O Brasil vive um momento de extremismo político. Neste cenário, onde muitos se acham os donos da verdade, o diálogo construtivo e a tolerância com o diferente é algo raro. Mas, olhando por um prisma positivo, pode-se perceber um maior engajamento das pessoas nestas eleições. Esta semana convidei o jornalista e especialista em marketing político Marcos Villas Boas para um bate-papo sobre engajamento político no Brasil e o saldo positivo da polarização.

Para nosso entrevistado, o processo democrático passa por um período de debate intenso, o voto e a reflexão a partir do resultado eleitoral. Villas Boas trabalha em campanhas eleitorais há mais de 25 anos, e diz que essa extrema rivalidade não é nova. A diferença é a capacidade das redes sociais agruparem (e fidelizarem) as pessoas.

Lula sabe que está em um país dividido, diferente de 2002, quando venceu em quase todos os estados brasileiros. Com um congresso majoritariamente opositor, Villas Boas acredita que a tarefa de governar agora será mais difícil.

E agora?

Para os eleitores de Bolsonaro, é hora de se preparar para valorizar as conquistas que o governo que finda conseguiu. Para quem votou em Lula, é importante entender que será necessário negociar com setores antagônicos da sociedade e do Congresso. Villas Boas acredita que Lula não terá a mesma facilidade de ampliar o controle governamental sobre alguns pontos importantes, como havia feito no início deste século.

O eleitor é bombardeado por informações, muitas vezes falsas, e isso leva muita gente a fechar os olhos para outros pontos de vista sobre certo assunto. Villas Boas diz que o bombardeamento de informações enviesadas gera uma crença, um comportamento de seita, que exorciza tudo e todos que pensam diferente. “Só que nessa exorcização está algum parente próximo, uma filha, uma freira, enfim. O debate é positivo, mas a intolerância não, essa é negativa. Ela sim, sustenta ditaduras e totalitarismo”, reconhece.

O papel das igrejas foi um ativo importante nessas eleições. De certa forma, elas contribuíram para um engajamento maior da população na política nacional, independente da qualidade dessa participação. Para nosso entrevistado, este é um bom momento para uma evolução na relação Executivo e Legislativo, na qual, assim como nas mais diversas famílias, será necessário trabalhar, mais do que nunca, a tolerância.

Esta atenção especial para a política deve permanecer na população. Para nosso entrevistado, as qualidades e defeitos de cada sistema estarão cada vez mais claros. “Agora o eleitor não escolhe entre fulano e ciclano, mas entre as visões que cada um representa”, afirma. Este tipo de reflexão, continua Villas Boas, ainda é fraco quando se trata de eleger candidatos proporcionais, ou seja, deputados e vereadores.

É importante saber que o voto não é um cheque em branco. Não precisamos estar de acordo com o pacote fechado das propostas. Propor e criticar o governo que você apoia também é válido e salutar.

Imprensa

A imprensa foi uma das protagonistas deste período eleitoral. Para Marcos Villas Boas, houve veículos que se posicionaram de cada lado. Assim também ocorreu com grupos religiosos e econômicos. “O importante é entender que o sistema sob o qual estamos é a democracia”, ressalta.

E o STF, hein?

O STF também teve um papel fundamental neste cenário.  O desconhecimento de parte da população acerca das atribuições do Tribunal, além dos vários problemas que que a corte tem desde sua concepção, geraram questionamentos raivosos, inclusive do presidente da República. Para Marcos Villas Boas, cabe melhoramentos na forma de escolher os membros do judiciário, seja nas instâncias meritocráticas, seja naquelas que o ingresso se dá por indicação. “Os grupos de poder não querem abrir mão de suas prerrogativas”, finaliza.

Não sei sobre você, mas eu mesmo tenho feito reflexões importantes diante deste momento da história. Me veio à mente, quando aos 16 anos, na Praça Cívica em Goiânia, participamos do Movimento das Diretas Já, buscando nosso direito de escolher nossos dirigentes. O que evoluímos na nossa democracia nestes quase 40 anos, desde 1983? Será que o povo Brasileiro já sabe “peneirar” o que é realidade e o que é manipulação? Aquela mobilização, se fosse hoje, para muitos seria um “movimento golpista”, para outros, “um movimento de patriotismo”. Será que a política precisa ser assim tão nos extremos? Será que conseguimos ser menos donos da verdade e ter mais empatia com quem pensa diferente?

Para mim, o que importa levantar é se o processo eleitoral foi justo, imparcial.

Se a resposta for sim, quem perde deve aceitar e, dentro do possível, somar com o grupo que venceu. Perder faz parte do cenário.

Mas se a resposta é que o pleito não foi justo, quem não estiver de acordo, deve sim, em nome da tão sonhada Democracia, lutar com todas as suas forças em busca da verdade e da justiça. Ser pacífico é diferente de ser passivo, e fazer nossa parte nos traz a paz, porque lutar também faz parte do cenário.

Que o bom senso e o amor ao Brasil possam nos guiar enquanto povo, afinal, estamos todos no mesmo barco. Bora remar juntos?

Temas abordados

A eleição passou, e agora?

A polarização sempre existiu, mas este ano foi diferente

O cenário para Lula é bem diferente de 2002

Dá pra entender quem votou no candidato opositor ao nosso neste segundo turno?

Onda de patriotismo ou manipulação?

Como as igrejas entraram nessa barca?

Será que o brasileiro vai permanecer ligado na política?

Escolha do voto não é um cheque em branco

O papel da imprensa e das instituições nesta eleição

Os algoritmos como obstáculo para uma terceira via

E o STF, hein?