No último sábado (1º), em meio a uma tarde de atos a favor do presidente Jair Bolsonaro, dois manifestantes utilizaram roupas semelhantes as da tradicional Procissão do Fogaréu para pedir que Deus perdoe os torturadores. O fato foi registrado na cidade de Goiás e gerou notas de repúdio de entidades e da prefeitura do município. O presidente da Organização Vilaboense de Artes e Tradições (Ovat), Rodrigo Passarinho, afirmou em entrevista à Sagres que prepara os documentos para entrar com uma representação na Polícia Civil e no Ministério Público sobre o caso.

“A gente vai tomar todas as providências que forem necessárias, não seremos formadores de juízos de valor, apenas queremos que se investigue, porque é a investigação que vai trazer elucidação aos fatos, apurar se realmente houve o crime. E que sirva de exemplo para que outras pessoas não utilizem as expressões culturais, religiosas, a imagem em frente aos templos religiosos, para se autopromover”.

Ouça a entrevista completa:

O presidente da organização procurou deixar claro que as ações tomadas pela entidade não tem a ver com as manifestações ocorridas a favor de Jair Bolsonaro, mas sim que há uma preocupação em função da utilização da imagem da Procissão e, também, o fato dos manifestantes estarem em frente à Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, construída, à época, por pessoas em situação de escravidão, já que nas outras igrejas havia um impedimento para a entrada deles. “A associação da imagem em frente à igreja pode ser entendida como uma forma de demonstrar deboche ao sentido religioso”.

Sobre a utilização da roupa, Rodrigo afirmou que apesar da semelhança, essas vestidas pelos manifestantes, remetem a outro grupo e que na Procissão, os farricocos encapuzados têm várias cores, justamente para impedir que haja alguma associação a grupos intolerantes. “O farricoco branco, ele nunca vai estar ligado a nenhum tipo de ato que remeta à tortura, muito pelo contrário, ele pede a paz”.

A entidade não faz qualquer tipo de apoio à ditadura militar no Brasil, conforme as declarações do presidente. Rodrigo ainda citou a fundadora da Ovat, a jornalista Lina Maria, que segundo ele, foi presa durante o regime. “Nós tivemos religiosos que foram presos, pessoas formadoras de opinião, do movimento artístico, do movimento cultural”.

Uma das preocupações para Rodrigo é com uma possível manifestação, com o mesmo tom em uma próxima Procissão do Fogaréu, que chega a triplicar a quantidade de pessoas na cidade. “A imagem sugere uma possível intolerância religiosa e étnica.”

Notas de esclarecimento

No dia seguinte a viralização da imagem com os manifestantes, a Ovat já lançou nota esclarecendo que não havia participado que sequer tinha conhecimento do ocorrido. Confira a nota na íntegra abaixo.

Na tarde de ontem, como é de amplo conhecimento, fomos surpreendidos com a distribuição de algumas fotografias nas redes sociais, das quais continham duas pessoas com vestimentas brancas, capuz com dois furos sobre a cabeça e que portavam uma espécie de cartaz/faixa com a descrição “Deus perdoe os torturadores” e logo abaixo “Nosso Brasil pertence ao Senhor Jesus” e “Direita com Bolsonaro”.

A Organização Vilaboense de Artes e Tradições – OVAT, instalada em 1965, entidade da sociedade civil organizada sem fins lucrativos, com a missão de zelar pela memória e a salvaguarda do patrimônio imaterial de Goiás, desde sua fundação é a mantenedora da Procissão do Fogaréu e de outras expressões culturais de nossa cidade.

Devido à demanda de questionamentos e mensagens de apoio recebidas nas redes sociais, pela UFG, imprensa e por pessoas que reconhecem os serviços que prestamos gratuitamente para a dinamização e valorização da cultura vilaboense e goiana, a estes e quem interessar, esclarecemos que a OVAT e a Procissão do Fogaréu não participaram dessa exibição pelas ruas de Goiás e tão pouco tem conhecimento de quem sejam os possíveis autores.

Em detrimento da repercussão negativa que isso ensejou, tomaremos todas as medidas cabíveis junto as autoridades competentes: MP, Polícia Civil, MPF, Polícia Federal e OAB, e a estas nos colocamos à disposição naquilo que for necessário para averiguar a autoria deste fato.

Desde a fundação da OVAT, as suas atividades e realizações sempre semearam o ecumenismo ao lado da Igreja Católica, a harmonia com as demais religiões, o respeito entre elas e a ampla defesa aos direitos humanos.

A OVAT é contra: a incitação à ditadura, intolerância religiosa e étnica, preconceitos, silenciamentos, tortura, violência e quaisquer que sejam os atos que estimulem a violação dos direitos difusos e sociais.

Agradecemos a população e as instituições pelas manifestações e o apoio prestados.

Organização Vilaboense de Artes e Tradições – OVAT, Fundada em 1965.