O puerpério, também chamado de resguardo ou quarentena, é a fase pós-parto em que a mulher experimenta modificações físicas e psíquicas. O período dura de 45 a 60 dias, e nos casos em a mãe amamenta por mais de seis meses, esse tempo pode ser maior. Somado à gestação, esse intervalo chega perto de um ano e meio de preparação e dedicação ao bebê e à família.

A dedicação ao recém-nascido inclui a preocupação constante com o trabalho, e muitas vezes essa reciprocidade, por parte do empregador, inexiste, e a mulher passa boa parte ou todo esse período com a dúvida: vou perder o emprego ou não?

A psicóloga clínica e organizacional, Rita Borges, relata que recebe muitas pacientes que se enquadram nesta situação de insegurança e de incerteza quanto à carreira profissional em razão do ciclo grávido-puerperal.

Rita Borges (Foto: Sagres Online)

“Para que essa mulher consiga hoje se readequar à rotina, é importante que ela tenha uma clareza, e eu sei que esse não é um processo muito fácil quando ela está passando por esse período de reinserção no mercado de trabalho”, afirma a especialista.

Um estudo feito pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) aponta que o retorno da licença-maternidade de 120 dias, direito garantido pela Constituição, por exemplo, é um enorme desafio. De acordo com o relatório, a probabilidade de emprego das mães no mercado de trabalho formal aumenta gradualmente até o momento da licença, e decai depois.

O levantamento mostra ainda que o desemprego nos 12 meses após o início do benefício se mostrou bastante elevado: 35% para mulheres com maior nível de instrução e 51% para as menos escolarizadas. Para as que não possuem um companheiro ou companheira com remuneração, a situação é ainda mais difícil.

“Muitas empresas ainda veem a mãe como uma dúvida. Quando o filho fica doente, quando o filho não pode comparecer à escola. Como lidar com essa mãe?”, avalia a psicóloga, que elaborou uma lista de orientações que você pode conferir ao final desta reportagem.

Ouça a entrevista na íntegra a seguir

Ouvidoria da Mulher

Outra situação agravante é a de mulheres que sofrem violência. A Ouvidoria da Mulher, da Câmara Municipal de Goiânia, criada a partir de projeto de autoria da ex-vereadora e ex-secretária municipal de Direitos Humanos e Políticas Afirmativas de Goiânia, Dra. Cristina Lopes, e restruturada pela vereadora Aava Santiago, presta atendimento a vítimas de violência doméstica e de gênero.

De acordo com a coordenadora Maria Clara Dunck, 79% das mulheres que chegam à ouvidoria são mães, e muitas buscam emprego para poder continuar mantendo os filhos.

“Vamos em busca de parcerias que promovam essa empregabilidade de mulheres. A Ouvidoria atende às demandas dessas mulheres. Falamos com a Secretaria da Mulher. Temos a Rede Compre de uma Mulher, que trabalha apenas com empreendedoras, e a gente faz a divulgação desses trabalhos”, afirma Dunck.

Segundo a coordenadora, o atendimento psicoterápico é o carro-chefe da Ouvidoria, que criou a Rede Acolha Uma Mulher, além de oferecer cursos de capacitação.

Maria Clara Dunck em entrevista à Sagres (Foto: Sagres Online)

“Agora, por exemplo, estamos na segunda edição do curso de costura, que é uma parceria com o clube de costura do Mega Moda Shopping em que estamos promovendo a formação de mulheres surdas com intérpretes fornecidas pelo curso de Libras da UFG. Estamos sempre propondo parcerias para promover a empregabilidade a partir das demandas que elas trazem”, argumenta a coordenadora.

Segundo Maria Clara Dunck, a Ouvidoria da Mulher conta com uma equipe de psicólogas que ajudam a orientar as mulheres, e novas profissionais podem integrar o time.

“As psicólogas podem destinar 1 hora de sua semana. Muitas alunas recém-formadas se interessam por esse trabalho, porque é uma forma de ingressar no mercado de trabalho. Elas passam por um treinamento aqui na ouvidoria, por cursos de capacitação, é um voluntariado que interessa bastante a elas, e entram em contato com uma realidade que pode ser uma forma de se especializar”, afirma.

