Falta de interesse e baixa procura pelos cursos gratuitos profissionalizantes, ausência de afinidade pelas áreas do mercado que demandam trabalhadores, dependência dos programas assistenciais do governo federal e má qualidade do ensino básico. Estes são os principais fatores que justificam a falta de mão de obra qualificada em diversos setores da economia goiana, prejudicando o desenvolvimento do Estado.  

Esse cenário não é novo, mas diante da probabilidade de maior crescimento da economia no Brasil, representa um entrave que preocupa o governo e a classe empresarial. Junto com a falta de infraestrutura a carência de mão de obra qualificada pode, no mínimo, atrasar o sonho de ver o País no rol das maiores economias mundiais.   

Os dados do IBGE são evidentes ao revelar que setores como a indústria, serviços domésticos e a construção civil sofrem cada vez mais com a falta de mão de obra e a disponibilidade de profissionais no mercado. As análises do IBGE apontam ainda que, em 2012, 18,7% da população empregada estavam atuando no comércio e 17,8%, na prestação de serviços como transporte, limpeza urbana e serviços pessoais. Ou seja, mais de 36% da população trabalhava nos setores comerciais e na prestação de serviços.

As estatísticas, cuja pesquisa foi realizada no período de 2003 a 2012, apontam que os setores de comércio e serviços sustentam a economia, com os mais altos índices de contratação de profissionais. Diferentemente da construção civil, que atingiu somente a porcentagem de 7,8% do total de empregados, pouco mais que os profissionais domésticos, que somaram apenas 6,6%.

Mauro FaiadEm Goiás, dentro desse novo ciclo econômico, a situação é mais grave. De acordo com o secretário de Ciência e Tecnologia do Estado de Goiás, Mauro Faiad, em 2010, Goiás era a nona maior economia do País, no entanto, no que se refere à mão de obra qualificada, perdia para os demais Estados brasileiros, estando colocado na posição de 17º. O principal fator que propiciou esse cenário econômico foi o crescimento acelerado da economia, que posicionou Goiás acima da média nacional, enquanto a profissionalização não acompanhou o ritmo ligeiro do Estado.

O secretário exemplifica que o Estado é um dos grandes pólos nacionais da indústria têxtil, contudo esse é um dos setores com maior déficit de profissionais disponíveis e qualificados no mercado. Para tornar o setor mais expressivo no cenário econômico goiano, o governo vem fazendo um investimento maciço no ramo, com o intuito de qualificar e trazer novos profissionais que atuem na área. Uma das apostas do governo é o Bolsa Futuro, que, segundo Faiad, vai qualificar meio milhão de pessoas até 2014. “Nós vamos qualificar em todas as áreas para permitir que os goianos ocupem os melhores lugares e salários no mercado de trabalho. Além disso, queremos qualificar a mão de obra para que Goiás continue crescendo bem acima da média nacional”, explicou.

Ítalo de Lima MachadoA opinião do gerente de Educação Profissional do Senai Goiás, Ítalo de Lima Machado, sobre o apagão de mão de obra em Goiás é diferente da do secretário e ele enumera os pontos que dificultam o acesso à profissionalização. Segundo Machado, apesar de já existir uma grande quantidade de cursos profissionalizantes oferecidos por diversas esferas do poder público, há muita falta de interesse e baixa procura por esses cursos, o que agrava a situação atual do mercado de trabalho. “São vários os setores da economia goiana que hoje estão demandando trabalhadores qualificados. O mais importante é que boa parte dessa demanda poderia estar sendo suprida por meio dos cursos ofertados pelo Senai, Senac e outras instituições formadoras de trabalhadores”, disse. Esse seria um dos fatores pelos quais o mercado de trabalho goiano padece com a falta de mão de obra qualificada: as pessoas não se interessam pelos cursos disponíveis para capacitação, deixando a maioria das vagas de aprendizado ociosas. Muitos cursos, além das aulas, ainda oferecem lanche e vale transporte para os alunos, mas mesmo assim não conseguem ocupar todas as vagas disponíveis.

Um segundo fator que explica o grande número de vagas desocupadas no mercado de trabalho é que a maior parte dos jovens que ainda não está colocada no mercado sente afinidade apenas com a informática, um setor que não possui um déficit de mão de obra qualificada como a construção civil e a indústria. No setor da construção, por exemplo, a deficiência de profissionais é tão grande que, um mestre de obras pode ganhar mais do que um engenheiro em início de carreira, garante o gerente do Senai.

A carência de mão de obra qualificada obriga as empresas goianas a buscar profissionais em outras localidades do País, e não raramente no exterior. O setor da construção é o que mais importa profissionais, assim como o ramo Sucroenergético, que tem tido um crescimento forte no Estado. Essas companhias têm vagas em diversas atividades e seções e oferecem boas remunerações, de acordo com o Ítalo de Lima. “Na construção civil estamos trazendo gente de outros Estados por causa da falta de interesse dos trabalhadores em ingressarem nesse ramo que é tão promissor em Goiás. Assim como o setor Sucroenergético que, muitas vezes, nos vemos obrigados a buscar profissionais mais qualificados em outros Estados”, analisa.

