A Prefeitura de Rio Verde está sendo acusada de utilizar recursos da receita do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) para custear gastos do time de futebol profissional do município, perseguir e beneficiar professores, adquirir internet que não foi instalada e pagar por viagens do transporte escolar por linhas inexistentes. Os problemas, que estariam nas contas de 2011 e 2012, estão demonstrados em fotos, depoimentos, certidões, declarações e relatórios e as investigações serão conduzidas pelo Tribunal de Contas dos Municípios (TCM/GO).
O Fundeb é um fundo especial formado por contribuições de governos municipais, estadual e federal, cujos recursos devem ser aplicados obrigatoriamente na educação básica e para complementar salários de professores. Em Rio Verde (235 quilômetros de Goiânia, no Sudoeste de GO) os números da receita do fundo são significativos e crescentes, saltando de R$ 35,8 milhões, em 2010, para R$ 57,1 milhões, em 2012. Estima-se que para este ano, a receita fique em R$ 60,5 milhões.
Essas e outras revelações estão listadas em documento entregue ao TCM/GO em março deste ano e consideradas procedentes por seu Pleno no último dia 6 de novembro. As acusações são da ex-presidente do Conselho de Acompanhamento e Controle Social do Fundeb em Rio Verde (Cacs do Fundeb/RV), que no biênio 2011/2013, era comandado pela professora Joelma Maria Ferreira, atualmente reeleita, como conselheira representante dos professores no fundo, para mandato 2013/2015.
A Secretaria de Educação de Rio Verde contesta as incriminações, alegando que a situação foi tratada de modo inábil por todas as partes envolvidas, mas que os devidos esclarecimentos estavam sendo disponibilizados ao TCM/GO, por meio da Procuradoria Geral do Município, ainda no início de 2014. Há quatro meses, a Educação de Rio Verde está sendo comandada pelo vereador licenciado e professor Lindomar Barros dos Santos, que sucedeu Levy Rei de França, também professor universitário.
A troca no comando, conforme explicações do prefeito Juraci Martins à época, teria considerado quesitos técnicos e não políticos, resultantes dos desgastes gerados pelo acirrado e continuo embate entre Educação e Cacs. Neste caso, o acumulo de cargos públicos (Levy Rei também é professor na UniRV) não foi aprovado pelo TCM/GO, que recomendou o afastamento.
Barros dos Santos se esquiva de discutir qualquer das denúncias constantes do processo 06979/2013, mas adianta que desde que assumiu tem realizado mudanças administrativas, com o objetivo de melhorar a comunicação. A professora Ferreira contesta a assertiva, revelando que desde julho o Cacs está acéfalo, depois que a presidente do conselho, eleita um mês antes, gestora Keysa Chrystina Gonçalves de Souza abdicou do cargo. Joelma Silveira garante que Keysa Chrystina era nome da prefeitura e não conseguiu apoio dos demais membros do Cacs para referendar e oficializar possíveis devoluções à conta bancária do Fundeb.
Problemas
Entre os problemas elencados pela professora em sua denúncia, uma das que mais chama a atenção está na folha de pagamento, onde se detectou que alguns professores rurais receberam o adicional de difícil acesso e outros não. A remuneração dos coordenadores e dos professores da zona rural que excedem a jornada de trabalho, também, não teria sido paga corretamente em 2011 e 2012. No relatório acolhido pelo TCM/GO consta que “a cada questionamento sobre indício de irregularidade, no mês seguinte o professor questionado era retirado da folha do Fundeb e passado para o FME (Fundo Municipal da Educação), como se no fundo fosse permitido irregularidades”.
Outra questão questionada é a compra de antenas para instalação de internet nas escolas municipais. De acordo com o documento, a empresa que forneceu as antenas recebeu pelos produtos em julho de 2011, todavia as antenas não haviam sido instaladas até março de 2013. O problema estaria afetando a dez escolas rurais.
Tanto o relatório de 2011, quanto o de 2012, apesar do curto prazo, foram produzidos pelo Cacs e enviados ao Executivo rio-verdense. Entretanto, eles não acompanharam as contas entregues ao TCM/GO e nem resultaram em explicações ao conselho. A professora denunciante, entretanto, relata que a prefeitura afirma ter devolvido cerca de R$ 450 mil, na virada do ano de 2011/2012, e outros R$ 200 mil, na noite de 2012/2013.
Falta de infraestrutura
O embate entre o conselho do Fundeb em Rio Verde vem de longa data. Há cerca de dois anos, em setembro de 2011, a promotora de Justiça daquele município, Renata Dantas de Morais e Macedo, enviou recomendação ao prefeito de Rio Verde, Juraci Martins de Oliveira, para que garantisse infraestrutura e condições materiais adequadas à execução plena das atividades periódicas do organismo.
Entretanto, seis meses depois da eleição do novo colegiado, a Prefeitura de Rio Verde ignorava a existência do conselho e suas necessidades administrativas. Com o apoio do Ministério Público, o Cacs, então, conseguiu que a prefeitura garantisse espaço físico, material de apoio e pessoal, cadeiras, computador com acesso à internet, impressora e telefone.
Este episódio acabou gerando a instauração de um inquérito civil, visando investigar possíveis manobras administrativas, por parte da Prefeitura de Rio Verde, para impedir o pleno funcionamento do conselho. À época a situação foi contornada. Oito meses mais tarde, o MP volta a carga, abrindo uma nova investigação, baseada nas notícias de crimes praticados contra o fundo.
Em meio a guerra de informações, o então titular da Secretaria da Educação, Levy do Rei, moveu uma ação civil de indenização contra a presidente do Cacs, professora Joelma Ferreira, alegando que “ela estava em uma cruzada para desmoralizá-lo e desestabilizar o sistema de educação no município, com o propósito de aferir bônus político”.
A professora confirma a ação, mas adianta que até a promotora Dantas se ofereceu como sua testemunha de defesa. Joelma Ferreira garante que a ação é apenas uma maneira de desviar o foco das irregularidades, levando uma discussão técnica para o campo político.
Utilidade do Conselho
O Conselho de Acompanhamento e Controle Social do Fundeb (CACS do Fundeb) é um colegiado que tem como função principal acompanhar e controlar a distribuição, a transferência e a aplicação dos recursos do fundo, no âmbito das esferas municipal, estadual e federal.
O conselho não é uma unidade administrativa do governo. Assim, sua ação deve ser independente e, ao mesmo tempo, harmônica com os órgãos da administração pública local. O Poder Executivo deve oferecer ao conselho o necessário apoio material e logístico.
A atividade dos conselhos do Fundeb soma-se ao trabalho das tradicionais instâncias de controle e fiscalização da gestão pública. Entretanto, o conselho do Fundeb não é uma nova instância de controle, mas sim de representação social, não devendo, portanto, ser confundido com o controle interno, que é executado pelo próprio Poder Executivo, nem com o controle externo, que está a cargo do Tribunal de Contas.
O controle exercido pelos conselhos do Fundeb representa a atuação da sociedade, que pode apontar falhas ou irregularidades eventualmente cometidas, para que as autoridades constituídas, no uso de suas prerrogativas legais, adotem as providências que cada caso venha a exigir.
Receita do Fundeb em Rio Verde
Ano |
Valor |
Percentual |
2010 |
35.880.286,90 |
27,54% |
2011 |
46.269.414,14 |
25,27% |
2012 |
57.133.838,64 |
25,82% |
2013 |
(*) 45.381.933,61 |
(*) Valor totalizado até setembro/2013