projetar visão 3D: são jogos para treinar visão tridimensional e carrinhos para treinar visão espacial. Isso faz com que as mulheres vão se afastando das ciências.”

Professora do Instituto de Química da Universidade Federal De Goiás (IQ/UFG), Anna Benites (Foto: Arquivo pessoal)

“A professora ainda pontua que apesar de importantes, estímulos na infância não são determinantes para o sucesso das mulheres. “O que acontece é que hoje somos muitas mulheres dentro de funções ligadas ao cuidado. Temos um grande número de professoras, assistentes sociais e enfermeiras, não tem problema nenhum nisso, mas a questão é essa falta de escolha. Estamos mais perto das funções ligadas ao cuidado, porque estamos treinando desde cedo para essa função”, pontua Anna Benites.

Segundo Anna Benites não é por acaso que essas funções são menos remuneradas. “O mercado de trabalho distribui renda e se ele nos ver como um produto interditado, em algumas funçõ, também vai distribuir renda em menor proporção para nós”, afirma.

Desafios de mulheres cientistas

A historiadora ressalta que se a gente escrever sobre a história da ciência e a contribuição feminina, teremos grandes dificuldades de conseguirmos fontes históricas que confirmem a compreensão do papel da mulher. Isso acontece devido as dificuldades e impedimentos que as mulheres encontraram e ainda encontram para ocupar espaços de produção de saber e ao apagamento histórico que sofreram ao longo dos séculos.

“Historicamente os homens foram destinados ao espaço público e consequentemente ao espaço de produção científica. Pensando no ambiente acadêmico, as universidades não foram criadas para serem ocupadas pelas mulheres. Em pleno século XXI, temos denúncias de docentes e alunas que sofrem ou sofreram violência de gênero. É raro alguém questionar a capacidade intelectual de um homem no ambiente universitário, enquanto isso, temos mulheres precisando reafirmar o tempo todo o quão boas são em suas respectivas áreas de atuação. É muito desgastante, cansativa e violenta essa realidade”, frisa.

As mulheres ocupam menos os espaços de poder, são subnotificadas e ganham menos exercendo os mesmos cargos e funções. Além disso, tem uma carga de trabalho maior no ambiente privado, exercendo duplas e até triplas jornadas.

Imagem da pós-doutoranda, pela Faculdade de História da Universidade Federal de Goiás, Vanessa Clemente, em 2019. Vanessa estava revisando a tese de doutorado para a defesa quando a filha acordou querendo colo de madrugada (Foto: Arquivo pessoal)

“Esse excesso de trabalho colabora com a diminuição do seu tempo que poderia ser utilizado para a produção científica, além do desgaste físico e emocional. A desvalorização financeira, a falta de rede de apoio, o assédio, a discriminação em diversos níveis e o ambiente excludente podem ser relacionados ao índice de desistência de mulheres nos cursos de pós-graduação, especialização, mestrado e doutorado” afirma, Vanessa.

Pensando em soluções

A Anna Benites ressalta que para incentivar que mais meninas sejam cientistas é necessário atuar em conjunto. “O estado precisa criar políticas públicas para projetos que privilegiam a discussão de gênero quando contempla vagas para pesquisa. Nós precisamos adotar livros de mulheres ler aceitar convidar para a banca e divulgar a pesquisa de mulheres”, frisa a professora.

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