Antes de entrar a fundo no tema, é preciso deixar claro: uma final de Libertadores da América entre Boca Juniors e River Plate deve ser jogada em ida e volta, com um jogo na casa de cada clube. Noventa minutos na Bombonera; noventa no Monumental.

Dito isso, o fato de o jogo decisivo da final mais importante da história do futebol sul-americano ser disputado na Europa é uma vergonha. Para os clubes, dirigentes e a Conmebol, sim. Mas também para a sociedade como um todo. A sociedade argentina, sobretudo, mas nao somente. É uma vergonha continental.

“Falhamos”, foi como resumiu um amigo argentino. “Falhamos”, repetia, enquanto olhávamos juntos para as imagens dos ataques ao ônibus do Boca Juniors na TV, naquele 24 de novembro que estava marcado no calendário do futebol como uma de suas datas mais importantes.

(Estádio Santiago Bernabeu)

Na Europa, a reaçao ao que acontecia a duas quadras do estádio do River era de espanto. Observando os olhos esbugalhados de companheiros de trabalho – alguns deles escalados para a transmissao do jogo – era nítida a impressao de que eles nao acreditavam que uma rivalidade pudesse chegar àquele ponto. 

Passado o furacao (ou quase isso), e com a final marcada para um estádio a 10 mil quilômetros de distância de onde deveria ser disputada, o sentimento de vergonha para os sul-americanos continua. Mas, para os europeus, o espanto de antes transformou-se em uma sensaçao muito diferente.

O que parece, conversando com amigos e colegas de trabalho de Barcelona, Madri e até de outros países vizinhos, é que o caos de Buenos Aires deu aos europeus um inesperado presente: a chance de viver, por uns poucos dias que seja, uma atmosfera diferente. De respirar um futebol que, – tao distante em vários fatores dentro e fora de campo – parece ser de outra época.

Logo na quarta-feira, dia da chegada do Boca Juniors a Madri, a cidade já estava diferente: torcedores no aeroporto, gritos na porta do hotel, música argentina nos bares… Um clima diferente até mesmo dos Superclásicos com entre Real Madrid e Barcelona. É como se, de repente, uma final de Copa do Mundo tivesse aterrissado no quintal de casa.

Porque um River x Boca, em final de Libertadores, com torcedores dos dois times no mesmo estádio é algo único. Nao tem precedentes e é bem possível que nao tenha reprises em um futuro próximo. Neste sentido, o jogo de domingo no Bernabéu é mais excepcional que uma final de Copa do Mundo.

Afinal, seja como for, final de Copa tem a cada quatro anos. Um Boca x River no quintal de casa é coisa pra viver uma vez na vida. A Copa Libertadores de 2018 será marcada pela vergonha para muita gente. Mas a Copa “Conquistadores” – provocaçao óbvia dos argentinos com os espanhóis – será um privilégio para as cerca de 80 mil pessoas que devem lotar o Santiago Bernabéu.