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Após 11 anos de tramitação o ex-Senador e ex-Governador de Minas Gerais, Eduardo Azeredo, teve esgotado os recursos em segunda instância e determinada sua prisão provisória pelo 5ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça Mineiro ao rejeitar a unanimidade de votos os embargos de declaração opostos pela defesa.
Novamente volta à baila a questão da constitucionalidade da prisão cautelar após a condenação em segundo grau de jurisdição. Com a determinação da imediata prisão do Azeredo, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais rasga a Constituição da República, jogando na latrina um dos mais caros direitos fundamentais que é a liberdade de locomoção.
O texto constitucional expressamente aponta que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória” (art. 5º, LVII). O dispositivo constitucional é claríssimo, ninguém sai da condição de acusado para condenado sem que a haja sentença penal condenatória transitada em julgado. O Ministro Ricardo Lewandowski, em outra oportunidade, asseverou com brilhantismo que “Não vejo como fazer uma interpretação contrária a esse dispositivo tão taxativo”.
Não se olvide que a perda do estado de inocência apenas ocorre com o esgotamento dos recursos em todas as instância. Ou seja, após a decisão no último recurso no Supremo Tribunal Federal.
A fundamentação dos defensores que lutam pela possibilidade do início de cumprimento de pena com o esgotamento da via recursal em segunda instância reside no fato de que se encerraria a análise de fatos e provas que assentaram a culpa do condenado.
Desculpem os que pensam assim, mas tal argumentação é no mínimo uma interpretação pueril do texto constitucional, pois as Cortes Superiores podem sim rever as condenações impostas, por exemplo, modificando penas ilegalmente aplicadas, afastando provas ilícitas, para tanto analisam, sem sobra de dúvidas, os fatos. O que não podem é revolver as provas ou fazer novas instruções. Cumpre destacar que 30% (trinta por cento) das condenações são revertidas no Superior Tribunal de Justiça, quer com a mudança de regime, quer com a redução da pena, quer ainda com a absolvição como ocorreu no RHC nº 61.367 – RJ, Relator MINISTRO REYNALDO SOARES DA FONSECA, julgado em 27 de fevereiro de 2018, oportunidade que o C. STJ: “Acontece que, para fins penais, as Turmas que compõem a Terceira Seção desta Corte Superior, na esteira também de orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento o Habeas Corpus n. 125.218/RS, não admitem que os dados sigilosos obtidos diretamente pela Secretaria da Receita Federal do Brasil sejam por ela repassados ao Ministério Público ou à autoridade policial, para uso em ação penal, pois não precedida de autorização judicial a sua obtenção, o que viola o princípio constitucional da reserva de jurisdição.”
Torna-se evidente que as Cortes Superiores podem, via recursal, modificar o destino de um ser humano. Assim, poderiam restar presos pessoas inocentes ou situações que permitiriam o ingresso em regime menos gravoso. Não podemos agir no afã midiático, pois inúmeras injustiças são cometidas assim.
No mesmo sentido, segundo o mestre Gustavo Badaró há que ser feita as seguintes indagações aqueles que defendem a esdrúxula possibilidade de início de cumprimento de pena com a condenação em segunda instância: “seria da essência da presunção de inocência que tal estado do acusado vigore temporalmente até que a condenação transite em julgado?” Inequivocamente a resposta é não.
Não se poderia olvidar da magnífica lição do Decano Celso de Mello, que, enfaticamente, defende a incompatibilidade da execução provisória da pena com o direito fundamental do réu de ser presumido inocente conforme expressamente garante a Constituição da República Federal. Segundo o Ministro, a presunção de inocência é conquista histórica dos cidadãos na luta contra a opressão do Estado e tem prevalecido ao longo da história nas sociedades civilizadas como valor fundamental e exigência básica de respeito à dignidade da pessoa humana.
Dessa forma, tal como ocorreu com o ex-presidente Lula e com centenas de outras pessoas, determinar o encarceramento cautelar pura e simplesmente em decorrência da condenação e esgotamento recursal em segunda instância de Azeredo afigura-se absolutamente inconstitucional.
O STF tem a obrigação moral de julgar imediatamente as ADC 43 e 44 pondo fim a essa insegurança jurídica gerada pela inexplicável demora em julgar os incidentes constitucionais. Senhora Presidente Carmen Lúcia a obrigação do Presidente da maior Corte do País é ser guardião máximo da Constituição da República e não agir pautado na vontade popular.
Marcelo Gurjão Silveira Aith é especialista em Direito Público e Criminal.