Pesquisadores brasileiros demonstraram que corpos d’água conseguem manter ecossistemas em áreas de manejo sustentável, se em seus arredores as espécies animais forem substituídas por espécies tolerantes àquelas práticas agrícolas. O estudo “A reorganização da comunidade estabiliza os ecossistemas de água doce em campos agrícolas de manejo intensivo” está publicado no Journal of Applied Ecology, revista científica de ecologia. Então, ele sugere que é possível substituir espécies para estabilizar os ecossistemas em áreas agrícolas.

O trabalho é inovador. Os pesquisadores testaram as consequências do uso intenso da terra, comparando com as pastagens intensas e plantações de cana-de-açúcar. O corpo d’água simulado contou com lagoas e poças de 4 mil litros.

A pesquisa mostrou que a biomassa ficou estável em todos os cenários. O predador extinto foi a libélula. No entanto, a sua extinção foi compensada pela colonização de besouros e percevejos. O resultado apresentou uma compensação na biodiversidade, com a extinção de uma espécie compensada por outras. O biólogo Luis Cesar Schiesari, autor correspondente do artigo, destacou que o trabalho mostra o valor existente na biodiversidade de um local.

“Demonstramos experimentalmente que o funcionamento de ecossistemas aquáticos em ambientes agrícolas pode ser mantido, apesar de práticas danosas, desde que haja espécies tolerantes vindas de fora da plantação para substituir as mais sensíveis. Na pesquisa, usamos como indicador do funcionamento ecossistêmico a produção de biomassa, ou seja, quantos gramas de animais estão sendo observados em cada ecossistema ao longo do tempo”, afirmou.

Sustentabilidade

A importância do estudo está ligada ao desenvolvimento sustentável nas áreas agrícolas e a manutenção dos ecossistemas. O resultado mostrou que a proteção de lagoas, pântanos e brejos, próximos aos campos agrícolas contribuem para o combate aos predadores, por exemplo.

“Esses organismos são benéficos para o próprio cultivo. Insetos e anfíbios colocam ovos nessas poças temporárias, que eclodem em larvas. Elas se alimentam no ambiente aquático e, depois, metamorfoseiam em adultos terrestres. Esses adultos eventualmente morrem no ambiente terrestre, ‘exportando’ a matéria acumulada dentro da poça, inclusive o nitrogênio, o fósforo e o potássio, de volta para a plantação. Essas funções ecossistêmicas satisfazem as premissas da agricultura sustentável e de precisão”, disse.

Schiesari pesquisa como as alterações que o ser humano faz no ambiente impactam a biodiversidade. O foco do professor são as conversões de áreas nativas pelas intensas pastagens e plantios agrícolas nos últimos 15 anos. Segundo o MapBiomas, a atividade de pastagem está presente nos seis biomas do país e é o principal uso do solo brasileiro com 154 milhões de hectares ocupados.

Estudo

O experimento ocorreu numa fazenda experimental da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA), em Brotas, no interior de São Paulo. Dividiu-se o local em 15 parcelas, com cinco mantidas com pastagem extensiva que cresce naturalmente e outras cinco convertidas em pastagem intensiva fertilizadas. As outras cinco parcelas converteram-se em cultivo de cana-de-açúcar, com tecnologias e insumos para intensificar os resultados.

Os pesquisadores utilizaram simulação de poças temporárias com 4 mil litros de água cada uma. Após a montagem da estrutura houve o monitoramento da biodiversidade que colonizou o local de forma espontânea. Os cientistas vão fazer novos estudos, pois o atual ocorreu num modelo inerentemente transitório, ou seja, com corpos d’água artificiais. 

“Estudos futuros devem testar no longo prazo as consequências do uso da terra, explorando efeitos do contexto da paisagem e, portanto, isolamento espacial e limitação de dispersão, na capacidade das comunidades de lagoas para manter a produção de biomassa estável, apesar de práticas de manejo de terras perigosas”, pontuaram.

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