As interesadas podem entrar em contato pelo número (62) 98222-2434 ou pelo Instagram @ouvidoriadamulher.

Ouça a entrevista na íntegra a seguir

Reorientação

Em entrevista à Sagres, a psicóloga Rita Borges, que trabalha com a reinserção de mulheres no mercado de trabalho, em especial gestantes e puérperas, elaborou uma lista de orientações que pode ajudar nesse processo de reorganização profissional.

1) Mantenha o currículo atualizado

“Coloque as suas principais competências. Muitas vezes você prestou um trabalho, fez uma venda, um atendimento que às vezes não se coloca no currículo, e isso é importante para analisarmos as habilidades comportamentais que é o ‘saber fazer’. Habilidade é tudo aquilo que eu sei. Esse é sim um diferencial na hora de buscar um trabalho nesse período em que se está se readaptando”.

2) Estabeleça uma rotina

“Quando você estabelece um check-list de horários, você também tem uma clareza de como vai ser o seu dia para lidar com as intercorrências que podem acontecer nesse período. Tem coisas que a gente não controla. Tendo uma clareza do seu dia, você vai conseguir trabalhar a sua ansiedade, a sua organização, o seu planejamento, coisas muito importantes para seu modelo mental para esse momento”.

3) Faça o que gosta

“Nesse período é importante que a gente trabalhe o autoreforço, trabalhe o sendo de esperança de que os dias serão melhores. É procurar se atualizar, fazer uma formação, um curso gratuito. Podem até ser coisas que você não conhece, mas que são diferenciais competitivos no mercado, para que você possa estar atualizada e entrar na concorrências dessas vagas”.

4) Fazer uma atividade física

“Isso proporciona alguns hormônios de sensação de prazer como dopamina, serotonina. Não é muito fácil, não é todo mundo que gosta de fazer atividade física, mas esse é um hábito angular. É um tipo de hábito que acaba melhorando outros hábitos que nós temos. O nosso cérebro busca economizar energia todos os dias, então a gente acaba lidando com as situações de uma maneira automática”.

5) Rede de relacionamentos

“Quando a gente entende que há pessoas com quem a gente pode contar, isso facilita muito. Ter uma clareza, lembrar das coisas nas quais somos boas, superar desafios, momentos de dificuldade financeira. É importante resgatar esses momentos também para que a sua autoeficácia seja reforçada”.

6) Mindfullness

“Temos pesquisas na psicologia e na terapia cognitiva e comportamental que fundamentam que a diminuição da ansiedade, a clareza, a tranquilidade e a calma são sim resultados proporcionados pelo mindfullness. Basta procurar no YouTube ‘meditação guiada 5 minutos’ que você vai achar pessoas que podem te ajudar e no início do seu dia começar a fazer essa meditação guiada, mesmo que seja por 5 minutos”.

7) Exercício da gratidão e do orgulho (psicologia positiva)

“Toda vez que você fizer uma atividade que foi difícil, que você anote. No que você é grata? Há pesquisas científicas fundamentadíssimas na diminuição da ansiedade e de alguns sintomas depressivos. Anote pelo que você é orgulhosa, qual foi a conquista que você teve naquele dia? São atitudes simples mas que têm efeitos a longo prazo muito grandes”.

8) Poupança financeira

“Busque, sempre que possível, uma renda extra. Quando você faz uma poupança financeira, isso te garante uma estabilidade emocional mesmo que você não volte para a empresa”.

9) Desenvolva novas habilidades

“Muitas vezes a gente atribui a nossa carreira ao emprego que temos naquele momento, e sua carreira não é o emprego em que você está. Nós estamos nessa função. Então é importante que você descubra quais são as outras funções que você consegue exercer. Quanto mais leque de oportunidades você abre e você se fortalece para esse momento, mais vai ficar a sua saúde mental para que você não tenha medo de fazer essa escolha”.

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