Conciliar os estudos com o trabalho não é uma condição acessível a todos. No Brasil, essa realidade nada recente tem se mantido ano após ano para grande parcela dos jovens, e continua gerando inquietação. No entanto, só se indignar com esse dado não é suficiente.

A conclusão é do economista, superintendente-executivo do Instituto Unibanco e professor associado da Fundação Dom Cabral, Ricardo Henriques, em artigo publicado no jornal O Globo.

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Henriques se baseia nos dados de um levantamento feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que aponta que 13 milhões de brasileiros entre 15 e 29 anos, número que representa 26% do total, encontram nessa situação, chamada de “sem-sem” ou “nem-nem”: nem trabalham, nem estudam.

Para o economista, é preciso agir “na construção de uma política coesa, integrada e atraente para as juventudes, focada nos mais independentes, e que seja multissetorial e multinível, com os próprios jovens engajados em seu desenho”.

Escola mais atrativa

Ricardo Henriques defende que a estratégia para buscar uma solução que supere o “nem-nem” no Brasil deve ter como base o eixo da educação, mas não pode ser o único. Um primeiro passo é a reformulação das escolas.

“É preciso renovar esse espaço e torná-lo mais atrativo, produzindo sentido ao ato de estudar e aumentar o desejo de se concluir o ensino médio, num ambiente amigável e seguro para desenvolver todas as dimensões que o jovem desejar”, defende.

Segundo Henriques, a reforma do Ensino Médio caminha nessa direção, mas só ela não é suficiente. “São imprescindíveis ações que incentivam a progressão e conclusão, a transição entre e a escola de trabalho, ou para a continuidade dos estudos, no ensino técnico ou superior”, afirma no artigo.

Segundo Henriques, “dentre as ações para aumentar a conclusão do médio, uma proposta em debate neste momento de transição de governo é o pagamento de incentivos financeiros para jovens”. O economista prossegue e afirma que “uma síntese de evidências dessas políticas , divulgada há 10 dias pelo Dados para um Debate Democrático na Educação, mostra que programas com desenho adequado a cada contexto social, metas claras e focadas nos que mais precisam podem gerar resultados positivos” e que “no entanto, coerente com o mantra de que não há bala de prata, não deve ser visto como única ou grande solução”.

Abismo

Para Ricardo Henriques, outra questão são as oportunidades que um jovem em situação de vulnerabilidade social terá em relação a outro que nasceu em uma família de maior renda e escolaridade, mesmo se forme em uma escola de qualidade.

“Nesse sentido, há dois eixos que devem complementar o educacional: geração de renda e engajamento com participação. O primeiro exige oportunidades de renda e trabalho específico para os jovens ao fim do Ensino Médio, técnico ou da graduação. Aqui, há possibilidade de construção de novos padrões de articulação de políticas públicas nos territórios – desde micro ou mesorregiões até arranjos nas periferias. Temos, por exemplo, oportunidade de maior integração entre escolas estaduais, Institutos Federais de Educação, escolas técnicas estaduais e universidades, além do Sistema S – todos em diálogo com os setores médicos locais”, escreve Henriques.

O especialista afirma ser fundamental que Estado e iniciativa privada se alinhem e ampliem ofertas de vagas para esse público.

Incentivo à arte, esporte e cidadania

Em um segundo eixo, Henriques defende o investimento em atividades relacionadas à arte, música, dança, religião, esporte, cidadania, comunicação, tecnologia, política e lazer. Segundo o economista, o abismo entre jovens ricos e pobres necessita de atuação intencional do Estado.

“As políticas públicas no Brasil focaram historicamente em oferecer cada um desses eixos de forma fragmentada. Mas há bons exemplos recentes de políticas integradas, como é o caso de Alagoas. Ainda é cedo para tirar mas indicadores como o aumento de 23% nos matriculados na rede estadual de 2021 para 2022 e a reativação de um Conselho Estadual das Juventudes ativo e bem articulado sugere um caminho virtuoso”, afirma Henriques, no artigo.

Por fim, o especialista menciona o estudo “Consequências da violação do direito à educação”, de Ricardo Paes de Barros e coautores. O levantamento aponta uma estimativa de que 3,3% do PIB nacional “a perda gerada pelo fato de meio milhão de jovens chegar à vida adulta sem concluir o ensino médio, sem falar nos impactos sociais, emocionais e existenciais”.

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