No programa Tom Maior da Sagres TV de quarta-feira (25), o tema foi além dos cuidados convencionais com o corpo e a mente. A pauta do dia trouxe à tona um conhecimento ancestral que une tradição, natureza e ciência: a etnobotânica. Para explicar esse campo de estudo, o convidado foi o engenheiro agrônomo João Carlos.
Logo na abertura da entrevista, João Carlos esclareceu o conceito de forma simples e direta: “A etnobotânica é uma parte da botânica que estuda a relação da planta com o homem, ou seja, na comunidade em que ela está inserida”, explicou. Essa relação envolve aspectos alimentares, medicinais, religiosos, culturais e ambientais.
Ao longo da conversa, ele destacou a importância do resgate desse saber popular. “Essa valorização não é só das raízes das plantas, mas das raízes culturais”, pontuou o especialista. Segundo ele, muitos desses conhecimentos são transmitidos oralmente, de geração em geração, e correm o risco de desaparecer.
João contou um episódio marcante para ilustrar esse risco: “Tínhamos programado conversar com um raizeiro antigo de uma comunidade rural em Goiás. Era para ser no sábado. Na sexta-feira, ele faleceu. Perdemos todo o conhecimento dele. Esse é o grande problema. Se a gente não resgatar, ele se perde”.
A etnobotânica atua como ponte entre esse saber ancestral e a ciência. João explicou que a pesquisa começa com a escuta atenta: “A gente vai até essas comunidades, aplica questionários e conversa com quem detém o conhecimento — parteiras, raizeiros, pessoas que sabem identificar a planta, a dosagem e as indicações. Muitas vezes esse conhecimento vem de pai para filho”.
O trabalho de campo se transforma em dados científicos e, muitas vezes, em comprovações. “A ciência, na maioria das vezes, apenas confirma o que o saber tradicional já sabe”, reforçou. Entre os exemplos trazidos por João Carlos, está a mamacadela, uma planta do cerrado cujo composto ativo ajuda no tratamento do vitiligo.
O composto se encontra na raiz, o que representa um desafio: a colheita pode matar a planta. Por isso, os pesquisadores desenvolvem alternativas de cultivo sustentável. “Já estudamos formas de cultivo comercial e sustentável para preservar essa espécie”, explicou.
Outras plantas citadas foram o algodãozinho do cerrado, usado para problemas ginecológicos, e a vergateza, comum nas chamadas “garrafadas”, preparações caseiras à base de ervas. “O cerrado é uma farmácia a céu aberto. E nem 70% das plantas com potencial farmacológico foram estudadas ainda”, destacou João.
João também coordena ações no Centro Estadual de Referência em Medicina Integrativa e Complementar (Cremic), onde as terapias complementares, como a fitoterapia, são tratadas com seriedade e embasamento. “Lá temos um orto medicinal com cerca de 20 espécies. Distribuímos essas plantas em forma de chá para a população e promovemos ações educativas com universidades e pacientes”, disse.
Por fim, o pesquisador reforçou o papel da etnobotânica na preservação ambiental: “Quando se conhece a importância de uma planta para a comunidade, ela deixa de ser arrancada sem critério. E isso ajuda a preservar a biodiversidade”, afirmou.
*Este conteúdo está alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), da Agenda 2030, da Organização das Nações Unidas (ONU). ODS 03 – Saúde e Bem-Estar
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