Mesmo suspensos desde março, a Prefeitura de Goiânia detectou que novos lançamentos de empréstimos consignados foram feitos, sem autorização, no Sistema de Controle de Consignações da Secretaria de Gestão de Pessoas. Uma sindicância, formada por servidores do próprio órgão, foi instaurada para apurar as irregularidades. No início do ano, a gestão municipal suspendeu os empréstimos porque as consignações extrapolaram o limite de comprometimento da folha. A legislação determina que os contratos de empréstimo consignados não podem exceder mais de 30% do vencimento de cada servidor. Como o porcentual não vinha sendo respeitado, no início do ano, o prefeito Paulo Garcia (PT) assinou decreto suspendendo o empréstimo até encontrar uma solução.
O surgimento de novos lançamentos pegou a prefeitura e o Sindicato dos Trabalhadores do Município de Goiânia (Sindigoiânia) de surpresa. Afinal, quem estaria por trás dessa irregularidade? E para beneficiar quem? No início do mês, uma portaria foi publicada no Diário Oficial do Município constituindo a Comissão de Sindicância. Formada por três servidores da secretaria, a comissão tem até o final de novembro para concluir os trabalhos, que podem ser prorrogados por mais 30 dias.
Procurado pela reportagem, o presidente da comissão, Cláudio Sérgio Gomes Pereira, não quis dar detalhes dos trabalhos justificando que as informações são sigilosas. Mas adiantou que a comissão está ouvindo servidores do próprio órgão que poderiam estar envolvidos nos lançamentos irregulares. “Estamos na parte das oitivas para saber o que aconteceu, se alguém está beneficiando algum servidor ou uma instituição financeira”.
Já a Secretaria de Gestão de Pessoas, por meio de nota, explica que a comissão foi instaurada devido à denúncia de próprios servidores municipais. Afirma também que as novas operações foram feitas no mês de outubro e que, até hoje, não existe qualquer banco ou instituição financeira devidamente habilitada e com convênio vigente junto ao Município para proceder os devidos lançamentos em folha.
Para o Sindigoiânia, o surgimento de novos lançamentos é preocupante. O vice-presidente do sindicato, Mauro Zica Júnior, diz que a operação só pode ser feita com autorização de servidores da prefeitura. “E quem está fazendo isso, faz descumprindo a legislação. E tudo isso pode cair no mesmo problema, ou seja, empréstimos que vão prejudicar o servidor. Se estão fazendo isso, o sindicato não tem conhecimento, mas vai tomar todas as medidas para que o erro seja corrigido. Não aceitamos de forma alguma que o servidor seja passado para trás”.
Mauro Zica diz que a falta de previsão do retorno do empréstimo consignado tem feito os servidores a recorrerem aos agiotas, que cobram juros de 10% a 15%. “Como o empréstimo está suspenso há muito tempo, o servidor está recorrendo a agiotas, que cobram juros de 10% a 15%. Essa questão do empréstimo é um câncer para o servidor. É uma solução, mas também um câncer porque as instituições abordam os servidores, atuam nas secretarias e tentam convencê-lo a contrair mais empréstimo. Tinha servidor com 95% do seu salário comprometido no consignado”, relata o vice-presidente.
Novas regras
Para resolver o impasse do empréstimo consignado, em setembro a prefeitura publicou o Decreto nº 4303, que dispõe sobre a averbação de consignações em folha de pagamento e exige uma série de documentos das entidades interessadas em serem consignatárias. O órgão diz que enviou notificações para diversos bancos e instituições financeiras informando das novas condições estabelecidas pelo decreto. Porém, até hoje nenhum banco ou entidade financeira está habilitada para firmar convênio com a prefeitura.
Dezenove instituições já encaminharam a documentação, mas apenas três entregaram os documentos completos. Os processos estão na Procuradoria Geral do Município, que aguarda o restante das documentações necessárias para emissão de parecer e celebração de convênio. Por esse motivo que a secretaria informa que não é possível precisar o efetivo retorno das operações de créditos consignados em folha.
Para Mauro Zica, o problema também reside na pressão de grupos financeiros. Ele relata que quando a questão ficou incontornável, com servidores comprometendo até 95% do seu salário em consignado, o Sindigoiânia procurou a prefeitura sugerindo a implantação de um sistema informatizado, para que o próprio servidor buscasse o banco ou instituição financeira. “Mas isso dependia de licitação, foi feita, mas existe pressão muito grande de grupos financeiros. E isso tem prejudicado de sobremaneira os servidores. Queremos que o empréstimo volte a funcionar, desde que seja estritamente dentro da lei”.
O vice-presidente tem a informação que o retorno do empréstimo dependeria também da conclusão do trabalho de auditoria na folha de pagamento da prefeitura. Em setembro, a gestão municipal contratou a Fundação Getúlio Vargas para executar o serviço, após uma série de denúncias envolvendo irregularidades na folha de pagamento, como supersalários e excesso de servidores em órgãos que sequer existem, como o CONDATA. No entanto, a previsão de conclusão dos trabalhos é de um ano.