A brasileira Rayssa Leal tem 13 anos e conquistou a medalha de prata nos Jogos Olímpicos de Tóquio na modalidade Skate Street, se tornando a medalhista olímpica mais jovem da história do Brasil. Após o êxito, o deputado federal Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ) sugeriu mudanças no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), tendo ainda como questionamento o porquê que crianças podem praticar um esporte profissional, mas não podem trabalhar.

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Para debater sobre o tema o Sagres Sinal Aberto deste sábado (31), recebeu o Superintendente de Desporto da Secretaria Municipal do Esporte de Goiânia, William Mendes, a psicóloga Karina Maristela Barbosa, o doutor em Ciências do Esporte pela Universidade de Coimbra e Coordenador de Esportes e Lazer da UFG, Juracy Guimarães, além de Rayanne França, oficial do Programa e Cidadania dos Adolescentes da UNICEF.

Ouça o debate na íntegra:

Declaração do deputado

A fala de Sóstenes Cavalcante gerou muito debate nas redes sociais e opiniões controversas, entretanto, o deputado federal afirmou também que “defender a revisão do ECA quanto ao trabalho infantil, não significa defender a exploração desse trabalho ou o sacrifício da infância e da educação das nossas crianças”.

Sobre isso, Rayanne França destacou que discursos assim não podem ser normalizados. “A gente sempre acredita na proteção dos direitos de cada criança e adolescente, e cada um tem o direito a arte, cultura, lazer e ao esporte. Então a gente sempre se posiciona com esse sentido, da garantia desses direitos. A gente incentivar o trabalho infantil é uma prática totalmente errada. Eu acho que a gente deveria olhar as dimensões de diversos outros pontos e não acabar caracterizando ou normalizando esse tipo de discurso que nesse momento não ajuda quando a gente pensa na proteção da garantia desses direitos”.

Além disso, a psicóloga Karina complementou lamentando a realidade de algumas crianças brasileiras e o fato de que várias delas buscam no esporte uma maneira de sair da vulnerabilidade social.

William ainda ressaltou que o comentário do deputado federal foi infeliz e explicou que isso é um retrocesso. “A vida é feita de fases que devem ser respeitadas. Tem a fase do recém-nascido, da criança, do adolescente e da terceira idade. Outra questão que o deputado não lembrou é a questão do ECA, do Estatuto da Criança e do Adolescente, criado no início dos aos 90. Ou seja, é um retrocesso em pleno século 21. Acho que ele até se arrependeu da forma como foi colocado”.

Juracy Guimarães salientou que a declaração teve propósito e foi descontextualizada, levando em conta a importância que deve ser dado a educação e formação integral da criança.

Estudo e esporte

“O estudo vem sempre em primeiro lugar em qualquer fase da vida, principalmente quando se é criança”, é o que afirmou William Mendes, complementando sobre a falta de políticas públicas esportivas e efetivas no Brasil.

“A questão do esporte, em si, do ponto de vista de competição é dividido em quatro planos: o esporte educacional, esporte escolar, esporte de rendimento e esporte social. Ou seja, contempla todos aqueles que têm interesse na prática esportiva. Vale lembrar também que o esporte é um direito constitucional […] e de forma geral, nós não temos isso no Brasil”, declarou o superintendente.

Psicologia nos atletas

A psicóloga Karina Maristela Barbosa comentou sobre Inteligência Emocional, que segundo ela é uma forma das pessoas e dos atletas controlaram as emoções e entender qual delas é a mais importante em cada situação.

“Eu posso sentir raiva, mas o que eu vou fazer com essa raiva que é o relevante. E com o esporte, eu acredito que a gente precisa ensinar para nossas crianças e adolescentes a importância de participar e a importância de trabalhar em grupo mesmo quando tratarmos de esportes individuais”.

Além disso, a psicóloga argumentou que esse aprendizado deve ser feito a partir de casa e que é necessário ter alternativas para que as famílias sejam atendidas e, assim, incentivar o filho nas vitórias e nas derrotas.

Esporte no desenvolvimento da educação

No Brasil há programas de iniciação esportiva, mas com realidades muito diferentes. O doutor em Ciência do Esporte Juracy Guimarães comentou alguns equívocos sobre as políticas públicas no Brasil e como elas são trabalhadas.

“As políticas públicas no Brasil garantem o direito, mas não oferecem igualdade de condição para as pessoas. Então, esse é o problema principal das políticas públicas no Brasil. Nós temos favelados, nós temos crianças de escolas particulares, nós temos crianças de escolas públicas, então é impossível você exigir o mesmo mérito de uma criança igual a Rayssa, em relação a uma criança que mora na favela, que sequer tem dinheiro para usar um tênis”.

Por fim, Juracy explicou sobre o segundo equívoco das políticas públicas, que é considerar que a Educação Física escolar é obrigada a criar atletas de alto rendimento, como os olímpicos. “Na verdade a educação física é responsável por apresentar o esporte para a criança e ela vai trabalhar na formação integral, assim como Matemática, Português, História e Ciências”.

Mariana Tolentino é estagiária do Sistema Sagres de Comunicação, em parceria com o Iphac e a Unialfa sob a supervisão do jornalista Denys de Freitas.