Um novo estudo realizado por pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) revela que a Floresta Amazônica pode conter mais de 10 mil registros de obras pré-colombianas, construídas antes da chegada dos europeus. Os resultados deste estudo foram publicados na revista Science, na sexta-feira (6).

Essas estruturas, conhecidas como “obras de terra”, precedem a chegada dos europeus ao continente. A pesquisa utiliza tecnologia de monitoramento remoto avançada, dados arqueológicos e modelagem estatística para estimar a quantidade de ocupações que ainda podem estar ocultas sob o dossel da floresta amazônica e identificar os possíveis locais onde essas estruturas podem ser encontradas.

O estudo, liderado pelos pesquisadores Luiz Aragão e Vinicius Peripato do INPE, identificou 24 novos registros arqueológicos usando uma tecnologia de mapeamento remoto avançada chamada LiDAR (Light Detection and Ranging), que utiliza um laser embarcado em uma aeronave para criar modelos 3D detalhados da superfície.

A partir desses modelos 3D, a vegetação foi digitalmente removida para permitir a investigação arqueológica do terreno sob a floresta. Investigamos um total de 0,08% da Amazônia e encontramos 24 estruturas, jamais catalogadas, nos estados do Mato Grosso, Acre, Amapá, Amazonas e Pará”, ressaltou Vinicius Peripato.

Registros

A equipe também usou os 961 registros de obras de terra encontrados até o momento para estimar a quantidade de estruturas que ainda podem ser descobertas. O estudo mostrou que dezenas de espécies de árvores estão relacionadas a essas ocupações, que datam de um período entre 1.500 a 500 anos atrás.

“O estudo indica que a floresta amazônica pode não ser tão intocada quanto muitos pensam, já que quando buscamos uma melhor compreensão da extensão da ocupação humana pré-colombiana na região nos surpreendemos com a grande quantidade de sítios ainda desconhecidos pela ciência”, destacou Peripato.

“Tempos atrás, os ecólogos viam a Amazônia como a grande floresta intocada, mas agora, combinando outros tipos de vestígios pré-colombianos, podemos perceber como muitos locais que hoje sustentam uma densa floresta já foram submetidos a extensas obras de engenharia e ao cultivo e domesticação de plantas pelas sociedades pré-colombianas”, apontou a pesquisadora Carolina Levis, da Universidade Federal de Santa Catarina. “Esses povos dominavam técnicas sofisticadas de manejo da terra e das plantas, em certos casos, ainda presentes nos conhecimentos e práticas dos povos atuais que podem inspirar novas formas de conviver com a floresta sem a necessidade de destruí-la”, completou.

Avanço científico

Luiz Aragão, chefe da Divisão de Observação da Terra e Geoinformática do INPE, destacou o avanço científico e tecnológico alcançado pela pesquisa. “O estudo avança o conhecimento em três grandes áreas: na própria arqueologia, por meio de novas descobertas; nas ciências ambientais, demonstrando o nível de interferência humana na região, o que pode ter implicações para seu funcionamento atual e como modelamos o seu futuro; e finalmente na área de computação aplicada, que possibilitou a análise dos milhões de pontos presentes nos dados LIDAR e na modelagem estatística da distribuição das feições estudadas”, afirmou.

Até então, as obras de terra eram geralmente identificadas por meio de imagens do Google Earth. No entanto, devido à vastidão da Floresta Amazônica e às dificuldades de acessar áreas remotas, este estudo oferece previsões testáveis sobre locais pouco explorados na Amazônia, onde futuras expedições provavelmente descobrirão sítios arqueológicos de grande importância e bem preservados na floresta.

“A pesquisa traz inúmeras evidências da ocupação ancestral da floresta amazônica por povos originários, de suas formas de vida e da relação estabelecida por eles com a floresta. A proteção de seus territórios, línguas, culturas e heranças deve ser compreendida como milenar, como são, e não ligada a uma data, que é tão recente”, destacou Luiz Aragão.

O estudo, publicado na revista Science, foi conduzido por uma equipe composta por 230 pesquisadores de 156 instituições localizadas em 24 países de quatro continentes.

*Este conteúdo está alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), na Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU). ODS 10 – Redução das Desigualdades

Leia também: