Norberto Salomão
Norberto Salomão
Norberto Salomão é Advogado, Historiador, Professor de História, Analista de Geopolítica e Política Internacional, Mestre em Ciências da Religião e Especialista em Mídia e Educação.

Israel: as raízes da discórdia com os árabes

Israelenses e árabes têm origem semita. O termo “semita” ou “semítico” deriva de Sem ou Shem, um dos três filhos de Noé. Pela narrativa do Antigo Testamento, no livro de Gênesis, em seu capítulo 10, verso 30, de Sem teria derivado uma vasta descendência que teria habitado a região que compreenderia o Oriente Médio e o Norte da África.

Imagem (Blog/eberlenzcesar)

Assim, semita ou semítico passou a designar povos que partilham uma mesma matriz genética e um tronco linguístico, originados em sua maioria no Oriente Médio, destacando-se o acádio, o amárico, o árabe, o aramaico, o assírio, o hebraico, o tigrínia.

Contemporaneamente, os grupos semitas remanescentes se destacam são os judeus e os árabes, que a partir do século XX tem se envolvido em constantes disputas e conflitos.

Para tentarmos compreender a origem e diferença entre judeus e árabes, temos que recorrer a narrativa religiosa que remonta a época de Abraão.

Segundo a tradição bíblica, Abraão e sua esposa Sara não conseguiam conceber um filho. Então, Sara sugeriu que Abraão mantivesse relações com a serva, de origem egípcia, chamada Agar. Dessa relação nasceu Ismael. Consta no Antigo Testamento que quando Sara estava com 90 anos de idade conseguiu conceber o filho Isaac.

Quando Isaac nasceu, Ismael estava com 13 anos de idade. O nascimento do filho de Sara gerou um conflito inevitável. Assim, Abraão determinou que Agar e Ismael se separassem do grupo. Posteriormente, Ismael teria dado origem a 12 filhos e daí a uma imensa descendência que teria originado os povos árabes.

Mapa do mundo do Antigo Testamento (Imagem: portal/ministeriopirituba)

Já o filho de Sara, Isaac, deu origem a Esaú e Jacob. Jacob, por sua vez, concebeu 12 filhos que deram origem as 12 tribos que formaram o povo de Israel.

A formação e a decadência de reinos hebreus na Antiguidade

 Entre 1.600 e 1.200 a.C. os hebreus foram cativos no Egito. A libertação desse povo é atribuída a Moisés, no movimento denominado Êxodo. Depois de anos peregrinando pela Península do Sinai, os hebreus retornaram para Canaã e passaram a disputar o domínio sobre a região com outros povos.

Depois que passaram a dominar parte considerável de Canaã, os hebreus transitaram da organização tribal para uma estrutura de Estado, constituindo uma monarquia, da qual Salomão foi o principal rei.

Após a morte de Salomão, por volta de 930 a.C., os hebreus entraram em conflitos internos e se dividiram em dois reinos. Ao Norte, 10 tribos deram origem ao Reino de Israel, tendo como capital a cidade de Samaria. Ao Sul, 2 tribos constituíram o Reino de Judá, tendo como capital Jerusalém.

Reino de Israel e Reino de Judá (Foto: wikipedia.org)

Divididos, os hebreus foram alvo de uma sequência de domínios na Antiguidade: Assírios, Caldeus, Persas, Greco-macedônicos e Romanos.

Durante o domínio dos Caldeus (novos babilônios) o rei Nabucodonosor realizou a primeira destruição do Templo de Salomão e levou os judeus com cativos para a babilônia, marcando o chamado “Cativeiro Babilônico dos Hebreus”.

Mas, foi durante o domínio romano que os judeus passaram a ser violentamente perseguidos. Em 70 d.C. os romanos realizaram a segunda destruição do Templo de Salomão ou Templo de Jerusalém, do qual o que resta hoje é o “Muro das Lamentações”. Sem condições de reagir com eficácia ao domínio e opressão dos romanos, os judeus iniciaram um processo de dispersão pelo mundo, com a promessa, feita ao pé do Monte Sião, de que um dia retornariam à terra que consideram sagrada. Esse movimento de dispersão foi denominado como a “Diáspora dos Hebreus ou Judeus” e durou cerca de 2.000 anos.

Diáspora dos Hebreus (Imagem: esefarad.com)

Os árabes e as origens da civilização islâmica

Aproximadamente entre 2.000 a.C. e 622 d.C., os árabes organizaram-se de forma tribal, ou seja, não desenvolveram nenhuma estrutura de Estado. Estimasse que havia 360 tribos, divididos em árabes urbanos e árabes do deserto, os beduínos.

Arábia pré-islâmica (Foto: wikipedia.org)

A religião era politeísta, com cerca de 360 divindades. Acreditavam que um fragmento de meteoro, que caiu na cidade de Meca, teria sido enviado pelos deuses e passaram a cultuá-lo, trata-se da “Pedra Negra”, em torno da qual organizaram a Caaba, cubo onde está a pedra sagrada. De acordo com a tradição mulçumana, a pedra era inicialmente branca, se enegreceu em virtude dos pecados humanos.

