A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 206/19, que propõe a cobrança de mensalidade a alunos que estudam em universidades públicas, voltou a ser debatida na Câmara dos Deputados este ano. A matéria isentaria apenas estudantes que não têm condição financeira para realização do pagamento.

O projeto tem como relator o deputado federal Kim Kataguiri (União Brasil) e altera a redação do artigo 206 da Constituição Federal de 1988 (CF) que garante a gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais. A PEC, elaborada em 2019 pelo deputado federal General Peternelli, visa a cobrança de mensalidades dos estudantes, mediante o perfil financeiro de cada um.

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Ademais, a PEC ainda prevê a criação de uma comissão avaliadora para definir quais alunos receberiam a isenção do pagamento, além de definir o preço da mensalidade, que seria calculado a partir da média dos valores cobrados pelas universidades particulares da região, sendo, no mínimo, 50% dessa quantia.

Para entender a visão das instituições públicas e as questões jurídicas que cercam a temática, participaram desta edição do Debate Super Sábado #298 o vice-reitor da Universidade Federal de Goiás (UFG), Jesiel Freitas Carvalho; o presidente da Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação (Fineduca), Nelson Amaral; e o advogado especialista em Direito Educacional, Ivan Trindade.

Assista ao Debate Super Sábado a seguir a partir de 01’30”:

A proposta tida como polêmica por diversos grupos da sociedade brasileira é criticada pelo professor Nelson Amaral. Segundo o presidente do Fineduca, a gratuidade da educação no Brasil é uma conquista histórica estabelecida pela Constituição. “Desde 1988 sempre aparece essa discussão, em geral municiada por informações do Banco Mundial que defende a cobrança de mensalidades por instituições públicas. Se não tomarmos cuidado, vão querer instituir o pagamento para a educação básica”, alerta o professor.

Nelson relata também que a premissa para a cobrança parte de dois mitos: primeiro, que a maioria dos estudantes de instituições públicas de ensino superior são formados em colégios particulares e, segundo, que, na maioria, são de classes sociais elevadas. “Uma pesquisa realizada pelos reitores de todas as universidades brasileiras em 2018, mostrou que 65% dos alunos são oriundos de escolas públicas e que 70% possuem renda de até um salário mínimo per capita”, informa Nelson.

Além disso, o vice-reitor da UFG destaca a importância do atual sistema educacional no país, trazendo à tona o papel social que a universidade pública tem hoje. “O sistema teve uma expansão importante nas primeiras décadas desse século, sendo capaz de implementar políticas de inclusão que proporcionam mudanças importantes para o país, uma vez que dá acesso a segmentos de baixa renda que não teriam outro meio de acesso à educação”, afirma.

Jesiel ainda ressalta a produção científica dessas instituições, que representam 90% do total nacional. De acordo com ele, mexer em um modelo exitoso deve ser feito com muito cuidado e com discussões mais aprofundadas, não podendo se basear em achismos e hipóteses sem que sejam levados em conta os impactos.

Por fim, o advogado especialista em educação, Ivan Trindade, revela de que forma seria feita a distinção de quem teria ou não a isenção do pagamento. “A PEC estabelece que cada universidade deverá criar uma comissão especial com a finalidade exclusiva de aferir a situação econômica de quem poderia contribuir financeiramente ou não”.

No entanto, ainda não foram criados critérios sobre como seriam compostos os grupos de avaliação. “Não há um detalhamento de como essas comissões devem ser formadas ou mesmo quais seriam os dados cadastrais que seriam avaliados. Essas discussões aconteceram na Câmara [dos Deputados] de forma superficial e, exatamente por isso, a audiência pública foi proposta para que essas questões sejam melhor avaliadas”, alega o advogado.

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