Um retrato das filhas na parede da sala de casa e depois disso “os faróis se apagaram”. Os últimos momentos antes de parar de enxergar não saem da memória de Rogério Gomes da Silva, o Rogerinho da Comurg.

Foto: arquivo pessoal

Aos 41 anos, mesmo com os “faróis apagados”, como ele mesmo definiu a perda da visão, Rogerinho trabalha todos os dias no Viveiro Redenção, no Setor Pedro Ludovico, em Goiânia, onde ajuda a montar as mudas de plantas, e depois do expediente ainda tem as aulas do curso de pedagogia na UNIFAN, em Aparecida de Goiânia. Falta pouco para se tornar o professor Rogério.

“Escolhi pedagogia, primeiramente porque tem mais campo de trabalho e também por causa do número de concursos. E por eu ser cego e poder ensinar braile. Vi que são poucos professores que dominam o braile. Acima de tudo, quero ajudar outras pessoas a ler, como aconteceu comigo”, destaca Rogerinho, que começou o curso em 2019, parou um tempo por motivos financeiros, mas se forma no fim de 2023.

A história de Rogerinho, traz exemplos que buscam inclusão, com a redução das desigualdades na busca de uma educação com qualidade.

Ajuda ao próximo

Ao mesmo tempo que sonha em melhorar a vida de quem precisa ensinando braile, Rogerinho precisou de ajuda, afinal nasceu enxergando e aos poucos foi perdendo a visão.

“Tenho Glaucoma Congênito. Descobri aos 13 anos quando não enxergava mais as letras do quadro na sala de aula”, lembra Rogerinho, que estudava no Colégio Estadual Dom Pedro I, em Aparecida de Goiânia.

Na Comurg desde 2006, Rogerinho passou como gari em uma das vagas para PCD – Pessoa com Deficiência. Faz seis anos que perdeu totalmente a visão e não vê os rostos da esposa Núbia, com quem é casado desde os 19 anos, e das filhas Kênia, 20 anos, e Carolina, 16 anos.

“Meus olhos enchem de água. Tenho o rosto de cada uma delas na mente. Também lembro das minhas meninas depois de mocinhas”.

Na faculdade

Como está perto de se formar, Rogerinho já prepara o TCC – Trabalho de Conclusão de Curso. O tema: “A Importância do Braile na Educação Infantil”. Na sala de aula conta com a ajuda da Bárbara, uma professora de apoio, mas quando estuda em casa, quem ajuda é a filha Kênia, que auxilia na digitalização do trabalho de conclusão.

Rogerinho também explicou que no dia-a-dia, aproveita o tempo no trabalho para estudar as matérias que são passadas. Fã da professora Dorotéia, que leciona História de Goiás, grava tudo o que sua filha lê das apostilas.

“Quando tem uma tarefa ou um trabalho, tenho o auxílio da tecnologia. Minha filha lê os textos, gravo, passo para um pen – drive, coloco em um dispositivo de áudio com um fone e fico muitas vezes trabalhando e ouvindo as matérias ao mesmo tempo”, explica Rogerinho, que diferente dos outros alunos, apresenta seus trabalhos em sala.

“Entrego meus trabalhos com apresentações, com coisas que gravo na memoria. Sou bom de memória”.

Saudades

Kênia e Carolina, filhas de Rogerinho Foto: arquivo pessoal

Além de poder ver os rostos da esposa e das filhas, Rogerinho também lembra de outras coisas que fazia e sente saudades. “Gostava muito de andar de bicicleta e jogar futebol. Eu era bom de bola, viu”. E por causa da paixão pelo futebol se tornou torcedor do Atlético Clube Goianiense e acompanha os jogos pelo rádio.

“Falar em rádio pra cego, você sabe como é, né. Assisto na televisão, mas logo desligo. A emoção no rádio é bem maior”, brinca o rubro-negro, trabalhador, estudante e futuro professor Rogério Gomes da Silva, que foi direto sobre o que quer daqui pra frente.

“Vou concluir meus objetivos”.

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