O coordenador de Desenvolvimento Humano do Sindicato da Indústria da Construção no Estado de Goiás (Sinduscon), Fabiano Santiago, discorda no que se refere à falta de interesse dos trabalhadores na construção civil. Ele explica que existem pessoas interessadas no trabalho no ramo da construção, no entanto, elas chegam cruas, sem o mínimo de qualificação. Ao mesmo tempo, o mercado da construção hoje está mais exigente e é necessária a instrução técnica dos funcionários e as construtoras exigem que os trabalhadores tenham conhecimento na área. “O nosso problema é que os candidatos às vagas disponíveis não têm aprendizado, desde a educação mais básica até o conhecimento mais técnico que a construção tem exigido atualmente”, justifica.

A analista de Recursos Humanos da Incorporadora Borges Landeiro, Juliana Gontijo, afirma que 60% do quadro de funcionários da construtora são de trabalhadores importados de outras regiões do País. Isso ocorre, de acordo com ela, porque o mercado da construção civil em Goiás está superaquecido e a mão de obra qualificada não está disponibilizada em quantidade adequada. Para amenizar o problema, a analista conta que a empresa investe maciçamente na capacitação dos trabalhadores. “Nós verificamos que hoje o mercado oferece um número bem maior de oportunidades se comparado ao número de pessoas capacitadas para trabalhar. Cerca de 60% dos nossos trabalhadores no campo de obras são naturais de outros Estados.”

Ítalo enumera o terceiro fator relacionado à falta de qualificação profissional: a dependência dos auxílios assistenciais vindos dos programas sociais do governo federal. O Bolsa Família, por exemplo, beneficia famílias com renda mensal menor que R$ 140. Para receber o recurso, as pessoas devem cumprir algumas exigências do governo, como manter as crianças de até 15 anos na escola com número baixo de faltas e vaciná-los. O benefício pode variar de R$ 32 a R$ 242 mensais, de acordo com o número e a idade dos filhos. Outras vertentes deste programa foram implementadas, aumentando ainda mais o repasse do governo às famílias carentes, como o Bolsa Escola, Cartão Alimentação, Auxílio Gás e Bolsa Alimentação. Para, Ítalo essa ajuda deveria ser temporária para que o beneficiado não se acomodasse e ficasse apenas esperando receber o dinheiro do governo. “Esses programas sociais devem vir acompanhados da qualificação profissional e das condições para que os beneficiados adquiram autonomia e exerçam a sua cidadania, além de conquistarem a inclusão social”, critica.

O último fator que agrava a deficiência de profissional qualificado no mercado de trabalho é a má qualidade da educação básica do país. O gerente do Senai comenta que os alunos saem do ensino médio sem a menor qualificação para conquistarem um emprego. “No Estado de Goiás nós temos observado uma melhora no ensino básico, mas ainda há muito que ser feito. O que se espera da educação básica é que ela ofereça aos jovens uma educação que lhes sirvam de base para uma boa colocação profissional. Hoje, boa parte das pessoas que saem do ensino médio não tem a menor qualificação para o mercado”, avalia.

Henrique ArantesO Secretário de Cidadania e Trabalho do Estado, Henrique Arantes, aposta que seria necessário um investimento pesado em educação para que o Estado se tornasse uma grande potência, assim como ocorreu em outros países, onde a forte economia é resultado de uma educação básica de qualidade. “A saída de todo país para se industrializar e crescer economicamente é por meio da educação. Assim como a Alemanha e o Japão que, com a segunda guerra ficaram arrasados, hoje são potências mundiais políticas e econômicas, além de possuírem bons indicadores sociais e infraestruturais, investiram pesado na educação”, explica o secretário.

A grande oferta de cursos tecnólogos, profissionalizantes e superiores em Goiás não supre a necessidade do mercado de trabalho, de acordo com Henrique Arantes. Nos órgãos ministrantes de cursos técnicos, quase sempre, sobram vagas ociosas que não foram preenchidas por causa da falta de conhecimento da população a respeito dos cursos. “As pessoas às vezes não têm acesso ao curso que está disponível. Além disso, percebemos muita desmotivação nos trabalhadores que vão para a entrevista de emprego e recebem um não”, justifica.

Celia LandimO Sine de Aparecida de Goiânia oferece, diariamente, vagas nos mais diversos segmentos do mercado. Açougueiro, vendedor, auxiliar de farmácia, balconista, operador de máquinas são funções que exigem, pelo menos, algum tipo de qualificação e, raramente, são preenchidas. A diretora Celia Landim afirma que as empresas têm muita dificuldade de encontrar candidatos capacitados para assumirem um emprego. “Com a criação dos pólos industriais o número de vagas aumentou, mas nem sempre essas vagas são preenchidas por falta de pessoas qualificadas”, explica a diretora.

Otimista, o diretor de Qualificação da Secretaria do Trabalho de Aparecida de Goiânia, Antônio Carlos Gomes, acredita que o apagão da mão de obra no Estado pode ser suprido com as parcerias e novos programas do governo federal com o sistema Sesi, Sebrae, Senac e Senai – o Sistema S,  que vão qualificar mais de 2.500 trabalhadores no primeiro semestre 2013. “Nós já demos início as inscrições e também aos cursos, e ainda temos uma média de 1.900 vagas para serem ocupadas.” Ou seja, menos de um quarto das vagas foi ocupada e os cursos já começaram.