Entre 1986 e 2021, o Brasil viu de 11% a 25% de toda sua vegetação nativa ser afetada pela degradação. Esses dados são da plataforma MapBiomas, que avaliou a degradação em todos os biomas brasileiros pela primeira vez. A área degradada pode variar entre 60,3 milhões e 135 milhões de hectares.

A versão beta da plataforma de vetores de degradação do MapBiomas permite a geração de cenários sobre o impacto de diversos fatores que causam a degradação da vegetação em todo o território brasileiro.

“Essa é a primeira vez que a degradação pode ser avaliada de forma mais ampla e em todos os biomas brasileiros, mas sabemos que esse processo de degradação ocorre em outros tipos de cobertura, como na agricultura e pastagem, além dos solos e na água, onde pretendemos avançar também com essas informações no MapBiomas nos próximos anos”, destaca Tasso Azevedo, coordenador geral do MapBiomas.

Este levantamento foca exclusivamente na vegetação nativa, que cobre 64% do Brasil, excluindo áreas antropizadas, como lavouras e pastagens, além de áreas de voçorocas, desertificação e expansão de areais. Os vetores de degradação considerados incluem: Tamanho e isolamento dos fragmentos de vegetação nativa; Áreas de borda; Frequência do fogo e tempo desde a última queimada; e Idade da vegetação secundária.

Outros vetores, como a invasão de espécies exóticas, corte seletivo de madeira, sobrepastejo e pisoteio excessivo por rebanhos, ainda não foram incluídos devido a limitações metodológicas.

Áreas de borda

As áreas de borda são pontos de contato entre vegetação nativa e usos antrópicos, sendo suscetíveis a efeitos negativos como ventos, radiação solar e agrotóxicos, além de maiores taxas de predação e risco de incêndios. O tamanho dos fragmentos influencia diretamente a quantidade e diversidade da fauna e flora presente.

Fonte: MapBiomas

“Quanto menor o fragmento, maior o risco de extinções locais de espécies, menor a probabilidade de recolonização por indivíduos vindos de outros fragmentos e maior é a proporção dos efeitos de borda. Esse problema é ainda mais grave se o fragmento pequeno de vegetação nativa estiver mais distante de fragmentos grandes. O isolamento compromete o fluxo gênico, impedindo a chegada de novas espécies ou a reposição daquelas que se extinguiram localmente”, explica Marcos Rosa, coordenador técnico do MapBiomas.

Fonte: MapBiomas

Efeito do fogo

O fogo pode ou não ser um fator de degradação, dependendo do tipo de vegetação. Enquanto campos e savanas têm uma história evolutiva de convivência com o fogo, ecossistemas florestais são mais vulneráveis a incêndios, resultando em perda de biodiversidade e degradação do solo.

A vegetação secundária, em processo de regeneração após desmatamento, apresenta funcionalidades climáticas, de solo e de água distintas da vegetação primária. Com o tempo, sua estrutura e funcionalidade tendem a melhorar devido ao aumento da diversidade e composição de espécies.

Fonte: MapBiomas

“A degradação é um processo que, se revertido, permite a recuperação da área. Mas se não for interrompido, pode levar a um colapso, ou seja, o ponto a partir do qual não é mais possível recuperar as características originais”, destaca Ane Alencar, diretora de ciência do IPAM e coordenadora do MapBiomas Fogo.

Fonte: MapBiomas

“O panorama revelado na plataforma sobre os possíveis cenários de degradação da vegetação nativa mostra que, além da preocupação com a redução do desmatamento, também é importante cuidar das condições atuais dos remanescentes que ainda existem nos diferentes biomas brasileiros, bem como restaurar as áreas degradadas”, finaliza Julia Shimbo, pesquisadora do IPAM e coordenadora científica do MapBiomas.

