Ao longo desta semana, o tema Violência contra a Mulher ganhou repercussão nacional e local por causa de três fatos: no domingo (11), Pamella Holanda denunciou o marido, DJ Ivis, por agressão. O compositor é responsável por várias músicas que estão fazendo sucesso atualmente, como “Esquema Preferido”.

Já na terça-feira (13), o Senado Federal aprovou projeto de lei que combate à violência política contra a mulher. O texto criminaliza o abuso e a determinação de que o enfrentamento a esse tipo de violência faça parte dos estatutos partidários.

E por fim, dados divulgados pela Secretaria de Segurança Pública de Goiás (SSP-GO) revelam que 29 mulheres foram agredidas por dia no primeiro semestre de 2021.

A edição #253 do Debate Super Sábado convidou a presidente da comissão da mulher advogada da OAB Goiás, Ariana Garcia, e a doutora em Sociologia, professora da UnB e feminista, Ana Paula Antunes Martins.

Leia Mais | Senado define regras de combate à violência política contra a mulher
O que é violência?

Quando se trata de violência há várias maneiras de como ela pode ser classificada: física, psicológica, patrimonial, financeira, sexual e moral. Com isso, no âmbito da violência de gênero, de acordo com Ana Paula não é uma questão se resolva apenas na Segurança Pública, mas é muito mais abrangente.

“A violência de gênero contra as mulheres é todo e qualquer ato que envolve o uso da força real e também da força simbólica para restringir a liberdade e a autonomia das mulheres. É por isso que uma das situações mais críticas que gera violência é o divórcio. O divórcio é o catalisador, é um fator de risco […] A mulher muitas vezes é vitimada pelo exercício de um desejo, de uma vontade das mais compreensíveis que é, de não se relacionar mais afetivamente com uma pessoa”.

Leia Mais | Tenha Voz #02: Saiba o que caracteriza a violência contra a mulher

Visão jurídica da violência

Segundo Ariana Garcia, apesar do Direito apresentar definições e conceituar na legislação a violência contra a mulher, esses atos passam por uma questão cultural, e que a psicológica é uma das mais comuns -, mas que há dificuldades de se ter um processo baseado nessa violência.

“A situação é tão delicada, tão culturalmente aceita, tão naturalizada que quando a mulher discute a violência psicológica no qual ela passa, mesmo contextualizada existe uma dificuldade dos operadores do Direito que estão envolvidos na dinâmica processual, captarem e compreenderem o quanto pode ser sutil, mas o quanto é profundamente devastador”.

Leia Mais | Tenha Voz#1: Saiba como buscar ajuda

Além disso, a presidente ressaltou que o desafio do Direito, para além de conceituar as leis, se envolver socialmente e rever os conceitos pessoais. Muitas mulheres se sentem acanhadas e reprimidas em tentar fazer uma denúncia, pelo medo de uma nova agressão ou pelo motivo de não ser ouvida juridicamente. Sobre isso, Ariana comentou que as vítimas sentem vergonha de serem julgadas.

“Existem relatos no sentido de que há o julgamento da autoridade policial, que vai atendê-la de imediato, colher essas informações. ‘Por que ela continua a brigar se o cara estava bêbado?’, ‘Por que ela estava ali sendo que poderia ser resolvido de outra forma?’. Na própria abordagem da polícia ostensiva, que muitas vezes é chamada ao lar que está com algum problema de violência doméstica há também o julgamento”, afirmou.

Lei Maria da Penha – Por que não há recuo da violência?

Este ano, a Lei Maria da Penha completa 15 anos e é reconhecida no mundo todo. A lei trouxe ao país centros especializados, núcleos em instâncias públicas no Brasil, além de termos um dos sistemas legislativos mais robustos e profundos sobre a violência contra a mulher. Apesar desses fatores, os números parecem não diminuir. A Doutora em Sociologia explicou que a violência já faz parte da sociedade.

“A violência de gênero é uma estrutura da sociedade de dominação e que a desigualdade tem essa faceta. Qual é a cara da desigualdade do Brasil? É sexista e é racista. Então mulheres, especialmente mulheres negras sofrem a violência de modo exacerbado. […] Quando o conflito vira violência, é porque existe dominação e existe uma vontade, um desejo de subtrair a liberdade do outro, de extinguir a autonomia da outra pessoa”.

Leia Mais | #248: Namoro saudável ou abusivo? Especialistas avaliam situações enfrentadas por casais

Agressores, vítimas e omissores

No domingo (11), repercutiu nas mídias sociais digitais o caso de Pamella Holanda, que apresentou vídeos e denunciou as agressões sofridas por ela e feitas pelo marido Dj Ivis. Nas imagens, pode-se perceber que a violência foi cometida com outras pessoas presentes no local, o que levou a questionamentos sobre a omissão delas em relação as atitudes do compositor. Sobre isso, Ana Paula comentou que é muito comum que agressões aconteçam perto de outras pessoas e explicou o porquê disso:

“Não é nada raro e é, inclusive comum, que essas violências não ocorram só na presença das duas pessoas. Elas podem ocorrer dentro do ambiente doméstico, mas na presença de outras pessoas, ou é muito comum que elas aconteçam na via pública. Ou o homem vai até o trabalho da mulher, lá naquele lugar ele faz a tentativa de feminicídio ou consuma o feminicídio […] Quando ele faz esse ato, é o ato simbólico em que ele quer dar o exemplo para a sociedade que ele tem o poder”.

Ana Paula ainda ressaltou o papel das pessoas que se omitem ao presenciar a agressão dizendo que todos deveriam fazer um pacto e entender que a agressão não é correta: “saia de casa, peça ajuda para alguém”. Qualquer pessoa pode denunciar a violência contra a mulher.

Números da violência contra a mulher

“Em briga de marido e mulher não se mete a colher”, esse ditado já está sendo mudado na sociedade, pelo menos nas redes sociais é visto que a gíria é outra: “Em briga de marido e mulher, se mete a colher sim”. Mas nós não conseguimos calcular o tanto que a violência contra a mulher é um problema social, é o que diz Ariana. “Quando a gente olha os números do SUS e quando a gente vê retratado no sistema previdenciário o quanto impacta esse sistema em função da violência sofre, a mulher fica incapacitada para o trabalho, entra em depressão, desenvolve enfermidades”.

Por fim, Ana Paula explicou que o masculino não é dominação: “o masculino pode ter outro sentido na sociedade. De solidariedade, de cooperação, de liberdade. Que outros sentidos a gente pode dar para o feminino e o masculino, de modo que as pessoas possam viver sem violência?”

Para denunciar casos de violência contra a mulher disque 180 para a Central de Atendimento à Mulher.

Sugestões de Leitura

– A Construção da Sororidade nos discursos da Revista Azmina – Autoras: Liliane Machado, Aline da Silva SCHONS e Laila Carolline Silva de MELO DOURADO

Mariana Tolentino é estagiária do Sistema Sagres de Comunicação, em parceria com a Iphac e a Unialfa, sob supervisão da jornalista Tandara Reis.