Junior Kamenach
Junior Kamenach
Jornalista, repórter do Sagres Online e apaixonado por futebol e esportes americanos - NFL, MLB e NBA

Enem: pressão por resultados engessa ensino médio e prejudica formação cidadã

No programa Educação em Pauta da Sagres TV desta semana, o debate girou em torno do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), que faltam cerca de 150 dias para a aplicação das provas. A professora Micheline Lage, doutora em Educação e docente de Linguagens, Códigos e suas Tecnologias no Instituto Federal de Goiás (IFG), trouxe à tona os desafios diários enfrentados por educadores na preparação de alunos para o exame.

O Enem, como apontado no programa, tem se tornado o principal foco do Ensino Médio. Para os alunos, é a porta de entrada para a universidade; para os professores, uma missão complexa. “A prova do Enem vai sempre abordar temas atuais”, explicou Micheline. “Este ano, por exemplo, temos a COP30 e a crise climática como pautas possíveis. Então, precisamos estar sempre pesquisando, lendo jornais, acompanhando noticiários.”

Mas não é apenas sobre acertar o conteúdo da prova. A professora reforçou a necessidade de uma formação cultural e crítica que vá além da memorização de fórmulas ou citações. “Não adianta um aluno, no último minuto do último segundo, querer buscar um repertório cultural que ele não tem”, alertou. “Estimular a leitura literária, bons filmes, visitas a museus — tudo isso interfere no desempenho no Enem.”

A preparação para o exame, segundo Micheline, impacta diretamente a rotina dos professores. O esforço para antecipar temas, alinhar o conteúdo com as exigências da prova e, ao mesmo tempo, manter o compromisso com a formação integral do aluno, exige equilíbrio e sensibilidade.

“O Ensino Médio não se resume ao Enem”, afirmou. “Ele é uma etapa que consolida toda a educação básica. Além disso, o aluno pode tanto continuar os estudos quanto ingressar no mercado de trabalho.” No IFG, onde Micheline atua, essa visão integrada se materializa. Lá, os estudantes cursam disciplinas gerais e também recebem formação técnica em áreas como edificações e controle ambiental.

“Nossa formação é chamada de formação integrada justamente por isso”, explicou. “Mostramos ao aluno que o Enem é uma etapa importante, mas a vida não é só o Enem.” Durante o programa, os apresentadores também refletiram sobre como a pressão pelo Enem começa cedo, muitas vezes já no primeiro ano do Ensino Médio.

Micheline concordou e enfatizou que essa ansiedade deve ser combatida com uma educação sólida e humanista. “O Enem é uma prova em larga escala, sim, e fornece dados importantes para o governo pensar políticas públicas. Mas ele nunca vai medir tudo. Uma prova, por melhor que seja, é só uma prova.”

Ela ainda destacou o papel da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) na definição de conteúdos e competências mínimas. “A BNCC não é um currículo, mas uma diretriz. Ainda assim, cada região pode manter suas especificidades. A gente pode, sim, ensinar sobre o Cerrado, sobre a Catira. Tudo pode e deve entrar na formação do jovem.”

Micheline ainda deixou um recado que serve tanto para professores quanto para estudantes: “Você não pode educar o jovem pensando ‘isso aqui não vou dar porque não cai no Enem’. Nada se perde. Toda formação conta.”

A pressão para alcançar bons resultados no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) está impactando diretamente a rotina escolar de alunos e professores em todo o país. “A cobrança é muito forte”, observou Jéssica Dias, uma das apresentadoras, que tem uma irmã vestibulanda.

“Ela faz provas elaboradas pela Secretaria Estadual de Educação, que nem sempre condizem com o conteúdo dado pelo professor em sala. Às vezes, o aluno não está na mesma página da prova.” A afirmação reflete uma realidade enfrentada por milhares de estudantes que se veem pressionados a focar exclusivamente no que “cai no Enem”, deixando de lado temas relevantes para a formação cidadã.

A professora também fez um alerta sobre os riscos desse modelo engessado de ensino. “A ideia do Enem nunca foi essa, de transformar a escola em um lugar onde ele dita todas as regras. A escola tem diretrizes curriculares próprias e deve formar o aluno para a vida, não só para uma prova”, afirmou.

Ela defendeu um currículo mais diversificado, com espaço para projetos que estimulem o pensamento crítico e a criatividade. “Por exemplo, cinema à tarde na escola, uma tarde literária ou um dia de contos na biblioteca. Isso também é preparar para o Enem, mas de forma prazerosa e cidadã”, argumentou. “Não é o Enem que deve ser a camisa de força da escola.”

Outro ponto abordado foi a redação do Enem, considerada um dos maiores desafios para os estudantes. A professora alertou para os efeitos negativos da padronização: “O aluno chega ao ensino superior engessado. Ele decora fórmulas que vê no Instagram e, muitas vezes, nunca leu uma obra na íntegra.”

Segundo ela, o excesso de preocupação em seguir um modelo específico de dissertação pode inibir a capacidade criativa e a habilidade de produzir outros gêneros textuais. “Às vezes, o aluno escreve bem uma redação do Enem, mas não consegue escrever um miniconto ou uma notícia. Isso é preocupante”, apontou.

No entanto, ela também reconheceu a importância social do exame. “O Enem democratizou o acesso ao ensino superior. Ele permite, por exemplo, que um aluno do Pará dispute uma vaga em Goiás, algo que antes seria impensável.”

Apesar disso, o consenso entre os participantes foi de que é urgente resgatar o equilíbrio entre a preparação para o exame e a formação ampla do aluno. “O ensino médio conclui a educação básica. A gente não pode resumir isso a uma única prova”, concluiu a professora.

*Este conteúdo está alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), na Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU). ODS 04 – Educação de Qualidade

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