O Ministério Público de São Paulo abriu inquérito para investigar a decisão do governo do estado de dispensar livros didáticos nas escolas públicas para usar apenas material digital. A promotoria dá 10 dias para a Secretaria da Educação mostrar as “justificativas pedagógicas e financeiras” para recusar as obras do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), em que o Ministério da Educação (MEC) compra exemplares para todas as escolas do país.

O secretário da Educação paulista, Renato Feder, resolveu abrir mão de 10 milhões de exemplares para os alunos do ensino fundamental 2 (6º ao 9º ano) em 2024. E anunciou que não vai mais comprar livros para o ensino médio também. A estratégia do governo de São Paulo atualmente é a de aulas organizadas em Power Point, com cerca de 20 slides, que são passados pelo professor em sala de aula.

“A aula é uma grande TV, que passa os slides em Power Point, alunos com papel e caneta, anotando e fazendo exercícios. O livro tradicional, ele sai”, disse Feder ao Estadão. “Não é um livro didático digital. É um material mais assertivo, com figuras, jogos, imagens 3D, exercícios. Ele pode clicar em links, abrir vídeos, navegar por um museu”, completou. Feder também justificou a decisão por considerar os livros do PNLD “superficiais”.

Apuração

Segundo o MP, há necessidade “de apurar se os novos materiais didáticos a serem adotados equivalem aos do PNLD em termos de qualidade, processos de análise qualitativa de produção, escolha, avaliação e preço unitário”. A promotoria pede que o governo informe também quem são os profissionais responsáveis por elaborar e avaliar o material digital.

A promotora Fernanda Peixoto Cassiano também diz que a “adoção de material didático exclusivamente digital dificulta o acesso de alunos sem suporte de equipamentos tecnológicos” nas escolas e em casa, o que coloca em risco a obrigação constitucional e legal do estado de fornecer material didático. E que a decisão pode “configurar tratamento desigual entre os estudantes”.

O MP ainda pede que a secretaria informe se houve consulta aos “órgãos de gestão democrática do sistema”, como o Conselho Estadual de Educação (CEE), conselhos de escola, grêmios estudantis e aos profissionais da educação antes se tomar a decisão.

Após a repercussão na imprensa da decisão, Feder esteve em reunião no CEE e chegou a ser questionado sobre a recusa dos livros didáticos, mas não deu declarações porque avisou que precisaria sair para uma reunião com o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos).

Escolas

Segundo o Estadão apurou, as escolas estavam sendo consultadas pelo estado até a semana passada sobre o processo de escolha de livro no PNLD. Foi perguntado se preferiam uma opção única de livro para toda a rede ou obras escolhidas para cada escola. Professores e editoras foram surpreendidos com a decisão do secretário de recusar as obras na sexta-feira passada.

O catálogo do PNLD 2024 tem obras de todas as disciplinas do ensino fundamental 2. Há opções de coleções de várias editoras para que as escolas ou redes de ensino escolham as que pretendem usar.

Antes disso, as editoras precisam submeter seus livros a uma equipe de especialistas, que pode aprovar ou não as obras, conforme exigências dos editais. Erros conceituais, desatualização e preconceito são motivos de exclusão imediata.

Os livros oferecidos no PNLD são os mesmos vendidos no mercado privado, com pequenas adaptações de formato exigidos nos editais públicos. Como mostrou o Estadão, muitos dos livros didáticos rejeitados pelo governo de São Paulo para a rede estadual são usados por escolas particulares de ponta na capital, como Bandeirantes, Miguel de Cervantes, Porto Seguro, Gracinha e Oswald de Andrade.

Representação

A representação ao MP foi feita pelo deputado estadual Carlos Giannazi (PSOL). A promotoria diz ainda que deve ser considerado o relatório anual da Unesco (braço das Nações Unidas para a educação), divulgado semana passada, recomenda o uso da tecnologia como complementação a outras estratégias na sala de aula, e não como substituição. O documento cita pesquisas que indicam efeitos negativos na aprendizagem quando estudantes têm uso considerado intensivo de tecnologias na educação. O MP cita também as recomendações da Sociedade Brasileira de Pediatria, que sugere limitação do uso de telas para crianças.

*Este conteúdo está alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), na Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU). ODS 04 – Educação de Qualidade.

*Com informações da Agência Estado

Leia mais

Edição do Encceja 2023 recebe mais de 1 milhão de inscritos

Centro-Oeste sedia primeiro encontro do ciclo de seminários do MEC sobre escola em tempo integral

Lula sinaliza que próxima indicação ao STF será de uma mulher, após Zanin