Pressionada pelo Ministério Público Federal em Goiás (MPF/GO) e sem qualquer planejamento para área de resíduos infectantes, a Prefeitura de Goiânia decidiu romper, oficialmente, o contrato com a empresa Serquip, responsável pela coleta e tratamento de lixo hospitalar, e fechar negócio, sem licitação, com a gigante norte-americana Stericycle Gestão Ambiental, que atua em outros 11 países.
O pacto comercial terá duração prevista de seis meses, ao custo total de R$ 2,070 milhões. O cumprimento do contrato será fiscalizado pela Companhia de Urbanização de Goiânia (Comurg). O documento está pronto desde 12 de setembro, mas foi publicado no Diário Oficial do Município no último dia 14 de novembro.
Contratualmente, a Comurg estima que coletará por mês cerca de 300 toneladas de lixo hospitalar em Goiânia, o que renderá pecuniariamente a Stericycle, considerando o valor de R$ 1,15 o quilo, aproximadamente R$ 345 mil mensais. A assessoria de imprensa da estatal goianiense, por sua vez, calcula que o sistema de saúde na capital produza entre sete e oito mil quilos por dia, o que corresponderia a mais ou menos 240 toneladas ao mês. Um volume que custaria ao erário município em torno de R$ 69 mil a menos ao formalizado em contrato.
De acordo com a Comurg, não há descontinuidade operacional no processo de coleta, pois Stericycle e Serquip “seriam a mesma coisa”. A norte-americana Stericycle chegou ao Brasil em julho de 2010, quando comprou 70% das cotas da empresa Serquip, que atua na gestão de coleta, transporte e incineração dos resíduos sólidos perigosos, entre eles os resíduos de serviços de saúde (RSS).
Em setembro daquele ano, a empresa estadunidense expandiu a sua atuação brasileira para o Rio Grande do Sul, onde comprou a empresa gaúcha RTM. A Stericycle adquiriu, ainda, as cotas da ATT Ambiental, localizada em São Paulo. Isso ocorreu em dezembro de 2010. O negócio consistiu na terceira aquisição da gigante norte-americana no Brasil.
Operacionalização
O serviço será comandado pela Comurg e prevê apenas a coleta dos RSS. O material reunido é, então, entregue à Stericycle, que dá a destinação final, realizando a incineração. A coleta do lixo hospitalar pela Comurg abrange a todas as unidades de saúde (clínicas, hospitais e laboratórios) privada e pública de Goiânia, cujo universo é calculado em cerca de 300 unidades pela empresa municipal.
O trabalho é realizado por três caminhões e dois carros pequenos, sendo que um caminhão e os carros são responsáveis por efetuar a coleta do resíduo hospitalar infectante, enquanto dois outros caminhões promovem a coleta do lixo orgânico que fica dentro dos hospitais. Os veículos de coleta do lixo hospitalar são da Comurg e são caracterizados com as cores e logomarcas da empresa pública. Os trabalhadores do caminhão, que estão atuando na coleta, também, seriam da Comurg.
Stericycle
De acordo com o seu site, a Stericycle iniciou suas atividades nos Estados Unidos (EUA), com a pretensão de ser a maior empresa do mundo, no seu segmento. Em 1993, iniciou um processo de crescimento por meio de aquisições de outras empresas prestadoras de serviços. A estratégia estaria sendo utilizada até os dias atuais. Em 1996, a Stericycle abriu o capital e rapidamente se tornou a maior empresa dos EUA na prestação de serviços de tratamento de resíduos dos serviços de saúde (RSS).
Em 1999, começou a oferecer, em solo estadunidense, seguros e serviços de treinamento. Atualmente, mais de 139 mil clientes de saúde dependem dos serviços da Stericycle, para manter suas mãos de obras seguras, qualificadas e atualizadas.
