A reforma tributária trouxe à tona a discussão sobre a taxação de bebidas açucaradas e ultraprocessadas. De acordo com o projeto, aumentar os impostos sobre esses produtos pode ser uma oportunidade significativa para reduzir doenças, mortes evitáveis e melhorar a qualidade de vida da população.

Nos últimos dez anos, a obesidade infantil e adolescente custou ao Sistema Único de Saúde (SUS) cerca de R$ 213 milhões. Em 2017, a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomendou que os países adotassem um imposto de 20% sobre bebidas açucaradas.

Luíza Gazola, pesquisadora do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens) da Faculdade de Saúde Pública da USP, esclarece o conceito de “bebida ultraprocessada”.

“De acordo com o Guia Alimentar para a População Brasileira, as bebidas adoçadas – como refrigerantes, chás, sucos e bebidas lácteas – que possuem ingredientes industriais, como frutose, polidextrose e maltodextrinas, e também têm a presença de aditivos alimentares, como aromatizantes, corantes e edulcorantes, são consideradas bebidas ultraprocessadas”.

Luisa Gazola Lage – Foto: Nupens/USP

Relevância para a saúde pública

Há cerca de 15 anos, surgiu uma nova classificação para avaliar padrões de consumo alimentar, introduzindo o termo “ultraprocessado”. Há dez anos, o Guia Alimentar Brasileiro passou a usar esse termo e recomendar a redução do consumo desses alimentos.

Embora o campo ainda seja recente e não haja todas as respostas sobre os efeitos dos ultraprocessados na saúde, já existem evidências suficientes que indicam que o consumo desses produtos aumenta o risco de ganho de peso, doenças crônicas não transmissíveis, hipertensão arterial, doenças cardiovasculares e alguns tipos de câncer.

Alimentos ultraprocessados e ricos em açúcar têm um impacto direto e negativo na qualidade de vida da população, tornando-se uma questão de saúde pública. O Guia Alimentar para a População Brasileira, disponível gratuitamente online, oferece orientações sobre como melhorar a nutrição.

Luíza Gazola destaca que desenvolver a habilidade de diferenciar alimentos ultraprocessados dos não ultraprocessados é uma excelente forma de regular as escolhas de consumo.

Taxação como política pública

Luíza defende que aumentar os impostos pode ser uma medida efetiva, mas deve compor “um pacote de intervenções, não pode ser feito de maneira isolada”. O que ela afirma é que a taxação por si só não terá um efeito tão positivo, e que deve ser aliada a outras formas de propostas de redução.

“Um exemplo de sucesso, semelhante ao que está sendo proposto para as bebidas adoçadas, foram as políticas antitabaco, em que foram realizadas a sobretaxação dos produtos, a proibição de fumar em lugares específicos, a proibição de propagandas, entre outras medidas”, diz a pesquisadora.

Políticas públicas aliadas a essa medida podem ser, por exemplo, a regulação do marketing. Luíza aprofunda: “A desassociação de personagens em embalagens como estratégia de marketing, a regulação do marketing para o público infantil em outros meios de comunicação, como na internet, que é bastante liberado”.

Além disso, accrescenta que é preciso disseminar a informação sobre os danos à saúde e alternativas de uma dieta saudável: “As crianças são muito beneficiadas quando têm acesso à informação, então é uma medida que também pode ser aplicada”.

Há também a valorização de cadeias curtas de produção de alimentos, ou seja aquele, alimentos que não viajam muito para chegar à mesa do consumidor. “Políticas de incentivo fiscal para agricultura familiar, para agricultura agroecológica; já existem várias medidas que estão sendo apresentadas que são efetivas e que podem ser aplicadas juntamente com a tributação”, diz Luíza.

Impacto no consumidor

Apesar dos benefícios de tornar isso uma questão de saúde pública, novos impostos sempre são motivo de desgosto por parte da população. Um argumento é que isso aumentaria o custo de vida e afetaria justamente a população mais pobre. Sobre isso, Luíza apresenta dois contrapontos.

O primeiro é que as bebidas adoçadas não são produtos essenciais para o consumo humano. A pesquisadora explica: “Se deixarmos de consumi-las, essa já é uma medida positiva para a saúde, não precisamos substituir um refrigerante por uma outra bebida, simplesmente deixar de consumi-lo”. Ela afirma que, desde a pandemia, os alimentos ultraprocessados como um todo se tornaram mais baratos do que os in natura (minimamente processados), o que é algo preocupante.

Já o segundo ponto é o resultado de um estudo recente que simulou alguns cenários de tributação de alimentos ultraprocessados no Brasil. O estudo concluiu que a melhor proposta seria o cenário combinado, que se resume na sobretaxação de alimentos ultraprocessados e a isenção das alíquotas para frutas e verduras.

“Assim, nesses cenários, alimentos saudáveis ficariam mais baratos e mais acessíveis, principalmente para as populações mais vulneráveis, e teria também o maior impacto na qualidade da alimentação”, afirma ela. Essa seria uma forma de incentivar uma melhor nutrição da população e até barateando uma dieta equilibrada.

*Com informações do Jornal da USP

*Este conteúdo está alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU). ODS 03 – Saúde e Bem-Estar

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