No último domingo (29), a HBO liberou o terceiro episódio da série The Last of Us, “Long, Long Time“, no qual comoveu os fãs do jogo e até mesmo aqueles que nunca jogaram. Afinal, a história de Bill (Nick Offerman) e Frank (Murray Bartlett) trouxe uma nova narrativa, diferente do game do PlayStation e, até mesmo, diferente de tudo aquilo que já foi abordado em produções apocalípticas.

A cada episódio, a série encanta com os detalhes, a trilha sonora e o enredo que leva os telespectadores a vivenciar as emoções dos personagens e saborear o enredo rico dos NPCs (personagem não jogável, do inglês “non-player character“). As referências são incontestáveis e suas adaptações têm surpreendido boa parte do público que conhece o jogo, mas os que não conhecem não perdem o encanto.

Os personagens não jogáveis, como Bill e Frank, ganharam uma história linda e comovente na série, graças a licença poética que as produções utilizam para agradar a grande massa e, neste caso, sem perder a linha principal da história.

Mas o que é licença poética?

Segundo o dicionário Houaiss, licença poética significa “liberdade de o escritor utilizar construções, prosódias, ortografias, sintaxes não conformes às regras, ao uso habitual, para atingir seus objetivos de expressão”. Desta forma, o autor tem liberdade de expressão, de se inspirar em alguma obra ou qualquer outro produto, alterar o percurso ou até mesmo ressignificar.

Spoiler!

Bom, senhoras e senhores, “Long, Long Time” ressignificou com sua dose de humor, ternura, leveza e um final trágico e romântico. Não é à toa que The Last of Us recebe tantos elogios à adaptação, graças a licença poética.

Logo no início do 3º episódio, Ellie e Joe seguem sua jornada até Bill. Durante o caminho, eles entram em uma loja de conveniências. Alguns diálogos refletem as mesmas falas de interação dos personagens principais do jogo, como, por exemplo, Ellie encontra uma máquina de fliperama e o Joel pergunta se ela já havia jogado. Prontamente, ela responde que não.

A dupla chega em uma cidade, cheia de prédios, e precisam desviar das armadilhas implantadas por Bill, um homem introspectivo, mas com extinto de sobrevivência. Ao encontrá-lo, ele conta sobre seu parceiro, Frank, mas que, por conta de uma briga, foi embora.

Durante a gameplay, Bill, Ellie e Joel vão para uma escola em busca de bateria, mas precisam fugir de uma horda de infectados. Ao entrar em uma casa para se esconderem, eles encontram Frank, morto, pois havia sido mordido por um dos infectados e decidiu tirar sua própria vida. Mas ele havia deixado um bilhete para Bill, explicando o motivo que o fez sair: ele odiava Bill, e os métodos de sobrevivência dele o incomodava, e que estava em busca de suprimentos e bateria para a Zona de Quarentena, em Boston. Depois, Bill continua na cidade, e Joel segue o caminho para levar Ellie aos Vagalumes.

No jogo, Bill alerta Joel sobre amizades, já que é difícil se relacionar.

Série

Nick Offerman assume o papel de Bill, e a similaridade do ator com o personagem deixa o coração dos fãs aquecidos. Na trama, ao invés de incluir Bill e Frank em papéis insignificantes, Craig Mazin, co-criador da série, decidiu humanizar e trazer o íntimo de ambos em uma nova perspectiva: um sobrevivente isolado ajuda um estranho e engatam em um romance de parceria e companheirismo. Neste episódio, Ellie e Joel ficam de escanteio após o episódio sensacional e emocionante “Infected“, já que há uma volta no tempo para contar a história de Frank e Bill até os dias atuais que se passa a série.

O cenário muda drasticamente, de um mundo destruído de hordas de infectados para uma pequena cidade, com cercas e cheias de armadilhas, onde dois homens vivem felizes e seguem rotinas corriqueiras. Pôr-do-sol, jantares à luz de velas, vinhos e pratos requintados dignos de Master Chef, com flores, frutas, cores quentes e aconchegantes. Uma paz que muitos desejariam viver. Durante a jornada do casal, eles conhecem Joel e Tess. Inclusive, Frank e Tess ficam muito próximos e criam códigos, os mesmos usados no primeiro episódio, os “Anos 80”.

Mesmo por um breve momento, eles são atacados por contrabandistas e as armadilhas os detém. Eles vivem juntos por 20 anos. Em apenas um episódio, a série entrega um enredo de um homem bruto e um outro gentil, coadjuvantes em um cenário lindo de se assistir. Um final triste, porém satisfatório. Após 20 anos, Frank está com uma doença e de cadeira de rodas, e eles decidem viver um último dia, que terminou em um delicioso jantar à luz de velas como de costume. Por fim, ambos falecem em seu quarto e com a janela aberta.

Os amigos de Joel e Tess ganham desfecho triste, porém romântico. Uma cidade e história de NPCs ganharam importância na série. Ao voltar para 2023, Joel e Ellie chegam na casa dos amigos. A cidade já não é a mesma, está mal cuidada e com as flores murchas. Ellie toma um banho e veste uma camiseta vermelha, como da personagem do game. Ela encontra uma carta que Bill escreveu para Joel, contando o que aconteceu. Ao ler para ele, o desfecho do pensamento do Bill do jogo para o Bill da série passa por alterações. Ele diz: “Eu odiava o mundo, e fiquei feliz quando todos morreram. Mas eu estava errado, porque tinha uma pessoa que valia a pena salvar”, se referindo a Frank. O valor de dar chance a alguém e salvar. Isso impacta Joel, ainda mais em sua jornada com Ellie.

Após isso, Joel cita três regras, idênticas às falas do game, para Ellie. Entre elas: não falamos da Tess. Choramos? Muito.

A licença poética foi simplesmente sensacional. Sabemos que adaptações são difíceis, principalmente dos games. Mas, neste caso, a maestria como foi conduzida mereceu os 10 do IMDb. Não há palavras para explicar como 1h20 de episódio envolveu o público na narrativa dos coadjuvantes e nos deu um desfecho totalmente inesperado e comovente. Vale a pena assistir!

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