Na última segunda-feira (6), o presidente Jair Bolsonaro assinou uma Medida Provisória, chamada de “MP das Fake News”. O documento impede que as redes sociais retirem do ar perfis ou conteúdos que não cumpram com os termos de serviços pré-determinados, exceto para casos como nudez, terrorismo e pedofilia. Outro ponto da discussão, é o Marco Civil da internet que regula o uso da mesma no Brasil tendo como foco direitos, princípios e garantias como, por exemplo, da liberdade de expressão.

Para discutir sobre esse assunto, a edição de hoje (11/9) do Debate Super Sábado recebeu o sócio do FAS Advogados Marcio Lamonica, a advogada Maria José Luccas, o especialista em ciência da computação Daniel Lobo e a professora da Puc Goiás e doutoranda em Ciências da Comunicação na Universidade da Beira Interior- Portugal, Lara Guerreiro.

Ouça o debate na íntegra:

Liberdade de expressão

Perguntada sobre o conceito de liberdade de expressão, Maria José Luccas explicou que impedir a expressão é como tirar um direito de todo cidadão

“A Constituição Federal nos garante o direito de expressão e nós temos o direito de personalidade que é o que nos compõem, nossos pensamentos, nosso ser. E o que nós pensamos é que temos o direito de expressar porque isso faz parte da nossa personalidade, então impedir uma expressão da nossa personalidade é reprimir um direito fundamental da Constituição”.

Entretanto, a advogada ressaltou que o que é dito muitas vezes pode ferir uma outra pessoa ou conceito, portanto, junto do direito se expressar vem a responsabilidade de não sair ofendendo terceiros para não gerar tumulto na vivência em sociedade. “Nas redes sociais, as pessoas entendem que por estar detrás de um perfil, muitas vezes falso ou não aberto, ela pode dizer o que quiser sobre qualquer assunto, só que muitas vezes isso está ferindo um grupo, causando discriminação”.

Além disso, Lara Guerreiro comentou que muitas vezes tem a confusão entre liberdade de expressão e liberdade de empresa: “a de expressão é do indivíduo, a da empresa é de fazer o que ela acha correto, dar informações alinhadas a política interna e valores dela. O governo está legislando em causa própria, ele fez todas as modificações para ele mesmo poder falar o que quer, sendo verdade ou não”.

O momento da Medida Provisória

De acordo com Marcio, não há nada de errado no que está escrito na Medida Provisória, mas a grande questão é o momento na qual ela foi posta, visto que a propagação de Fake News se espalhou de forma mais contundente. Além disso, tem a preocupação de como elas serão aplicadas, já que antes não tinha as regras de justa causa.

“Os dois lados são maléficos para a sociedade. Não eliminar um perfil que esteja fazendo alguma coisa que ultrapasse os limites dele e como deixar esse perfil, e esse é o nosso grande desafio. Essas regras vieram para ajudar ou complicar essa moderação? A moderação deve existir porque abusos acontecem. Como saber se essa moderação vai existir? Não permitir que uma fake news seja propagada ou permitir”.

Lara compartilhou do mesmo pensamento de Marcio e complementou que o governo se aproveitou de um ponto em que era necessária uma intervenção, para interferir no momento que era bom para alguém. A professora ainda afirmou que a MP não é o procedimento jurídico correto para essa causa: “Lá fala sobre discriminação, preconceito, raça, religião e tudo isso é muito óbvio. E esse era o instrumento jurídico para ser feito isso? Nós temos que ser honestos com nós mesmos e com a sociedade que não era. A partir do momento em que o governo tem suas contas retiradas, lógico que se sentiram ofendidos”.

A doutoranda ressaltou que é necessário perceber a verdadeira intenção por trás de tudo. “Agora a gente tem uma regulação que beneficia outras pessoas. Os conteúdos continuarão sendo retirados, mas isso vai criar uma discussão que vai atrasar a retirada e criar um fato. Vai fazer com que a mensagem retirada passe a ser discutida muito mais, por mais pessoas e por mais ambientes”.

A parte técnica da MP

Daniel Lobo, em relação a técnica, também vê com atraso a moderação dos conteúdos e que há um “campo minado” nas opções que as redes sociais tem para decidir o que é ou não relevante.

“Isso pode causar um pouco mais de implicações nas denúncias. Hoje as provedoras de conteúdo têm os termos de uso e a gente acredita que por boa fé elas tentem manter o bem-estar do usuário. Então ficaria mais complicado, demoraria mais tempo para fazer a denúncia?”, questionou.

Para Marcio, a discussão é como vamos moderar, como fazer e discutir as intenções da medida provisória que, segundo ele, são no mínimo questionáveis.

Por fim, Maria salientou que é preciso entender que a moderação é algo bom e não a censura.

Mariana Tolentino é estagiária do Sistema Sagres de Comunicação, em parceria com o Iphac e a Unialfa sob supervisão do jornalista Denys de Freitas.