Junior Kamenach
Junior Kamenach
Jornalista, repórter do Sagres Online e apaixonado por futebol e esportes americanos - NFL, MLB e NBA

Aumento de acidentes aéreos levanta debate sobre segurança na aviação

Nos últimos anos, a aviação comercial e privada tem sido palco de uma estatística preocupante. Em 2024, o número de mortes em acidentes aéreos aumentou 92% em relação ao ano anterior, tornando-se o pior ano da última década para o setor.

Do mesmo modo, em 2025, até o momento, já foram registradas 19 ocorrências envolvendo voos comerciais e privados. Mas afinal, o que está por trás desse cenário? O setor aéreo está de fato mais perigoso ou a percepção de risco cresceu?

O professor Salmen Bukzem, coordenador do curso de Ciências Aeronáuticas da PUC Goiás, afirma ao Pauta 2 do Sistema Sagres que, apesar dos números absolutos chamarem atenção, a proporção de acidentes aéreos em relação ao aumento da frota não demonstra uma escalada descontrolada de incidentes.

“O setor aéreo ainda é o modal mais seguro de transporte. O que acontece é que, hoje, com a globalização da informação, qualquer acidente ganha grande repercussão. Isso pode causar a impressão de que os números cresceram de forma alarmante”, explica.

Fatores

Ainda assim, especialistas apontam que alguns fatores podem estar contribuindo para o aumento dos acidentes aéreos. Entre eles, estão falhas mecânicas, erro humano e infraestrutura aeroportuária deficitária. “Precisamos olhar para três pilares essenciais: o estado da frota aérea e sua manutenção, a formação dos profissionais e o sistema de controle do espaço aéreo. Cada um desses fatores influencia diretamente a segurança das operações”, acrescenta Bukzem.

Os acidentes aéreos mais frequentes nos últimos anos estão concentrados na aviação de pequeno porte e na aviação privada. Em 2024, 24 ocorrências envolveram aeronaves executivas ou particulares, um dado que chama atenção para os desafios específicos desse setor.

“O Brasil tem uma das maiores frotas de aviação executiva do mundo, com cerca de 10 mil aeronaves. Destas, aproximadamente 4.500 são monomotores a pistão, e é nesse segmento que observamos a maior incidência de acidentes”, pontua Bukzen.

De acordo com ele, a principal diferença entre a aviação comercial e a privada está na fiscalização. “Empresas aéreas seguem normas rígidas e passam por auditorias frequentes. Já na aviação privada, a responsabilidade sobre a manutenção e a operação das aeronaves fica inteiramente a cargo do proprietário ou piloto, o que pode levar a falhas”, explica.

A importância da formação profissional

Tanto pilotos quanto controladores de tráfego aéreo desempenham papéis fundamentais na segurança dos voos. A formação desses profissionais segue um rigoroso processo de certificação.

No caso dos pilotos, a jornada começa com a obtenção da licença de piloto privado, seguida pela formação para voo por instrumentos, até a certificação como piloto comercial. Sendo assim, para se tornar comandante de linha aérea, um profissional precisa acumular pelo menos 1.500 horas de voo e passar por novos exames teóricos e práticos.

O controlador de tráfego aéreo Maurício Menezes, que atua na Torre de Controle do Aeroporto Internacional de Goiânia há 26 anos, destaca a complexidade da função. “Nosso trabalho exige atenção máxima. Lidamos com sistemas modernos, que incluem radares e softwares de controle, mas, no fim das contas, a segurança depende da precisão das nossas decisões. Cada aeronave que pousa e decola com segurança é uma missão cumprida”, relata.

A formação dos controladores também é exigente e segue padrões internacionais. “Eles precisam dominar meteorologia, teoria de voo, regulamentos de tráfego aéreo e, acima de tudo, desenvolver habilidades para lidar com situações de alto estresse”, explica Bukzem.