A Caaba e a Pedra Negra (Meca – Arábia Saudita) (Foto: wikipedia.org)

Foi somente em 622, na chamada Hégira (fuga de Maomé de Meca para Yatrib – Medina), que surgiu o islamismo ou religião muçulmana, sob a liderança do profeta Mohamad (Maomé). O evento marca o ano 1 do calendário religioso islâmico e a transição dos árabes do politeísmo para o monoteísmo. Maomé sofreu influência do monoteísmo judaico-cristão e do dualismo persa (zoroastrismo).

Entre os vários princípios deixados por Maomé destacou a Jihad, termo árabe que significa “luta”, “esforço” ou empenho em nome do deus único, Alah. Dessa forma, todo o sacrifício ou esforço em nome de Alah é sagrado, até mesmo a guerra, se esta for necessária.

Após a morte de Maomé, em 632 d.C., seus seguidores, movidos pelo princípio da Jihad, iniciaram um processo de expansão do islamismo. Assim, outros povos, que não são árabes, assimilaram o islamismo. Daí afirmar-se que nem todo árabe é islâmico e nem todo islâmico é árabe, pois há uma minoria de árabes que professam outras religiões, como o cristianismo, e há povos que não são árabes, como os turcos e os iranianos (antigos persas) que aderiram ao islamismo.

A expansão do Islã (Imagem: geografiaparaprofessores.wordpress)

As tribos árabes que povoaram a palestina

Enquanto os judeus estavam dispersos pelo mundo, a região da antiga Canaã, também chamada Palestina, passou a ser ocupado por várias tribos árabes muçulmanas, a partir do século VII.

Até o século XX os árabes palestinos não conseguiram construir uma unidade suficiente para constituir um Estado. Além disso a tradição e as rivalidades entre essas comunidades não viabilizaram uma mentalidade voltada para uma união política.

A volta dos judeus para a região, desde o pós Primeira Guerra Mundial, fomentou disputas territoriais, políticas e religiosas, que não foram resolvidas até os nossos dias.

Outro aspecto interessante é que tanto os judeus quanto os árabes islâmicos se consideram herdeiros de Abraão considerando, de um lado, a linhagem de Isaac e, de outro lado, a linhagem de Ismael.

Palestina (Imagem: blogdaboitempo)

O Sionismo e a volta dos judeus para a Palestina

No século XIX, em meio à onda de nacionalismos extremados (pangermanismo e pan-eslavismo), as discriminações aos judeus foram intensificadas na Europa. É nesse contexto que o jornalista húngaro Theodor Herzl, autor do livro “O Estado Judeu”, colaborou para o desenvolvimento de um nacionalismo judaico, o Sionismo (lembrando a promessa feita no Monte Sião).

O Sionismo propunha a reunião dos judeus dispersos pelo mundo, sua volta para a Palestina e a efetivação do moderno Estado de Israel. Além disso, o Sionismo representou uma resposta da comunidade judaica internacional ao antissemitismo (termo que se caracterizou como a discriminação e opressão sobre o povo judeu).

Durante a Primeira Guerra Mundial (1914-1918) o Reino Unido necessitou de recursos econômicos e recorreu aos judeus ricos que encabeçavam o movimento sionista.

Essa aproximação viabilizou, em 1917, a “Declaração Balfour”, documento pelo qual o Reino Unido se comprometia, em caso de vitória na 1ª Guerra, a apoiar a volta dos judeus para a Palestina e o reconhecimento de um Estado Judeu na Região.

Porém, como os britânicos contaram com o apoio dos árabes para lutar contra o Império Turco-Otomano, durante a 1ª Guerra Mundial, comprometendo-se a apoiar a autonomia dos povos árabes, a Declaração Balfour foi considerada uma traição dos britânicos aos árabes.

Após a 1ª Guerra o Império Otomano foi desmembrado pelo Tratado de Sèvres, mas os árabes não conseguiram a autonomia prometida. O território foi transformado em protetorados da França (ficou com Líbano e Síria) e Reino Unido (ficou com Egito, Palestina, Jordânia, Iraque e Kuwait).

Detendo poder sobre a Palestina, o Reino Unido passou a apoiar os assentamentos dos judeus na região. Para poderem consolidar a presença nos territórios ocupados foram organizadas milícias judaicas denominada Haganá. O objetivo inicial dessas forças paramilitares era defender os assentamentos judeus dos ataques árabes. Mas, com o tempo parte dessas milicias passaram a ter uma perspectiva mais agressiva, destacando-se o Irgun (milícia mais radical). Por suas ações violentas esse grupo chegou a ser classificado como uma organização terrorista sionista.

Mas, foi após a 2ª Guerra Mundial, tendo em vista a revelação dos horrores do holocausto cometido pelos nazistas contra os judeus, que a causa sionista ganhou efetivamente o apoio da comunidade internacional. Dessa forma, o reconhecimento do Estado de Israel, em 14 de maio de 1948, consolidava um antigo sonho. Porém, por outro lado gerou forte reação dos países árabes vizinhos da Palestina.

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