O caso do participante do Big Brother Brasil 2021, da TV Globo, o professor João Luiz Pedrosa, em que apontou comentários racistas sofridos por ele no programa na última segunda-feira (5), trouxe à tona uma questão ainda sem solução no país: o racismo estrutural.

No episódio, o cantor goiano Rodolffo Matthaus viu semelhança entre uma peruca de homem das cavernas e o cabelo de João. Após isso, o sertanejo tentou justificar o ato afirmando que não houve maldade ou intenção de magoar, além de citar o pai, que ele disse ter o cabelo igual ao do outro participante. Nas redes sociais, alguns internautas apoiaram Rodolffo e chegaram a criticar o professor vítima dos comentários.

O tema repercutiu no Debate Super Sábado de hoje (10), que teve como convidados Iêda Leal, que é coordenadora do Centro de Referência Negra Lélia Gonzáles, Secretária de Combate ao Racismo da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) e secretária de Comunicação da CUT-GO, e Pedro Ivo, mestre em Educação, Linguagem e Tecnologias.

“As pessoas querem justificar o injustificável ao invés de se desculpar e entender que vivemos em um país que as pessoas comparam aos negros, elas acham que os negros quase todos, são despossuídos da humanidade, e as comparações mais absurdas são naturalizadas e viram piadas (…). Este combate ao racismo e a possibilidade de uma pessoa negra interpelar o outro que isso é racismo, causa estranheza, porque nós temos um país em que os brancos e os não brancos, ou aqueles que não se colocam como negros, acham que é uma violência a nossa reação”, afirma Iêda.

“A fala do cantor e o não entendimento que ele mora em um país e tem uma diversidade racial, é muito importante compreender isso, ele devia pegar esse momento para se organizar e ser mais um combatente da nossa luta”, complementa a secretária. “Lutar contra o racismo dói”.

Iêda Leal destaca a importância de se posicionar diante de piadas e comportamentos racistas e até mesmo homofóbicos. Para ela, o episódio ocorrido no reality show mostra como a população está despreparada para o enfrentamento ao racismo.

“Não se desespere, você realmente está vivendo uma sociedade onde o racismo se manifesta a cada esquina, então é necessário contar com ele e não ficar nesse debate insano se ele estava certo ou errado, nós estamos tristes há mais de 500 anos nesse país e nós estamos lutando para ter uma sociedade melhor. Racismo é crime”, conclui.

Ainda durante o programa, e depois de deixar o BBB, Rodolffo reconheceu o erro pediu desculpas. O artista compartilhou o momento em seu perfil nas redes sociais.

“Pedir desculpa novamente a todo mundo que ficou chateado, que ficou revoltado. Enfim, qualquer sentimento negativo que eu possa ter causado com qualquer comentário, sendo do João, sendo outros comentários, estou aqui de coração para pedir desculpa, estou aqui assumindo meus erros e estou aqui para consertá-los. Eu não estou aqui para errar e bater o pé e falar que estou certo, não. Estou aqui para consertar, para assumir e para ser de verdade”, disse o cantor.

No Debate Super Sábado, Pedro Ivo comenta que apenas desculpar-se não é suficiente, mas sim entender por que o racismo aconteceu. “É uma estrutura colonial, herdada no período colonial, que caminha junto com a estrutura capitalista, patriarcal. O racismo é um pilar do ocidente tanto como o capitalismo é, e o patriarcado é. O racismo foi construído em cima desses três pilares”, analisa.

Para ele o combate ao racismo começa em pequenas atitudes. “Vou combater todos os dias por parte de instituição, por parte de pessoas e nisso vou trabalhando, e parte disso tenho que entender que enquanto pessoas brancas ficam dizendo não vai adiantar, pois não adianta nós pessoas negras estarmos o tempo todo nessa posição de resistência, ficar dizendo o que é, o que tenho que fazer. Não tenho que educar pessoas brancas, eu não preciso disso”, afirma. “É preciso dizer e apontar o erro e é preciso mostrar que as coisas não são dessa forma” conclui.

Iêda destaca o crime trabalhista em que a mulher negra não tem descanso e relembra o caso de Madalena, que bateu na porta de uma mulher branca para pedir comida aos 8 anos, e teve uma vida sem direito a estudo para ser tratada como escrava: lavando, passando e cozinhando, sendo resgatada com 46 anos de idade.

“Aquela mulher negra não recebia salário, eles a casaram com uma pessoa para eles receberem uma pensão, e essa pensão ela nunca ouviu falar”, disse Iêda e que não devemos minimizar o sofrimento do João. “Todos os Rodolffos com essas atitudes racistas precisa entender isso, e a pessoa que quer cantar para o seu público não pode (ter atos racistas), ela precisa ter mais cuidado”, finalizou.

Confira o debate na íntegra a seguir

Ananda Leonel é estagiária do Sistema Sagres de Comunicação, em parceria com IPHAC e a Faculdade UniAraguaia, sob supervisão do jornalista Johann Germano