Beatriz Martinez, aluna da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP, criou o jogo de tabuleiro Trilhas Urbanas como forma de envolver as crianças nas discussões sobre o funcionamento das cidades. Inspirada na metodologia do educador Paulo Freire, a proposta de Beatriz é tornar a infância um agente de transformação dos espaços públicos, através de uma atividade lúdica e pedagógica.

O Trilhas Urbanas foi selecionado como um dos cinco finalistas do 5º Prêmio Design Tomie Ohtake. “É muito importante falar sobre urbanismo com as crianças. A cidade traz questões didáticas em relação ao que é ser cidadão”, comenta Beatriz, em entrevista a Maria Fernanda Barros do Jornal da USP.

Os primeiros contornos do projeto surgiram durante um trabalho de graduação em que foram envolvidas crianças da Brasilândia, bairro localizado na zona norte de São Paulo. “A ideia era escutar as crianças e entender, de uma forma lúdica, como poderíamos elaborar um espaço de brincar”, conta.

Beatriz e outras colegas do curso criaram uma atividade durante um diálogo com crianças da Brasilândia. Nessa atividade, as crianças projetaram o percurso de suas casas até a escola, levando em conta as características do território do bairro.

O objetivo era compreender como cada uma delas enxergava o local onde vivia. Essa experiência não só deu origem ao projeto Trilhas Urbanas, como também inspirou a criação do CoCriança, um antigo projeto de cultura e extensão da Universidade que se tornou uma organização da sociedade civil, apoiada pelo programa Aprender na Comunidade da USP.

Trilhas urbanas

1. 1 caixa
2. 2 peças (casa e escola)
3. 7 peças de paisagens urbanas
4. 6 dados iconográficos opcionais
5. 2 dados iconográficos obrigatórios
6. 1 dado numérico
7. 5 peões
8. 50 folhas-ponto
9. 20 cartas-solução de ações urbanas
10. 14 cartas-solução de ferramentas
11. 14 cartas características
da cidade
12. Manual do educador (com referências de intervenções urbanas de diversas escalas)
13. Manual de urbanismo tático (com exemplos de intervenções pontuais)
(Infografia: Maria Fernanda Barros)

“Se ninguém resolver os problemas da cidade, todo mundo perde. O jogo tem um lugar de discussão, não existe resposta certa nem errada, existe um lugar de diálogo em torno da solução”. Para elaborá-lo, Beatriz conta que foi essencial ouvir o seu público-alvo. Durante a pandemia, quando estava no processo de construção do projeto, a estudante realizou chamadas de vídeo com as crianças para captar suas perspectivas. “As crianças me ajudaram nesse processo de saber qual é a linguagem certa, de imaginar coisas possíveis para criar o jogo”, diz.

“A grande questão do trabalho com as crianças é conseguirmos transformar assuntos que são sérios e profundos em assuntos adaptados à linguagem delas. Eu não acredito que devemos simplificar nada para as crianças, mas sim transportar a profundidade e a complexidade das coisas do mundo para a linguagem delas”, comenta Beatriz Martinez.

A iniciativa contou com uma importante base na orientação das professoras da FAU, Karina Leitão e Catarina Pinheiro, além da pesquisa realizada com as crianças. “As professoras têm um olhar para o ser humano que engrandece toda a teoria. Elas não só me deram toda a bagagem teórica, mas me ajudaram a colocar em primeiro lugar o aprendizado que temos com as pessoas reais”, pontua a finalista do prêmio.

O CoCriança surgiu na disciplina ministrada por Karina e Catarina, e desde então, as duas docentes têm atuado no conselho da organização.

Beatriz no início do projeto CoCriança – Foto: Arquivo Pessoal

Olhar social

Embora para muitos a relação possa não ser tão clara, a estudante afirma que é impossível separar a prática da arquitetura do papel social do arquiteto. De acordo com Beatriz, a desigualdade social presente no Brasil e no mundo se reflete na construção do espaço, e a profissão tem o papel de reduzir essas tensões de classe que se manifestam nas cidades.

O que diferencia o Trilhas Urbanas é, precisamente, o objetivo da aluna de unir a graduação com a ação social. Para ela, a nomeação ao prêmio representa uma chance de impactar ainda mais crianças, de forma lúdica e divertida. “Um sonho seria que as escolas públicas pudessem utilizar o jogo como parte do material didático”, diz.

O jogo ainda não foi lançado, pois não foram angariados investimentos suficientes para produzir a primeira tiragem. A aluna indica que é responsabilidade da Universidade interligar a arquitetura e o urbanismo com as questões políticas da sociedade. Para isso, ela destaca que um passo importante é ampliar os projetos de cultura e extensão na USP. “É preciso que a Universidade se abra ainda mais para ouvir a nossa sociedade”, manifesta.

A estudante Beatriz Martinez foi a responsável pelo design do jogo, tanto em termos de produto quanto de diagramação. No primeiro protótipo, as ilustrações foram criadas com a ajuda da aluna de design Ana Fuku, que contribuiu para a finalização das imagens e desenho dos personagens. No segundo protótipo, atualmente em desenvolvimento e que será exibido no Instituto Tomie Ohtake, as ilustrações foram criadas por Bruna Martins, que é graduada em design pela FAU.

Dos cinco finalistas, dois serão escolhidos como vencedores, mas todos os projetos em disputa serão exibidos no Instituto Tomie Ohtake no próximo mês. A abertura da exposição será realizada às 19 horas do dia 16 de maio, quando os ganhadores do prêmio também serão anunciados.

*Esse conteúdo está relacionado com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU 04, 11 e 12:
– Educação de Qualidade
– Cidades e Comunidades Sustentáveis
– Consumo e Produção Responsáveis