A cidade não foi fundada em 24 de outubro e o fato não tem importância. A comemoração poderia se dar em qualquer data, fosse a do Batismo Cultural, a da instalação das primeiras famílias, a da chegada das repartições públicas. Enfim, convencionou-se 24 de outubro e cá estamos em festa. Infelizmente, a alegria é maior pelo feriadão que pela marca de 80 anos. Seguidos administradores deixaram Goiânia sem lugar para seus moradores passarem férias ou, sequer, um fim de semana prolongado. Quem pode, sai de Goiânia sempre que é vermelho na folhinha.

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O fundador Pedro Ludovico ficaria triste ao sofrer nos engarrafamentos nas saídas de Caldas Novas, Trindade e, principalmente, Inhumas. É o goianiense fugindo do tumulto no trânsito, do barulho ensurdecedor das músicas bregas, da rotina em meio ao concreto. A capital não oferece a suas famílias o direito ao lazer. O córrego Botafogo, que à época de Pedro Ludovico tinha águas plácidas e muitos peixes, foi destruído pelo encaixotamento. O córrego Botafogo foi tão vítima de crime que é mais conhecido como marginal. Está resumido a um filete purulento. Havia o cheiro de mato, agora é só a podridão dos esgotos clandestinos. Em situação idêntica estão todos os demais cursos d’água. E em situação pior está o Córrego Caveirinha, que aguentava a Arisco e agora vai suportar um shopping construído a poucos centímetros de seu fiapo de vida.

A data de aniversário de Goiânia pode ser qualquer uma, inclusive a do dia em que algum governante finalmente despoluir todos os rios, córregos, ribeirões e minas.

Que deixe de ser 24 de outubro e passe para a data em que as autoridades derrubarem todos os empreendimentos erguidos em área de preservação.

Que seja no dia em que os chefes dos poderes Legislativo e Judiciário demolirem a Assembleia, o Fórum e o Tribunal de Justiça, tirarem o entulho e recuperarem o Córrego dos Buritis.

A data do aniversário pode ser com Goiânia mostrando a sua cara, não uma floresta de placas de todos os tamanhos.

Pode ser a do dia em que o transporte público for humanizado.

Pedro Ludovico nunca se importou com data. Ele se importava com pessoas. E as pessoas querem uma Goiânia como a que Pedro Ludovico idealizou: com rios que, em lugar de pneus, tenham peixe.

Pedro Ludovico escolheu esta região para nova Capital por causa da riqueza hídrica. Hoje, as águas são tão putrefactas quanto a consciência das autoridades que liberam a poluição. Por isso o goianiense, em vez de ficar para a comemoração, some no planeta. Afinal, a data que lhe interessa é a do próximo feriadão.