Jayme Rincón (Foto: Rubens Salomão/Sagres On)
O Ministério Público Federal (MPF) apresentou nesta quarta-feira (4) parecer contrário à solicitação do ex-presidente da Agência Goiânia de Transporte e Obras Públicas (Agetop), Jayme Rincon, de declaração de incompetência da Justiça Federal para apreciar o inquérito da Operação Cash Delivery.
Em petição apresentada à 11ª Vara da Justiça Federal em Goiânia, em 15 de março, Jayme pediu declaração de “incompetência” da Justiça Federal em função de decisão Supremo Tribunal Federal (STF), no dia anterior, a favor da competência da Justiça Eleitoral para investigar casos de corrupção quando envolverem simultaneamente caixa 2 de campanha e outros crimes comuns, como lavagem de dinheiro, que são investigados na Operação Lava Jato.
A defesa argumenta que há conexão entre os delitos investigados pela Cash Delivery no inquérito que corre na Justiça Federal com crime descrito no artigo 350 do Código Eleitoral, este investigado no processo em trâmite na 135ª Zona Eleitoral em Goiânia, por isso quer a remessa dos autos ao juiz da 135ª Zona eleitoral e a nulidade dos atos tomados na Justiça Federal.
No parecer assinado pelo procurador Hélio Telho, o MPF diz que, diferentemente do que alega a defesa, a declaração de incompetência do Juízo de primeira instância depois da decisão do STF não é automática, mas avaliada caso a caso. Lembra que a Cash Delivery apura a existência de pagamentos indevidos a Marconi Perillo supostamente feitos pela Odebrecht para as campanhas de 2010 e de 2014 e que a ação na 135ª Zona Eleitoral, a possível omissão de informação em sua prestação de contas da campanha e que se tratam de crimes “completamente distintos.”
Para o MPF, mesmo que não haja indícios de prática do crime eleitoral no fato investigado na 11ª Vara Federal é preciso investigar tanto a prática do crime de corrupção como de falsidade ideológica na possível doação da Odebrecht. O parecer lembra o ex-governador Marconi Perillo, em depoimento à Polícia Federal, negou que tenha usado recursos não declarados nas suas campanhas eleitorais para defender seu argumento de que não há conexão entre os fatos investigados nas duas ações.
Observa que um crime só tem conexão com o outro quando um não pode acontecer sem que um anterior tenha acontecido. Exemplifica com o crime de receptação. Para que este ocorra é preciso que tenha havido, antes, o crime de furto ou roubo. O MPF diz que isso não acontece entre os dois eventuais crimes investigados pela Justiça Federal e pela Eleitoral.
“A omissão de informações na prestação de contas na campanha [caixa 2 de campanha], assim, não exige prova de crime de corrupção antecedente. Da mesma forma, para a caracterização dos crimes de corrupção, organização criminosa ou lavagem de dinheiro, são irrelevantes os dados que Marconi Perillo tenha informado à Justiça Eleitoral em sua prestação de contas”. Argumenta o MPF que “não é a unicidade da prova que determina a unicidade do processo, mas sim a efetiva influência da prova de existência de um crime para a caracterização do outro crime.”
Por isso, o MPF pede o indeferimento do pedido de incompetência e também de nulidade dos atos já tomados no inquérito em tramitação na 11ª Vara da Justiça Federal em Goiânia e apresentada pela defesa de Jayme Rincón.
Leia: STF decide que Justiça Eleitoral pode julgar corrupção da Lava Jato
A defesa do Jayme Rincón se manifestou, por meio de nota, confira na íntegra.
Nota da defesa de Jayme Rincón
A defesa de Jayme Eduardo Rincón, em virtude da manifestação do Ministério Público Federal divulgada pela imprensa local nesta data e veiculada no Jornal O Popular, no sentido da manutenção dos processos referentes à Operação Cash Delivery e seus dependentes na Justiça Federal, vem manifestar a sua estranheza diante de tal posicionamento, porquanto em seu parecer sobre o pedido feito pela autoridade policial, nos autos da Medida Cautelar nº 27075-92.2018.4.01.3500 (fls. 517-verso/518 e 520-verso), a qual não tramita sob segredo de justiça, o Ministério Público foi enfático, ao fundamentar o seu pleito, no sentido de que as investigações versavam sobre a obtenção junto à empreiteira Odebrecht de “recursos ilícitos para utilização em campanhas eleitorais”.
Da mesma forma, às fls. 06 e 08 dos autos da Medida Cautelar nº 27702-96.2018.4.01.3500, a qual também não tramita sob o manto do segredo de justiça, o Ministério Público Federal, ao pleitear a prisão do ex-Governador Marconi Ferreira Perillo Júnior, faz alusão à representação contida nos autos da primeira medida cautelar – 27075-92.2018.4.01.3500 – sendo categórico ao afirmar que a investigação versava sobre supostas verbas ilícitas utilizadas no financiamento de campanhas eleitorais de Marconi Perillo e de seus aliados políticos. Assim, encampando o entendimento então adotado pelo Ministério Público Federal, o excelentíssimo senhor Juiz Federal Substituto da 11ª Vara da Justiça Federal, às fls. 24-verso/25 dos autos, utiliza como razão de decidir a suposição de que as verbas auferidas de forma fraudulenta eram utilizadas nas campanhas eleitorais de Marconi Perillo e de outros candidatos aliados, bem como o temor de que tal estrutura para arrecadação de recursos continuasse em funcionamento, de forma que a prisão do ex-Governador deveria ser levada a efeito antes mesmo do término do período eleitoral.
Caracterizada, portanto, a conexão dos supostos delitos investigados nos autos do inquérito policial correlato às medidas cautelares supracitadas com a investigação referente à suspeita de ocorrência do delito descrito no artigo 350 do Código Eleitoral, qual seja, “omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais”, o que firma a competência da Justiça Eleitoral para o seu processamento e julgamento, nos termos do entendimento já sedimentado pelo Supremo Tribunal Federal.Ademais, os próprios delatores da Odebrecht afirmam, com veemência, que no caso de Goiás não houve nenhuma contrapartida, tampouco recebimento de propina, por parte de qualquer integrante do Governo de Goiás às supostas doações para as campanhas de Marconi Perillo em 2010 e 2014, chegando a dizer, inclusive, “ele não poderia garantir ou afirmar que seríamos vencedores de nada, evidente. Mas este seria um foco importante do governo dele”. A Odebrecht não firmou nenhum contrato com o Governo de Goiás.
Por fim, é bom que se diga, que o Ministério Público Federal, mudando a orientação que sempre adotou no processo, não quer ver o mérito sendo apreciado, mas, sim, discutir questão de competência que, o Supremo Tribunal Federal já sedimentou tais questões devem ser remetidas para a Justiça Eleitoral. É o que está acontecendo em todo o País. A começar pelo próprio Ministro Fachin, voto vencido na questão, privilegiou o princípio da colegialidade e determinou o encaminhamento dos processos que versam sobre matéria idêntica, sob sua relatoria, à Justiça Eleitoral.