RICARDO DELLA COLETTA, JULIA CHAIB E THIAGO RESENDE / BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A equipe do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) iniciou conversas com diferentes governos estrangeiros para tentar ampliar o número de doadores do Fundo Amazônia, mecanismo de financiamento a projetos ambientais travado durante a administração Jair Bolsonaro (PL).

Pessoas que acompanham o tema disseram à Folha de S.Paulo que há negociações em curso para que a Suíça faça um aporte no fundo. França e Reino Unido também foram consultados sobre possíveis doações.

O aceno foi feito ao governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), que teve reuniões sobre o tema durante a COP27, conferência sobre o clima da ONU (Organização das Nações Unidas) no Egito.

“Eu tive reunião com a França, que sinalizou positivamente [doar para o fundo]. E tivemos, inclusive, informação, já de consequência também de uma reunião que tivemos lá [Egito], de que o Reino Unido também é positivo”, disse Helder à Folha de S.Paulo.

Atualmente, os doadores internacionais do fundo são a Noruega (R$ 3,1 bilhões concedidos até agora) e Alemanha (R$ 192 milhões). A Petrobras também realizou doações entre 2011 e 2018 que somaram R$ 17 milhões.

O Fundo Amazônia foi paralisado durante a gestão Bolsonaro. Noruega e Alemanha anunciaram em 2019 o congelamento dos repasses após decisão do governo Bolsonaro de extinguir os dois órgãos de governança do fundo: o Comitê Orientador (o Cofa) e o Comitê Técnico (o CTFA).

Além das mudanças no sistema de governança do fundo, outro fator que contribuiu para o congelamento do dinheiro foram os recordes de desmatamento registrados nos últimos anos. A retórica antiambiental de Bolsonaro, visto na Europa como um negacionista climático, consolidou a paralisia do fundo.

A vitória de Lula em 30 de outubro mudou radicalmente a percepção de governos estrangeiros. Tanto Alemanha como Noruega sinalizaram a intenção de voltar a colaborar com o mecanismo de financiamento ambiental.

“Tenho o prazer de informar que logo após nossa vitória na eleição de 30 de outubro, Alemanha e Noruega anunciaram a intenção de reativar o Fundo Amazônia para financiar medidas de proteção ambiental na maior floresta tropical do mundo”, declarou Lula durante a COP27.

A avaliação entre aliados do petista é que há boa vontade na comunidade internacional inclusive para ampliar o número de doadores do fundo.

De acordo com pessoas que acompanham as conversas, as negociações com a Suíça têm como meta um possível anúncio no Fórum Econômico Mundial em Davos.

Os suíços querem oferecer um palco internacional relevante para a possível participação de Lula em Davos, em janeiro. O anúncio de iniciativas dos suíços na área ambiental é considerado uma forma de empoderar o petista na agenda do clima –uma das metas dos países europeus.

Outro governo que foi procurado por emissários de Lula foi o Reino Unido. Os contatos foram feitos durante a COP27.

Reservadamente, os britânicos dizem que uma possível contribuição para o Fundo Amazônia não estava no radar, uma vez que eles atuam em outros programas no Brasil. Mas, diante da demanda do governo de transição, a hipótese passou a ser analisada por Londres.

Helder Barbalho afirmou ainda em entrevista à Folha de S.Paulo que a captação de recursos para investimentos na área climática -não apenas no Fundo Amazônia- deve ser um dos eixos da política ambiental do novo governo.

“Nós vamos ter que fazer desta reconstrução de imagem [do Brasil no exterior] um ativo importante para que nós possamos extrair dos principais países -e destacam-se Estados Unidos, Reino Unido, Noruega, França e Alemanha– oportunidades que se coloquem um horizonte extremamente relevante de captação de recursos para o financiamento climático”, disse.

A realização de uma contribuição para o Fundo Amazônia ocorre mediante contrato entre o ente doador, no caso um governo estrangeiro, e o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). O banco é o gestor do fundo, sendo responsável pela captação de recursos e monitoramento de projetos apoiados.

Interlocutores afirmam que, no contrato, o doador afirma estar de acordo com as regras do fundo. Em linhas gerais, um comitê técnico fica responsável por determinar as prioridades; e o BNDES, por aprovar e implementar a aplicação dos recursos.

“O Fundo Amazônia é um instrumento de cooperação internacional, é preciso haver entendimentos formais entre os países interessados e o governo brasileiro. Uma vez que isso ocorra, após análise técnica, negociação bilateral e aprovações devidas, o BNDES e os doadores interessados celebram os contratos de doação”, afirmou o banco de fomento, em nota.

Questionado, o BNDES disse que até o momento não foi chamado a participar de processo sobre a entrada de novos doadores.

Como a Folha de S.Paulo mostrou, a agenda climática é vista por aliados de Lula como o caminho mais rápido para que ele se apresente como um líder de destaque no tabuleiro global.

A estratégia já foi posta em prática, a partir da escolha da COP27 como primeiro destino internacional do petista e das reuniões realizadas no Egito.

Após ser eleito, Lula se encontrou com diferentes representantes estrangeiros responsáveis por tratar de mudanças climáticas -como John Kerry (Estados Unidos), Xie Zhenhua (China), Espen Barth Eide (ministro do Clima e Meio Ambiente da Noruega) e Teresa Ribera (ministra de Transição Ecológica da Espanha).

O projeto Planeta em Transe é apoiado pela Open Society Foundations.

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