A Secretaria de Estado da Cultura não sabe indicar o paradeiro de R$ 1.604.668,92 destinados a projetos culturais por meio da Lei Goyazes, instituída em 2001 e que permite a captação de recursos na iniciativa privada com direito à isenção fiscal para as empresas doadoras. Trinta e três produtores culturais ou aplicaram os recursos de forma errada ou simplesmente não desenvolveram projeto algum para o fomento da cultura no Estado. Os processos foram encaminhados para a Secretaria da Fazenda (Sefaz) para a tomada de contas e recuperação dos créditos utilizados indevidamente pelos proponentes.
As informações obtidas pela Rádio 730 são baseadas na resposta oficial do governo à solicitação feita há quase um mês por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI). Os anos de 2003 e 2004 lideram a lista do maior número de proponentes que não cumpriram as exigências legais para prestação de contas e comprovação da realização do projeto, com 8 produtores cada.
Embora com 12 anos de existência da lei, no levantamento repassado pela Secult, não constam uso indevido dos recursos do programa nos anos de 2007, 2011 e 2012. O Superintendente Executivo da secretaria, Décio Coutinho, explica que nos anos de 2011 e 2012, os proponentes que não prestaram contas ainda estão na fase de serem notificados e apresentarem recursos, portanto, ainda não podem ser considerados inadimplentes.
Altosplanos Produções Audiovisuais Ltda, Agenda 4 Comunicação Ltda, Maurizio Romes de Medeiros e Ivan Evaldo de Matos encabeçam a lista de proponentes que tiveram seus projetos aprovados com maior valor de captação de recursos. A Altoplanos Produções Audiovisuais, por exemplo, teve aval para buscar patrocínio no valor de R$ 233.046,05. A Agenda 4 Comunicação captou recursos que chegaram a mais de R$ 227 mil. Já Maurizio Romes e Ivan Evaldo, conseguiram R$ 93.799,01 e R$ 90.099,83, respectivamente.
O montante do calote levado pelo governo do Estado pode indicar a falta de uma maior fiscalização e rigor por parte da Secult e a dificuldade da Sefaz em recuperar os créditos. Embora em alguns casos os proponentes tenham sido autuados pela Sefaz há mais de 10 anos, os processos encontram-se ainda em andamento na Gerência de Recuperação de Créditos do órgão, sem desfecho.
A Secult faz uma mea culpa ao admitir que a fiscalização realmente pode ser melhorada dentro do programa. “Porém, o que talvez mais falte, mais importante que o rigor é a questão do esclarecimento, da capacitação. A partir do momento que a pessoa entra no programa, ela tem que cumprir uma série de requisitos que são extremamente pesados para alguém que trabalha com cultura, que não está muito habituada com essa questão, já que ela é bastante voltada para a contabilidade, para a área fiscal”, analisa Décio.
Ou seja, para o superintendente, mais do que o rigor na auditoria da prestação de contas dos proponentes, o principal problema seria na parte da qualificação. Outro desafio que Décio aponta para o aperfeiçoamento da lei é a simplificação do processo. “Porque você pensa em um artesão do interior do Estado. Ele teria muitas dificuldades de cumprir todos esses ritos que a lei exige e no final ele acaba não sendo contemplado”. Porém, se hoje o proponente já cumpre uma série de requisitos pesados para não correr o risco de se tornar inadimplente, com a simplificação do processo, como sugere Décio, a tendência é que o governo tome um calote maior ainda.
Décio não soube informar os motivos exatos que levaram os proponentes a não cumprirem as exigências legais para prestação de contas. “São vários erros. O proponente tem que recolher guias, apresentar toda documentação fiscal, se a proposta é a produção de um CD, DVD, livro, ele precisa entregar uma parte do produto para a Secult. Qualquer uma dessas não conformidades leva a essa notificação. É difícil falar, porque cada caso é diferente”.
Etapas
Após a aprovação do projeto cultural pelo Conselho Estadual de Cultura e a homologação do resultado pela Secult e divulgação da lista no Diário Oficial do Estado, o proponente tem um período para a captação dos recursos e execução do projeto. Após 30 dias do término de execução do projeto, o proponente precisa prestar contas e ainda entregar 10% do produto cultural à Secult. Pela lei, o prazo para a execução do projeto não pode ultrapassar 12 meses e o proponente precisa prestar contas mensalmente do valor captado ao órgão.
“Após esses 30 dias, caso o proponente não tenha prestado conta ou a prestação tenha ficado incompleta ou com falhas, o processo é analisado por nossa auditoria interna. É feita uma notificação e a pessoa tem 20 dias após a notificação para entrar com recursos e ajustar a prestação de contas. Caso ela não tome providência, aí o nome dela é encaminhado à Sefaz para ser negativado na dívida ativa do Estado”, explica Décio. O proponente que não prestou contas fica proibido de recadastrar no programa pelo prazo de 5 anos.
Porém, outra falha do governo é que hoje não existe um feedback por parte da Sefaz quanto aos proponentes que conseguiram resolver a situação. “A gente não tem esse retorno. É outra coisa que precisamos avançar junto à Sefaz, porque seria importante sabermos quais pessoas resolveram a situação, quais que não. Em um caso ou outro temos essa informação, mas não é algo rotineiro, não é sistematizado”.
Consultoria
Enquanto a Secult não adota um maior rigor na fiscalização dos projetos culturais, o órgão busca alguns recursos para orientar os produtores culturais. Hoje, por exemplo, uma equipe da Secult faz o atendimento personalizado aos proponentes para tirar dúvidas. Em parceria com o Sebrae Goiás, o órgão realiza pelo interior do Estado cursos para a elaboração de projetos culturais.
Em janeiro do ano que vem, a Secult vai lançar uma espécie de Vapt Vupt da Cultura, no edifício Parthenon Center, no Centro. O escritório terá o objetivo de trabalhar essas questões, como da Lei Goyazes, junto à classe cultural. “Vai ser um escritório de apoio aos artistas”.
Desde o terceiro governo de Marconi Perillo (PSDB), já foram investidos quase R$ 20 milhões com a lei. Para esse ano estão previstos R$ 10 milhões, sendo R$ 6 milhões já captados, restando R$ 4 milhões para novos projetos. De 2007 a 2011, o governo contabiliza uma média de mais de R$ 16 milhões em incentivo. De 2008 a 2012, a Secult homologou a habilitação de 511 proponentes. A maior parte dos projetos está relacionada à área musical, com 179 propostas aprovadas.