Não é segredo que as mudanças climáticas afetam milhões de pessoas, incluindo ocorrências de conflitos de migração, ataques a refugiados, especialmente mulheres e outras minorias vulneráveis. Até 2050, estima-se que mais de 158 milhões de mulheres e meninas devem enfrentar a pobreza, além de 236 milhões que devem enfrentar a insegurança alimentar. Tudo isso se deve ao aquecimento global.

Os dados são do relatório da ONU Mulheres: “ Justiça climática feminista: Um modelo para ação”, que evidencia como as mudanças climáticas tem o potencial de piorar crises ao redor do mundo, destacando o impacto desmedido sobre mulheres e meninas. Ele indica uma perspectiva de justiça climática feminista, que una os direitos femininos na luta contra os desastres ambientais

O relatório propõe que para a aplicação dessa justiça climática feminista, 4 pontos, melhor dizendo, 4 Rs devem ser executados: Reconhecer os direitos, o trabalho e o conhecimento das mulheres; Redistribuir recursos econômicos; Representar as vozes e a agência das mulheres e, por fim, reparar desigualdades e injustiças históricas.

Reconhecimento

É evidente o protagonismo feminino no ativismo climático, Greta Thunberg, inclusive, é a ativista mais jovem e conhecida. Tudo começou pequeno, com sua greve escolar e, à medida em que outras pessoas foram se identificando e sendo conquistadas pelos seus ideais, ela foi ganhando popularidade. A própria já discursou sobre justiça climática na Assembleia da ONU em 2019.

Para que mudanças se tornem realidade, políticas públicas devem reconhecer que as mulheres enfrentam desafios desproporcionais. Pensando no contexto local, a redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), do ano de 2023, faz a sociedade pensar em um desses desafios, especificamente o do cuidado não remunerado. Com o aumento na temperatura global, as secas são mais frequentes, as colheitas tendem a ser ruins e a saúde familiar deve ser comprometida, fazendo com que se agrave esse tipo de trabalho não remunerado, sobrecarregando meninas e mulheres.

Conforme o parecer, os governos devem assegurar respostas firmes sobre desastres, produção de alimentos, discriminação social, violência de gênero, economia, produção de alimentos e outros tópicos que perpassam a crise climática.

Realocação

A fim de reverter as mudanças climáticas, será necessária — de acordo com o relatório — a retirada de recursos de atividades extrativistas e ambientalmente prejudiciais e realocar nas que priorizam o cuidado com as pessoas e o planeta em detrimento do lucro.

A economia verde é o futuro, e a transição para essa economia deve ser assegurada por meio de políticas que ajudem as mulheres no acesso a oportunidades que contemplam emprego, moradia, tecnologia e educação. O Estado deve prover sistemas de proteção social que apoiem o bem-estar econômico e social das mulheres e meninas, considerando as consequências do avanço do aquecimento no globo.

A merenda escolar é um dos caminhos apontados para amenizar a sobrecarga ocasionada pelo trabalho de cuidado não remunerado das mulheres, pois propicia nutrição às crianças, além de que esse caminho pode ser ainda mais sustentável, considerando que os ingredientes e alimentos podem ser adquiridos de pequenas agricultoras que respeitem de maneira plena o meio ambiente.

Representação

Para uma justiça climática que seja pelo direito das mulheres, especialistas defendem um enfoque que integre o gênero na elaboração de políticas públicas ambientais.

Na contemporaneidade, mulheres estão sub-representadas em ministérios de proteção ambiental no nível nacional. Por um lado, as mulheres têm participado mais em delegações para as conferências climáticas COP da ONU, dados indicam um aumento de 30% para 35% entre 2012 e 2022, já por outro lado, a proporção de delegações que tem mulheres na liderança diminuiu de 21% para 20% tendo em mente o mesmo período.

É citado como um exemplo de sucesso no parecer o caso do “La via Campesina”, organização global que mulheres e pessoas com diversas identidades de gênero estabeleceram uma Assembleia de Mulheres, com o propósito desta garantir paridade de gênero, integrando as demandas dessas minorias e capacitando-as nas tomadas de decisões sobre clima e alimentação desde comunidade locais até o Sistema ONU

Reparação

O foco dos recursos financeiros para combater as mudanças climáticas deve focar nos países e populações mais vulneráveis para, dessa maneira, promover reparações históricas e desigualdades vigentes.

Apesar de ter sido aprovado um fundo de perdas e danos na COP 27, os fundos são voluntários, isto é, não há nenhuma garantia de que os países ricos do Norte global serão responsabilizados por danos ocasionados pela exploração desenfreada dos recursos, fato que ocorre há mais de 170 anos.

Para contornar essa situação, o relatório convida os países ricos a financiarem programas climáticos que garantam o destino dos recursos aos países mais pobres e às organizações femininas de base para pagar a dívida climática, afinal, eles foram responsáveis por mais de 92% das emissões excessivas

Por fim, os países desenvolvidos devem solucionar as consequências que não se relacionam diretamente com a economia. Querendo ou não, as consequências se relacionam com o já mencionado trabalho não remunerado, aumento da violência baseada em gênero e o deslocamento de povos de suas terras ancestrais, algo que provoca um apagamento dos conhecimentos e patrimônio daqueles povos.

*Este conteúdo está alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), na Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU).

Leia Mais