Etimologicamente a palavra autismo, tem origem grega e significa “em si mesmo”. Em 1908, o psiquiatra suíço Paul Eugen Bleuler, ao abordar os sintomas da esquizofrenia infantil, foi o primeiro a utilizar o termo “autismo” para descrever a condição de pacientes que apresentavam um profundo quadro de recolhimento a um mundo interior. Dessa forma, o autismo passou a ser definido como uma condição em que o indivíduo tem dificuldades consideráveis no convício social, pois, estaria imerso em seu universo interior.

Contudo, os estudos sobre o autismo só começaram efetivamente a partir dos trabalhos do médico austríaco Leo Kanner. Em 1943 ele publicou, na revista Nervous Children, o artigo sob o título “Distúrbios Autísticos do Contato Afetivo” (Autistic disturbances of affective contact), no qual descreveu os casos de onze crianças que tinham em comum um comportamento de extremo isolamento e atos repetitivos.

Assim, os sintomas básicos do autismo começaram a ser delineados: indivíduos acometidos por um distúrbio do contato afetivo, isentos de linguagem, incapazes de efetuar trocas socioafetivas, imersos e reclusos em seus próprios mundos interiores.

Entretanto, em 1946, Kanner observou, a partir de sua prática clínica com pacientes considerados autistas, que alguns apresentavam bom desenvolvimento da fala, excelente memória, bem como uma admirável capacidade de reproduzir com precisão sequências e esquemas complexos, o que sem dúvida demonstrava o desenvolvimento de uma boa inteligência.

O fato é que como o Transtorno do Espectro Autista é um “guarda-chuvas” muito amplo e cujos estudos estão em constante evolução, observa-se que, apesar de comportamentos comuns, cada indivíduo inserido no espectro têm suas peculiaridades.

Infelizmente, na busca por explicar as causas do autismo, muitas conclusões equivocadas foram difundidas. O próprio Leo Kanner cunhou, em 1949, o termo mãe-geladeira referindo-se às mães de crianças autistas. Segundo essa hipótese, as causas do autismo estariam relacionadas à falta de atenção e afetividade das mães para com seus filhos. O psicólogo Bruno Bettleheim, também austríaco, reforçou essa hipótese. Porém, à medida que as pesquisas avançaram, demonstrou-se a inconsistência da teoria da mãe-geladeira.

Outra contribuição importante para os estudos do TEA foi a do pediatra austríaco Hans Asperger, apesar de sua vinculação ao regime nazista. Em 1944, ele publicou um artigo científico sob o título de “A psicopatia autista na infância” (Die “Autistischen Psychopathen” im Kindesalter) no qual, após observar mais de 400 casos, identificou o transtorno, principalmente em meninos, nos quais havia falta de empatia, baixa capacidade de formar amizades, conversação unilateral, intenso foco em um assunto de interesse especial e movimentos descoordenados.

Bem, nas décadas que se seguem a esses controversos pioneiros, vários novos estudos têm sido publicados, terapias têm sido desenvolvidas, mas ainda não é possível determinar quais são as causas que provocariam esse transtorno. Há várias hipóteses que envolvem desde aspectos ambientais até a herança genética.

Entretanto, apesar de não haver cura para o autismo, há algumas possibilidades de tratamento, que dependendo do caso, da intensidade e da regularidade com que serão efetuados, podem apresentar resultados.

Por vezes pode haver a necessidade de medicamentos que podem controlar a agressividade, impulsividade, desatenção, dificuldade para lidar com a frustração, ansiedade, depressão e alterações do sono.

Porém, a base dos tratamentos têm sido a atuação de uma equipe multidisciplinar composta por médicos, psicólogos, fonoaudiólogos e terapeutas ocupacionais. Contudo, o grande problema é o alto custo desses tratamentos e a carência de profissionais habilitados.

Nas últimas décadas, o número crescente de crianças diagnosticadas tem exigido uma política pública de inclusão. Nesse sentido cabe destacar a ação da ONU, que em 2007 estabeleceu o dia 02 de abril como o “Dia Mundial de Conscientização do Autismo”, tendo como tema, para 2023, “Transformando a narrativa: Contribuições em casa, no trabalho, nas artes e na formulação de políticas”.

(Foto: Revista Autismo/Reprodução tismoo.us)

No Brasil, destaco primeiramente a importância da Lei Berenice Piana (Lei nº 12.764/2012) de 2012, que instituiu os direitos dos autistas e suas famílias nas variadas esferas sociais, ou seja, as pessoas diagnosticadas com TEA têm assegurados em consonância com os direitos de portadores de outras deficiências, para todos os efeitos legais. Além disso, garante o direito à educação com atendimento especializado garantido pelo Estado.

Posteriormente, em 2020, foi sancionada a lei que leva o nome do filho do apresentador Marcos Mion, a Lei Romeo Mion (Lei 13.977), que criou a Carteira de Identificação da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (Ciptea).

Para aqueles que convivem com as formas mais variadas do TEA, é importante ressaltar que o melhor remédio, o melhor tratamento, é o amor e a paciência de quem cuida (pais, parentes, tutores, terapeutas, professores e assistentes). Apesar de em muitos casos o autista parecer distante, isolado em seu mundo, eles têm grande sensibilidade. Mesmo quando não usam palavras, conseguem comunicar seus sentimentos, basta que tenhamos sensibilidade e boa vontade em entendê-los.

Foto: Arquivo Pessoal

Sei que para muitos pais e responsáveis a jornada é muito dura. Justamente por isso, é preciso que a família una forças e se possível faça um acompanhamento especializado. Nesses doze anos em que acompanho meu filho mais novo, que é portador do espectro, tive que rever minhas perspectivas sobre a vida e seu sentido, sobre o que realmente importa e o que são as verdadeiras prioridades.

*Norberto Salomão é advogado, historiador, professor de história, analista de Geopolítica e Política Internacional, Mestre em Ciências da Religião e especialista em Mídia e Educação.

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