Depois que a Rádio 730 revelou um convênio de cooperação técnica, obscuro, entre a Secretaria de Cultura do Estado e o Sebrae, que beneficiava Décio Coutinho, a reportagem descobriu que a prática de “emprestar” servidor e receber muito por isso já foi impugnada num passado não muito distante pelo Ministério Público do Tribunal de Contas. Mas Sebrae e governo desconsideram a decisão e mantem os convênios.  

O servidor em questão, agora, já foi condenado em ação popular por violação do princípio da moralidade e, mesmo após essa condenação, continua trabalhando para o governo do Estado, lotado na Secretaria de Gestão e Planejamento. Aliás, ele já estava lotado na administração estadual antes mesmo da assinatura do convênio em questão.

O extrato do termo de cooperação firmado entre o governo do Estado e o Sebrae é de 21 de setembro de 2011. Apesar de não ser claro, ele se refere à “cessão do empregado Bruno Garibaldi Fleury, Analista Técnico II do quadro de pessoal do Sebrae/GO ( com salário que varia de R$ 5.922,35 a R$  9.804,56) para prestar serviços ao governo de Goiás por 12 meses. Pela transferência, o Estado se responsabilizou a pagar R$ 287.234,80  ao Sebrae, que por sua vez, continuaria arcando com o salário de seu funcionário. Já emprestado ao Estado, o servidor poderia ou não conseguir um cargo em comissão. E Bruno, conseguiu. O cargo é de Assessor Técnico com gratificação de R$ 4,8 mil para responder pela Superintendência de Suprimentos e Logística da Secretaria de Gestão e Planejamento. diario oficial2

Embora o empréstimo tenha ocorrido, o procurador de Contas do Tribunal de Contas do Estado, Fernando Carneiro, relata em seu despacho que a Pauta 631ª do Conselho Regional de Economia da 18ª Região, realizada em 7 de maio de 2012, traz a declaração do diretor-superintendente do Sebrae, Manoel Xavier Ferreira Filho, informando que Bruno Garibaldi Fleury e outro profissional, Alberto Elias Lustosa Nogueira, não seriam mais técnicos do Sebrae em Goiás.

Ainda segundo levantamento do procurador, a vigência do convênio entre Estado e Sebrae retroagiu a 1º de fevereiro de 2011, apesar de ter sido firmado em 16 de setembro do mesmo ano e tendo sido pago até então sem qualquer documento. E mesmo sem nota de empenho, ordem de pagamento ou qualquer documento que assegurasse o pagamento, as parcelas referentes ao período de 1º de fevereiro de 2011 a 1º de maio daquele ano, já estavam liberadas desde 31 de maio de 2011, segundo a Programação de Desembolso Financeiro nº 2011270100114.

Com base na representação feita ao TCU, foi exigido que o Sebrae só o colocasse à disposição depois de devidamente publicado o convênio. Segundo Fernando Carneiro, a decisão do TCU não o impede de trabalhar, mas apenas condicionou que o ato seja anterior à disposição dele, o que aconteceu foi que ele foi cedido sem ato algum.

Procurado pela reportagem, o analista técnico do Sebrae em Goiás, Bruno Fleury, explicou que a ação popular proposta pelo procurador de Contas Fernando Carneiro ao TCU foi julgada e arquivada, depois que uma auditoria foi feita no Sebrae e nenhuma irregularidade foi encontrada para que se pudesse suspender o convênio com o governo do Estado. Ele explicou também que se afastou do Sebrae no período em que respondeu pelo Sindicato dos Economistas do Estado e retornou ao posto após o mandato. Para ele, a ação popular é uma questão passada e cabe aos departamentos jurídicos da Procuradoria Geral do Estado e Sebrae responder às denúncias de Fernando Carneiro.

Em entrevista anterior, o diretor superintendente do Sebrae Goiás, Manoel Xavier Ferreira Filho, já havia explicado que o Sebrae é uma entidade civil sem fins lucrativos, mantido e administrado pela sociedade e sob o regime celetista e que o Conselho Deliberativo do Serviço prevê a seção de até 3% do quadro de seus empregados para desempenhar serviços correlatos ao conhecimento que a pessoa tem para prefeituras, federações, entidades de classe e governo. Em Goiás, são 205 funcionários sendo que até seis podem ficar a disposição de um órgão ou entidade parceira.

O controlador do Estado, Jose Carlos Siqueira, corroborou as palavras de Manoel Xavier e garantiu que esse tipo de convênio entre o governo e o Sebrae é legítimo, assim como a transferência de profissionais do Sesi e Senai, outros organismos do terceiro setor e até mesmo do Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal. “Eles tem servidores de nível qualitativo interessante e, vez e outra, o governo busca esses profissionais para ocupar cargos relevantes dentro da administração pública. O próprio atual superintendente do Sebrae, Manoel Xavier, já ocupou cargos importantes no governo do Estado em governos anteriores. O governo repõe para o Sebrae o valor do salário fixo deles e eles têm, assim como os servidores estaduais, uma gratificação do cargo em comissão equivalente a 60% do valor da representação do cargo em comissão, de forma que eles não recebem o valor integral.  Agora, se ele vem simplesmente à disposição do Estado, ele não recebe nada do Estado, e fica somente com o salário dele no Sebrae”, explicou Siqueira. E nos dois casos já revelados pela reportagem, os técnicos do Sebrae recebem os dois salários.

O controlador explicou ainda que nunca recebeu nenhum tipo de questionamento sobre esse intercâmbio, nem mesmo do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado, até porque não é a primeira vez que é realizado e nem a primeira instituição da fazer esse empréstimo.

Para o procurador de Contas Fernando Carneiro, o importante aqui é questionar a legalidade ou não dessa norma que permite chamar a pessoa e ainda pagar o salário dele. Segundo ele, se o cedido vai ocupar um cargo em comissão, não há que se falar em pagamento de salário, ele deveria fazer opção: ou pelo salário, e nesse caso é mera disposição, ou assume o cargo em comissão e abdica do salário do Sebrae.