Globalmente, a Stericycle passou atuar em serviços de coleta de resíduos médicos desde 1998. Atualmente, a ela opera nos EUA, Reino Unido, Irlanda, Canadá, México, Argentina, Chile, Porto Rico, Romênia, Portugal e Brasil.
Casa dos Hospitais
A falta de planejamento estratégico no setor de coleta de resíduos sólidos de serviços de saúde em Goiânia resvalou em limites críticos no início deste ano de 2013. Em março, quando se encerrou o contrato formal com a Serquip, a Prefeitura de Goiânia não dispunha nem de pontos de apoio para descanso, higienização e troca de uniformes dos trabalhadores e muito menos de estoques de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), que evitariam riscos à saúde dos trabalhadores no recolhimento dos resíduos hospitalares.
Houve necessidade na interferência tanto da Procuradoria do Trabalho (MPT/GO), quanto da Superintendência Regional do Ministério do Trabalho (SRTE/GO). Era preciso costurar um grande acordo, que colocasse fim ao caos urbano, gerado pelo lixo hospitalar. Sentaram-se à mesa Comurg, secretarias Estadual e Municipal de Saúde, Vigilância Sanitária Municipal, Hospital das Clínicas, advogados da Associação dos Hospitais do Estado de Goiás (AHEG), Federação dos Hospitais do Estado de Goiás (Fehoesg), Sindicato dos Hospitais do Estado de Goiás (Sindhoesg) e Associação de Combate ao Câncer de Goiás (ACCG).
Acordou-se, então, que caberia aos hospitais públicos e privados partilhar a conta de R$ 64 mil, suficiente para cobrir as despesas com a aquisição de EPI’s, que estão sendo usados até o final deste ano, pelos 16 trabalhadores envolvidos com o trabalho de coleta do lixo hospitalar. A Casa dos Hospitais centralizou o recebimento dos recursos, assim como a compra dos equipamentos e repasse à Comurg.
O dinheiro surgiu dos hospitais privados. Os pontos de descanso foram disponibilizados pelo setor público de saúde. Na ocasião, determinou-se, ainda, que todos os hospitais públicos e privados deveriam providenciar a separação do lixo comum do lixo contaminado, conforme determinação legal.
Unidades vistoriadas
A Comurg deflagrou, por determinação do Ministério Público Federal em Goiás (MPF/GO), na última semana de novembro, uma operação para fiscalizar cerca de 300 unidades de saúde públicas e particulares em Goiânia, com o propósito de verificar o descarte correto dos resíduos hospitalares. Uma equipe multidisciplinar, compostas por médico, engenheiro e técnico de segurança do trabalho, estão percorrendo as unidades em diferentes turnos.
A medida foi tomada com base em uma auditoria da SRTE/GO, realizada no início deste ano, revelar graves irregularidades nos serviços de coleta (interna e externa), transporte (interno e externo), armazenamento (depósito externo) e disposição final dos resíduos hospitalares produzidos pelo Hospital de Doenças Tropicais (HDT) em Goiânia.
Desde janeiro deste ano que o MPF/GO monitora o descarte, coleta e tratamento do lixo infectante, produzido pelo sistema de saúde em Goiânia. Um inquérito civil público para apurar a situação chegou a ser instaurado no dia 23 de janeiro. No último dia 7 de outubro, o procurador Regional dos Direitos do Cidadão, Ailton Benedito, realizou uma audiência pública com representantes do setor.
Benedito está convencido de que a situação de descaso se repete em inúmeras unidades hospitalares na capital e no interior de Goiás. Diante do cenário, ele garantiu estar disposto a enfrentar o problema. Aliás, o MPF/GO concedeu prazo até o final de novembro para que a Comurg resolva o problema da coleta.
Os setores de saúde, institucional e governamental firmaram um termo, concordando em cumprida as regras no descarte do lixo, que deve obedecer aos critérios estipulados na Norma Reguladora 32 do Ministério do Trabalho e Emprego, que traz especificações como forma correta de armazenamento do lixo, uso de luvas e vestimenta adequada.