Aspectos legais

Para entender melhor os aspectos legais que envolvem a aviação no Brasil, conversamos também com Georges Ferreira, advogado especialista em direito aeronáutico.

Durante a entrevista, Georges destacou a robustez da legislação brasileira, apontando que o Brasil segue padrões internacionais rigorosos em termos de segurança aérea. “O Brasil não perde em nada para praticamente nenhum país do mundo. Nossa legislação é uma das mais rigorosas e alinhadas com a Organização de Aviação Civil Internacional (OACI)”, afirmou.

Ele ainda complementou que, em termos de controle de tráfego aéreo, o Brasil frequentemente alcança excelência, recebendo notas quase perfeitas nas avaliações internacionais.

“Voo Simples”

A legislação brasileira, sempre em processo de atualização, recebeu uma grande reformulação com a implementação do programa Voo Simples, do Governo Federal, que começou a ser implementado entre 2020 e 2021.

Além disso, a revisão do Código Brasileiro de Aeronáutica, atualmente em tramitação no Senado, visa modernizar ainda mais as normas do setor.

“É uma legislação que visa padronizar as normas de segurança. E quando falamos de segurança na aviação, estamos falando de um padrão global”, explicou Georges, ressaltando que a segurança vai além da manutenção das aeronaves. Para ele, a qualidade dos profissionais e das peças utilizadas é um diferencial da aviação brasileira.

Importância da fiscalização

Apesar de o Brasil ter uma das legislações mais avançadas, Georges não deixou de abordar os desafios enfrentados pelo setor. De acordo com ele, o aumento de acidentes com aeronaves de pequeno porte nos últimos anos, especialmente na aviação particular, demanda atenção.

“A fiscalização é importante, mas ela deve ser compreensiva e não apenas punitiva”, comentou, enfatizando a necessidade de equilibrar a segurança com a viabilidade econômica das operações aéreas.

Ele ainda alertou sobre o impacto da alta do dólar no custo das peças de reposição. “As peças utilizadas nas aeronaves são praticamente todas importadas, e com a alta do dólar, esse custo se torna um desafio para a manutenção das aeronaves”, explicou.

O papel dos órgãos

Em relação aos acidentes aéreos, Georges lembrou que o Brasil possui um sistema de investigação de classe mundial, com o Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (CENIPA) sendo referência internacional.

A investigação de incidentes, como o ocorrido recentemente no Aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro, onde uma viatura entrou na pista de pouso, é conduzida de forma detalhada, para que todas as causas sejam apuradas. “A segurança na aviação é um sistema. Qualquer falha, seja no solo ou no ar, afeta todo o processo”, disse Georges.

Quando um incidente ocorre, o Ceripa realiza uma investigação sigilosa, reunindo todos os dados necessários para identificar falhas, como quem autorizou a entrada da viatura na pista e se houve falhas de comunicação entre os responsáveis.

Em Goiânia

Outro ponto importante abordado por Georges foi a questão da manutenção das aeronaves. Goiânia, com sua tradicional expertise na aviação, é um polo estratégico de manutenção no Brasil.

“Goiânia é o segundo maior polo de manutenção de aeronaves do país, recebendo aviões de todo o Centro-Oeste, Norte e Nordeste para manutenção”, afirmou, destacando a importância dessa infraestrutura para o setor.

Por fim, Georges falou sobre a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), que tem a missão de regular e fiscalizar o setor aéreo brasileiro. Ele ressaltou que, apesar de o órgão ter autonomia e ser fiscalizado por diversas entidades internacionais, existe uma carência de pessoal, o que limita a atuação em algumas áreas.

“A Anac precisa de mais fiscais, mais técnicos especializados. A carência de pessoal é uma realidade, e isso impacta a fiscalização”, explicou. Ele também apontou a necessidade de um novo “choque regulatório” para melhorar a competitividade do mercado e evitar um possível duopólio entre as grandes empresas aéreas.

*Este conteúdo está alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), na Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU). ODS 09 – Indústria, Inovação e Infraestrutura

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