A Universidade Federal de Goiás (UFG) entra, a partir de 20 de maio, em mais uma etapa de sua história: o início da consulta pública que culminará na escolha da nova gestão da Reitoria. Entre os nomes que se colocam na disputa está o da professora Karla Emmanuela Ribeiro Hora, que, ao lado do professor Eliomar Pereira, propõe uma candidatura com forte viés crítico ao atual modelo administrativo da universidade. O grupo que comanda a instituição está no poder há cerca de 20 anos — e, para Karla, essa continuidade gerou distanciamento, desgaste institucional e falta de resposta a problemas estruturais antigos e recorrentes.

A pré-candidatura será registrada nos dias 20 e 21 de maio, quando se inicia formalmente a consulta à comunidade acadêmica, conduzida por entidades representativas de professores, técnicos e estudantes. O processo não tem valor legal obrigatório, mas influencia diretamente a formação da lista tríplice encaminhada ao Ministério da Educação.

Uma candidatura construída a partir da vivência

Professora há 15 anos na universidade, Karla Emmanuela construiu sua trajetória conciliando sala de aula, pesquisa, extensão e cargos de gestão. Atuou como coordenadora e vice de cursos de graduação e pós, além de ter sido diretora de unidade acadêmica até 2023. Ela diz que nunca se afastou da sala de aula — e é essa vivência cotidiana que a inspira a propor um novo modelo de gestão. “Eu sei o que é enfrentar a burocracia para executar um projeto. Eu vivo a dificuldade de conseguir transporte para uma atividade de campo. Acompanhei de perto estudantes desistindo do curso por falta de apoio”, afirma.

Segundo Karla, o crescimento da UFG, especialmente após a política de expansão promovida pelo ReUni, foi importante, mas não consolidado. “Criamos cursos, campi, ampliamos o número de vagas. Mas, passados 10 ou 15 anos, ainda temos laboratórios sem estrutura, prédios alugados em situação precária, falta de casa de estudante. Esse crescimento sem consolidação compromete o presente da universidade”, avalia.

Falta de estrutura, evasão e desânimo

A professora menciona a situação do campus de Goiás, onde parte das aulas ainda ocorre em instalações alugadas e com problemas de insalubridade. O restaurante universitário não atende plenamente a demanda, e a ausência de uma casa de estudante agrava a evasão. “É inadmissível que, com toda a juventude que se forma no ensino médio, tenhamos cursos com 30% de vagas ociosas. Isso aponta falhas na gestão da permanência estudantil.”

Ela também cita o campus Aparecida de Goiânia, que, após uma década de funcionamento, ainda enfrenta barreiras na mobilidade dos estudantes. “O aluno tem dificuldade até de chegar à sala de aula. Isso desestimula, desestrutura e gera abandono.”

“A UFG é excelente, mas isso se deve a quem está na base”

Apesar dos desafios, a UFG se mantém entre as universidades públicas mais bem avaliadas do país. Karla, no entanto, atribui essa excelência ao esforço coletivo de quem atua na base: “São os professores, os técnicos, os estudantes que mantêm esse padrão. Não é a reitoria que é avaliada, mas os cursos, a produção, a dedicação das pessoas que fazem a universidade no dia a dia.”

Ela destaca que a pesquisa avança por iniciativa própria dos docentes, que buscam financiamento externo mesmo diante de entraves internos. Já a extensão, segundo Karla, é a área mais sacrificada. “Faltam recursos, transporte, apoio institucional. A conexão da universidade com a sociedade está fragilizada. E essa deveria ser uma prioridade.”

“Gestão cansada, distante e sem escuta”

Na avaliação de Karla, a gestão superior da UFG, que há duas décadas se mantém sob comando do mesmo grupo, esgotou sua capacidade de renovação. “É uma gestão que apenas reproduz modelos antigos. Ela não escuta, não se abre, não dialoga. Isso causa frustração e cansaço entre servidores e alunos.”

Ela relata que o retorno às aulas presenciais no pós-pandemia revelou um corpo técnico esgotado e um ambiente acadêmico fragilizado. “A universidade adoeceu. E a reitoria não acolheu isso. Faltou escuta, sobrou distanciamento.”

Assistência estudantil como prioridade

A candidata à Reitoria sustenta que, sem políticas de permanência efetivas, a UFG continuará vendo estudantes deixarem os cursos por motivos que poderiam ser resolvidos com organização e prioridade. “É moradia, é alimentação, é saúde mental. É isso que mantém o aluno na universidade. E isso precisa ser prioridade número um.”

Ela reconhece que houve recomposição parcial de recursos com o atual governo federal, mas questiona a forma como eles são aplicados. “O PNAES, por exemplo, teve aumento. Mas quem decide para onde esse recurso vai? Falta transparência. As unidades não são ouvidas. Os conselhos não deliberam. É um modelo de gestão centralizado e pouco participativo.”

Propostas: escuta, reorganização e gestão compartilhada

Entre as propostas centrais da chapa estão a criação de canais permanentes de escuta, com participação ativa das unidades acadêmicas e dos conselhos; a reestruturação da assistência estudantil; a simplificação de fluxos administrativos; e uma política de expansão com responsabilidade. “Não somos contra crescer, mas primeiro é preciso cuidar do que já existe. Expandir sem consolidar é repetir os erros que nos trouxeram até aqui.”

Ela defende ainda uma gestão comprometida com a saúde institucional da universidade. “Isso passa por acolher, dialogar e prestar contas. A universidade não é feita apenas de números. Ela é feita de pessoas.”

Crítica à lista tríplice e defesa da paridade

Um dos pontos mais enfáticos da campanha é a defesa da escolha direta para reitor(a), com voto paritário entre professores, técnicos e estudantes. Atualmente, a consulta à comunidade é informal, organizada pelas entidades, e o resultado não é determinante — pois a nomeação passa por uma lista tríplice elaborada pelo Conselho Universitário.

“A consulta precisa valer. A comunidade sabe escolher. E se os Institutos Federais já fazem isso, a UFG também pode. Queremos, inclusive, levar essa pauta ao Governo Federal”, afirma Karla. Ela critica ainda o fato de os meios oficiais da universidade não promoverem o debate. “O Jornal UFG, a Rádio e a TV Universitária deveriam ser espaços de participação. Mas não há norma para isso, então tudo fica nas mãos dos sindicatos.”

Caminho até a oficialização da chapa

Karla e Eliomar estão percorrendo unidades acadêmicas, organizando debates, lives explicativas e conversando diretamente com estudantes, técnicos e professores. A movimentação acontece até o dia 20 de maio, quando a chapa será oficialmente registrada.

A professora reforça que o tempo até a consulta — que termina em 24 de junho — será de escuta ativa e defesa de uma nova forma de conduzir a universidade. “Queremos vencer. Mas, mais do que isso, queremos fortalecer a cultura democrática da UFG.”

*Este conteúdo está alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), na Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU). ODS 04 – Educação de Qualidade

Leia também: