O último boletim epidemiológico da dengue, divulgado pela Secretaria Estadual de Saúde, mostra que uma epidemia da doença avança em todo o estado. Em Goiânia, os números seguem assustando as autoridades ligadas à saúde. Em 45 dias de 2013, já foram registrados 15.075 casos da doença. O índice de infestação é o mais alto da história da capital, 3,69% das casas possuem focos do mosquito Aedes aegypti. Este número é maior que os 3,4% de 2010, quando a cidade registrou o maior número de casos da doença.
As campanhas públicas contra a dengue lançam sobre a sociedade a responsabilidade pelo aumento da doença. O discurso das autoridades é de que a população não colabora, joga lixo em lotes baldios, não tampa a caixa d’água, nem limpa as calhas, vasos sanitários e piscinas. A epidemia de dengue pode mesmo ser imputada à negligência da população? Outra vertente culpa o próprio mosquito, que tem se adaptado à novas condições e evoluído. Já existe um tipo quatro circulando livremente pelos ares com seus antecessores, um, dois e três. A chegada do novo sorotipo de vírus seria responsável pela nova epidemia, afirma as autoridades de saúde.
O jornalismo da 730 foi à campo investigar as reais causas de mais uma epidemia de dengue em Goiânia. A reportagem conversou com uma das maiores autoridades em epidemiologia do país, o médico infectologista Boaventura Braz de Queiroz, e ele questiona essa versão. O ex-diretor do Hospital de Doenças Tropicais (HDT), referência no tratamento da dengue, afirma que os altos números da doe3nça e de infestação do mosquito poderiam ter sido evitados. Segundo ele, as autoridades municipais e estaduais sabiam o que fazer, mas foram omissas: “A questão fica mais na vontade política mesmo que no planejamento porque saber que esse sorotipo (quatro) ia entrar, eles já sabiam, todo mundo sabia, tanto que essa introdução começou em novembro de 2011 e a partir daí não se elaborou um plano eficiente.”
De acordo com os dados do Ministério da Saúde, não falta dinheiro para controle da doença. Há 15 anos o governo federal criou Programa Nacional de Controle da Dengue e, partir dele, são feitos repasses anuais para todo País. O Estado de Goiás recebeu este ano cerca de R$ 6,1 milhões para a qualificação das ações de combate ao mosquito transmissor da doença Aedes aegypti. Além desse recurso de rotina, repassado em quatro parcelas, o coordenador-geral do Programa Nacional de Controle da Dengue, Giovanini Coelho, destaca que Goiânia recebeu um adicional para executar ações de prevenção. “Especificamente para dengue foi transferido um recurso adicional que equivale a 20% desse valor de rotina que eles recebem. Esses recursos foram enviados para os municípios exatamente para que nesse começo de ano eles pudessem ter uma reserva a mais para enfrentar os problemas de transmissão de dengue.”
Estado e Prefeitura de Goiânia garantem que também destinam recursos próprios para combater e tratar a dengue, mas não revelaram os números.
Revelador mesmo são os números da epidemia de dengue. Do alto de seu meio centímetro o Aedes aegypti vem dando um baile nas autoridades. O Estado tem dificuldades até para manter o itinerário dos veículos que pulverizam o veneno que combate o mosquito, conhecido como fumacê. Murilo do Carmo Silva, coordenador de Controle de Dengue e Febre Amarela da Secretaria Estadual de Saúde reconhece que o serviço está sendo mantido com a ajuda das prefeituras. “Nós trabalhamos em parceria com os agentes de Vigilância Sanitária e municípios para tentar desenvolver as ações do carro fumacê nesses municípios que têm registrado o aumento do quantitativo de casos dessa doença.”
O fumacê e as demais ações de contenção da doença são as mesmas desde a década de 90. Um fato que, segundo especialistas, agrava o problema. A diretora em Vigilância e Saúde da Secretaria Municipal de Saúde, Flúvia Amorim, destaca que, enquanto o mosquito se adapta a todos os tipos de ambientes, os métodos de prevenção e combate não evoluíram. “O que a gente tem até hoje disponível é o que era utilizado na década de 90, o fumacê, as visitas domiciliares, o tratamento de foco do mosquito e a mobilização social.”
O mosquito aproveita a omissão das autoridades, a burocracia e lentidão das ações para ganhar espaço e fazer novas vítimas. Nos primeiros 35 dias de 2013, foram notificados mais de 20 mil casos em Goiás; 17 mortes por dengue estão sendo investigadas. O número é 377% maior que a parcial do mesmo período do ano passado. Nessa batalha, não há dúvidas de que o Aedes aegypti é mais eficiente.