Detalhamento por Biomas

Mata Atlântica: A degradação varia entre 36% e 73% da área de vegetação nativa restante, totalizando de 12 milhões a 24 milhões de hectares. “A alta fragmentação dos remanescentes florestais na Mata Atlântica é um fator importante na construção desses valores. A combinação de vetores como área de borda, tamanho dos fragmentos e isolamento dos remanescentes mostra que grande parte do bioma está vulnerável às pressões antrópicas, que podem levar tanto à degradação como até ao colapso de áreas importantes para a conservação do bioma”, alerta Natalia Crusco, da equipe da Mata Atlântica do MapBiomas.

Cerrado: A degradação vai de 18,3 milhões a 43 milhões de hectares, correspondendo a 19,2% a 45,3% da vegetação nativa remanescente. “O Cerrado é um bioma com forte presença da agropecuária, já bastante fragmentado, de modo que as áreas de borda são importantes vetores na disseminação de espécies exóticas invasoras, como por exemplo gramíneas africanas. Essas gramíneas são uma das principais ameaças para o bioma, pois além de diminuírem a biodiversidade, aumentam significativamente a biomassa disponível e favorecem a ocorrência de queimadas mais frequentes e intensas do que aquelas que o bioma está adaptado”, explica Dhemerson Conciani, pesquisador do IPAM que faz parte da equipe do Cerrado do MapBiomas.

Pantanal: A área degradada pode variar de 800 mil a 2,1 milhões de hectares, afetando até 9% das formações florestais sensíveis ao fogo. “A remoção de vegetação nativa para a expansão agrícola e pecuária desprotege o solo e interfere na distribuição de água e sedimentos. A quantidade e a qualidade de água que chega na planície dependem, ainda, de barragens e hidrelétricas que alteram os fluxos naturais da água”, detalha. “Questões climáticas relativas à precipitação e temperatura regulam as secas e inundações. O aumento de períodos de estiagem tem dificultado a resiliência do ecossistema pantaneiro”, acrescenta.

Pampa: Pode ter de 1,7 milhão a 4,8 milhões de hectares de vegetação degradada, representando até 55% da vegetação nativa restante. “O Pampa é um bioma que sofre forte efeito antrópico, com uma ocupação bastante densa e antiga. O fato de os usos antrópicos estarem distribuídos de modo relativamente homogêneo na paisagem amplia muito a exposição aos efeitos de borda. Além disso, pelo menos um quarto da vegetação campestre, típica do bioma, é secundária, estando em diferentes estágios de recuperação. O panorama do Pampa em termos de degradação é bastante crítico, especialmente porque ainda não foram avaliados vetores notadamente importantes, como a invasão por gramíneas africanas e o sobre pastejo por excesso de carga animal”, comenta Eduardo Vélez, da equipe do Pampa MapBiomas.

Caatinga: Estima-se que de 9 milhões a 26,7 milhões de hectares podem estar degradados, com aumento na fragmentação nos últimos 37 anos. “Na Caatinga esses vetores de degradação associados a mudanças de uso da terra e às condições climáticas áridas e semiáridas podem contribuir para aumentar os limites das áreas suscetíveis à desertificação, onde são exauridas as condições naturais, causando a deterioração do solo, chegando ao colapso”, ressalta Deorgia Souza, da equipe Caatinga do MapBiomas. “O mapeamento do solo exposto na Caatinga é um dos indicadores do processo de desertificação e que pretendemos incluir na próxima versão da plataforma”, complementa.

Amazônia: Percentuais de degradação variam de 5,4% a 9,8%, com extensão total entre 19 milhões e 34 milhões de hectares. “Outros vetores como extração madeireira, abertura de estradas e estresse hídrico por mudança climática também são importantes para entender o processo de degradação da floresta amazônica”, aponta Carlos Souza Jr., da equipe da Amazônia do MapBiomas. “Estes são indicativos adicionais de que a área degradada no Brasil pode ser maior do que foi possível identificar com esta plataforma”, completa.

*Este conteúdo está alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), na Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU). ODS 13 – Ação Global Contra a Mudança Climática

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