Um fato inusitado pode ser a causa para a demora da Prefeitura de Goiânia em chamar os 463 profissionais incluídos no processo de convocações de um concurso público realizado em 2012 pela administração municipal. O secretário interino de Gestão de Pessoas, Iram Saraiva Júnior, que deveria assinar o documento autorizando a convocação dos profissionais, também está na lista de candidatos aprovados no certame, gerando, portanto, um conflito de interesse e uma possível morosidade intencional do processo.

Na semana passada, alguns aprovados no concurso foram ao Ministério Público Estadual protocolar uma representação contra este último fato que estaria travando a convocação. O caso está nas mãos da promotora de Justiça Leila Maria de Oliveira, que em fevereiro instaurou inquérito civil público para investigar a demora na convocação e tem reunido no decorrer desse tempo novos fatos apresentados pelos aprovados no processo.

Iram, que ocupa também a chefia de gabinete do prefeito Paulo Garcia (PT), foi aprovado no ano passado em concurso público do Paço em cargo de nível médio (assistente administrativo), com salário de R$ 781,41. O secretário ficou em 20º lugar, com nota 80, no concurso que oferecia 102 vagas. O certame destinaria 1.389 vagas nos diversos órgãos da administração direta e indireta da prefeitura. A maior parte dos cargos é voltada para a área da saúde.

Antes de Iram assumir interinamente a secretaria, no início de julho, as convocações do concurso ocorriam dentro do prazo previsto pelo órgão. A última chamada para a área da saúde ocorreu em junho, período em que o vereador Rogério Cruz (PRB) ainda ocupava a Secretaria de Gestão de Pessoas. Em agosto, o órgão convocou mais aprovados, mas, desta vez, apenas para analista em obras e urbanismo.carlos

Porém, o processo que prevê a convocação de 463 aprovados está parado há 80 dias na secretaria, aguardando apenas a assinatura de Iram. Neste mesmo documento está prevista a convocação do secretário e de mais 22 assistentes administrativos. Profissionais que ligaram no Departamento de Concursos e Seleção do órgão tiveram informações de próprios funcionários que o fato de Iram ser secretário e sair beneficiado com a convocação, seria o principal impedimento para a agilização do processo. “O serviço de saúde de Goiânia está sobrecarregado, faltam médicos nos Cais, as filas continuam imensas e demoradas e ninguém é chamado para exercer sua função por conta desse empecilho”, conta uma aprovada no concurso que não quis que seu nome fosse divulgado pela reportagem.

A Secretaria Municipal de Saúde estima que faltam em Goiânia aproximadamente 750 médicos. Se a administração municipal convocasse os aprovados que constam nesse processo, 186 médicos já poderiam ajudar a desafogar a grande demanda na capital.

A reportagem entrou em contato com o departamento responsável por concursos e seleção. Uma das funcionárias disse que a convocação depende apenas do secretário, mas que a prefeitura não tem obrigação de chamar neste momento os aprovados, uma vez que o certame tem validade até julho do ano que vem, sendo possível prorrogá-lo por mais dois anos.

Quando questionada se o empecilho seria porque Iram ocupa a secretaria e também está na lista de convocados, a funcionária afirma que “não tem conhecimento dessa informação”.

Conflito de interesse

O procurador geral do Município, Carlos de Freitas, afirmou que, em tese, haveria sim conflito de interesse pelo fato de Iram ocupar a secretaria e ser um dos convocados na lista prevista pelo cronograma. “Em tese haveria conflito de interesse. Como é que ele assina um concurso em que ele é aprovado?”.

No entanto, para Carlos, se este for o problema, ele poderia ser resolvido de forma rápida, já que Iram ocupa o cargo interinamente e pode deixar a secretaria a qualquer momento. “Ele não deve permanecer por muito tempo, porque interinidade não remete a um período muito longo. Ele está atendendo a uma necessidade da prefeitura, de ajustamento de secretários”. O problema é que Iram ocupa a secretaria há mais de 90 dias e não há nenhum previsão do Paço de colocar outro aliado na pasta nos próximos dias.

iramO procurador acredita que a morosidade na convocação tem esbarrado principalmente no limite prudencial com gastos com a folha de pagamento. “Se chamar mais pessoas a prefeitura fere a Lei de Responsabilidade Fiscal e o prefeito pode responder por improbidade administrativa. Tem que esperar passar esse semestre e convocar os aprovados no início do ano”.

Carlos garante que não há resistência da prefeitura em convocar os aprovados, principalmente se tratando de médicos. “É uma área carente e a gente convoca e a maioria não se apresenta porque já passou em outro concurso ou está em outra atividade. É muito difícil conseguir a manutenção destes profissionais nos quadros da prefeitura durante muito tempo. Mas não há como chamá-los no último quadrimestre do ano”.

A reportagem tentou entrar em contato com Iram de três maneiras: por celular, na chefia de gabinete e na Secretaria de Gestão de Pessoas. Ele não retornou às ligações até o fechamento desta matéria.