Nenhum médico que deixou de cumprir seu horário nos postos de saúde de Goiânia foi punido pela falta. E nem vai ser. Isso porque não tramita na Secretaria Municipal de Saúde (SMS) nenhum Procedimento Administrativo Disciplinar (PAD) investigando denúncia de ausência de médicos nas unidades de saúde, seja em plantões ou dias normal de trabalho. O que não quer dizer que essa situação não ocorra. Muito pelo contrário: as denúncias de posto de saúde sem médicos são frequentes nos noticiário da capital.

Só este ano, a Rede Clube de Comunicação denunciou diversas vezes a falta de médicos na rede municipal de saúde. A primeira constatação foi bem no início do ano, em janeiro, quando a reportagem da Rádio 730 acompanhou de perto o sofrimento do vidraceiro Amilton Duarte que travou a coluna ao subir no parapeito de um prédio de 16 andares. Durante a sua peregrinação pelo Cais de Goiânia, ele passou por três unidades e nenhuma delas tinha médico atendendo na emergência. De todas as recepcionistas, Duarte recebia a mesma resposta: “Os médicos que estavam aqui não vêm mais porque reclamam dos salários curtos pagos pelo Município.” De lá para cá, outras reportagens denunciaram a falta de médicos nos postos de saúde, principalmente nos fins de semana e feriados.

Além da Rádio 730, outras emissoras também denunciaram a falta de médicos nos Centros de Assistência Integral à Saúde (Cais) e Centos Integrados de Assistência Médico-Sanitária (Ciams). No mês passado, a TV Anhanguera veiculou quatro reportagens em que os pacientes denunciam a falta de médicos no atendimento emergencial dos Cais. No dia 28 de agosto, mostrou que apenas um médico estava atendendo na unidade do setor Campinas na noite anterior, quando dois profissionais deveriam estar em plantão. Dois dias depois, no dia 30 de agosto, a equipe voltou ao local e se deparou com a mesma situação antes registrada. Pela manhã não havia clínico geral em serviço e os pacientes estavam sendo encaminhados para outros bairros. DSC 5515

Questionado sobre a falta de punição dos médicos faltosos, Sandro Rodrigues, diretor do Departamento de Atenção à Saúde do município, explicou que a primeira atitude da SMS ao detectar que um servidor está faltando aos plantões ou consultas é estabelecer um diálogo com o infrator.  De acordo com ele, um procedimento interno para averiguação só é aberto quando a justificativa da ausência não é satisfatória. Rodrigues assegura ainda que as faltas dos médicos ao trabalho são supridas pelo restante da equipe e, por isso, o atendimento à população não é prejudicado.

Mas a falta de punição não atinge apenas os médicos gazeteiros. Os flagrados em fraude contra sistema também se safaram de uma eventual penalidade. Em janeiro deste ano um esquema envolvendo médicos e diretores do Cais do Setor Novo Horizonte foi descoberto durante uma sindicância interna da SMS e consistia num acordo entre a administração da unidade e os médicos faltosos. A folha de ponto era assinada pelos funcionários envolvidos, repassada à SMS, que procedia ao pagamento do serviço não prestado. O valor do plantão, recebido pelo médico que participava da fraude, era dividido com todo o grupo. Nenhum PAD sobre esse caso foi encontrado pela assessoria de comunicação da SMS, nenhum médico afastado e nenhum servidor demitido, apesar da gravidade do caso.Zander

Pontos biométricos
A recorrente falta de médicos nos postos de saúde, que não preocupa a SMS, chamou a atenção do vereador Zander Fábio (PSL). No ultimo dia 19 ele apresentou um projeto de lei que autoriza a prefeitura a implantar o ponto biométrico nas unidades regidas pela SMS.  O objetivo, segundo o autor da proposta, é verificar a assiduidade e pontualidade dos médicos no trabalho. “Não queremos penalizar o médico, mas sim criar uma doutrina para um bom atendimento. Muitos profissionais reclamam do salário, mas quando se dispuseram a trabalhar na rede pública de saúde já tinha ciência do valor que é pago pelo município.”

Fábio conta que tem recebido dos pacientes diversas reclamações contra médicos que não cumprem os horários estabelecidos ou não vão trabalhar. De acordo com ele, durante visitas em unidades de saúde, já presenciou episódios em que o médico deveria estar em plantão às 7 horas da noite, no entanto, às 9 horas ainda não havia chegado para trabalhar. O vereador ressalta, sobretudo, a importância de controlar os médicos que devem estar em serviço para que a comunidade não seja prejudicada com a ausência de atendimento.

A falta de processos administrativos contra médicos faltosos este ano se contrapõe ao levantamento da própria SMS do ano passado, que apontou a ausência de 3,7% dos 1,4 mil profissionais que deveriam realizar plantões de 12 horas, semanalmente, nos Cais e Ciams. Cerca de 50 profissionais se ausentaram do trabalho sem justificativa no período.

Enquanto a SMS não faz nada para punir administrativamente os médicos que faltam aos plantões e consultas, de 2011 até agora, 135 processos foram abertos contra médicos que atuam na rede estadual de saúde. Desses, 18 resultaram na demissão dos servidores e 12 condenações ao ressarcimento do prejuízo causado para o Estado. Entre os motivos que levaram a Secretaria de Estado da Saúde (SES) a tomar medidas tão drásticas contra os servidores, o que mais se destaca é a ausência dos profissionais do trabalho sem justificativas. Atualmente trabalham para o Estado 1.662 médicos. Desses, 1.516 são efetivos, 65 são residentes, 81 estão à disposição.