Foi apresentado nesta segunda-feira (12), o resultado da 1ª Expedição Científica no Rio Meia Ponte. Sua bacia hidrográfica é responsável pelo abastecimento de 48% da população de Goiás. Entre os resultados encontrados, está o altíssimo nível de poluição no manancial, o que compromete a vida no curso do rio e de seus afluentes.

O resultado foi apresentado por meio de um documento denominado “Carta das Águas”. O volume tem 100 páginas contendo diferentes análises sobre tipos e níveis de poluição no Rio Meia Ponte.

A coordenadora da expedição, vereadora Kátia Maria (PT), avalia que é importante fazer o diagnóstico no sentido de identificar os níveis de poluição do rio e seus afluentes, além de articular entre diferentes setores que lidam direta ou indiretamente com o Meia Ponte, possíveis soluções.

“A situação é mais grave do que os próprios estudiosos haviam pensado. E agora nós da Câmara Municipal em conjunto com esses parceiros queremos construir um pacto”, explicou a vereadora.

O pacto visa a construção de um plano de Educação Ambiental, viabilização de fontes de financiamento para recuperação do rio, entre outras ações de curto, médio e a longo prazo.

Vereadora Kátia Maria em apresentação de diagnóstico do Meia Ponte. Foto: Samuel Straioto- Sagres Online.

A preocupação da parlamentar é que a ação não seja isolada, mas que ocorra de forma contínua, com intuito de que converter esforços em resultados para o Meio Ambiente e a coletividade.

“É um conjunto de ações, pois a qualidade da água não é satisfatória, há 31 pontos de assoreamento, várias áreas de erosões, uso inadequado de atividades no Meia Ponte, e teremos oportunidade fazer um trabalho conjugado, e garantirmos a qualidade da água do Meia Ponte”, disse Kátia Maria.

Outra expedição deve ser realizada no mês de setembro, quando o nível do Rio Meia Ponte estiver no seu ponto mais baixo. A avaliação é que a medida é necessária para avaliar as condições do manancial, em outro momento. Por ter menor concentração de água diluída entre diversos elementos, a tendência é que a situação a ser encontrada na próxima expedição seja pior.

Um dos mais graves problemas levantados ao longo do trabalho foi o grande e variado volume de resíduos descartados de forma irregular nas margens e no leito do rio (Áreas de Preservação Permanente – APPs);

Qualidade da água

A qualidade da água é comprometida por diversos fatores, por exemplo, pelas pesadas cargas de poluentes, entre eles metais pesados acima do permitido por lei, como Alumínio, Ferro, Fósforo e Manganês.

Em relação ao excesso de Fósforo em corpos d’água como o Meia Ponte, colabora para o aumento do crescimento de algas e outras plantas aquáticas, que podem consumir o oxigênio na água e causar a morte de peixes e outros animais aquáticos.

Também houve a identificação de espécies cianobactérias, que são capazes de produzir toxinas que podem ser prejudiciais para a saúde humana e animal.

A Atrazina é um herbicida amplamente utilizado na agricultura, que foi detectada em todos os pontos amostrados do Rio Meia-Ponte. A exposição crônica à este produto em humanos tem sido associada a problemas de saúde, incluindo o aumento do risco de câncer, desregulação hormonal e disfunção reprodutiva.

A quantidade de esgoto lançado no Meia Ponte, coliformes acima do tolerável é outra situação que prejudica a saúde pública.

Foram mapeados dezenas de pontos de lançamento irregular de efluentes industriais e domésticos no Meia Ponte e em vários mananciais afluentes, especialmente no Anicuns, Botafogo e Água Branca, causando significativos impactos ambientais e hídricos, caracterizados pela turbidez da água, forte e desagradável odor, desconforto e riscos aos moradores ribeirinhos.

As equipes localizaram pessoas pescando em locais poluídos para se alimentar ou mesmo vender em feiras livres de Goiânia.

Estudos comprovam graves consequências para a saúde humana pela ingestão de peixes provenientes de áreas com alta concentração de esgoto, lixo e poluentes industriais (parâmetros físico-químico, bacteriológico, metais e agrotóxicos acima do aceitável).

Tratamento

A superintendente de Meio Ambiente e Recursos Hídricos da Saneago, Camila Roncato, explicou à reportagem da Sagres que a Saneago tem procurado desenvolver obras para melhorar a qualidade da água do Rio Meia Ponte, por exemplo, o tratamento de esgoto secundário, na Estação de Tratamento de Esgoto, Dr Hélio de Seixo Brito, no Setor Goiânia 2.

O tratamento secundário visa aumentar a eficiência do trabalho atualmente realizado. “O primário é quimicamente assistido, consiste na adição de produtos químicos e ocorre uma decantação e o lodo gerado aplicamos de forma benéfica no solo. O secundário é o lodo ativado em que passa pela primeira etapa e bactérias passam por um processo de areração, passando de uma eficiência passando de 50 para 90% no tratamento”, explicou.

Além disso, outra preocupação é quanto ao lançamento de esgoto clandestino, ponto que está sendo analisado pela Saneago, assim como os órgãos do Meio Ambiente. Camila Roncato explicou que todo o esgoto produzido de forma clandestina será condudizdo para a Estação de Tratamento.

Descarte ilegal

Parte da poluição identificada, mesmo em áreas de vegetação nativa, se deve a notória a presença de atividades irregulares, tais como: currais e galinheiros (criação porcos, bovinos e aves), depósito de entulhos (ferro-velhos), captação irregular de água ou o lançamento irregular de efluentes, especialmente nos trechos mais urbanizados.

Há acúmulo de lixo e de lançamentos da rede pluvial, os quais por vezes trazem esgoto clandestino e água servida de milhares de habitações próximas ao Rio Meia Ponte ou de seus afluentes.

Assoreamento

O assoreamento é um dos principais problemas na bacia do Rio Meia Ponte em Goiânia. De acordo com os dados indentificados na expedição científica, há 31 pontos de assoreamentos, incluindo dois aterramentos, nove erosões lineares, quatro erosões fluviais, um rompimento de manilha e duas atividades impactantes não coincidentes com usos urbanos (pivôs de irrigação e mineradora).

De acordo com o diagnóstico, o assoreamento está associado a problemas no sistema de drenagem urbana, como rompimento ou ausência de sistema de drenagem e lançamento concentrado e acima da capacidade de resistência do corpo hídrico.

A deposição de sedimentos foi observada em oito dos nove pontos de análise para esta finalidade. A deposição de sedimentos causa assoreamento, gerando pontos de estrangulamento.

Existem diversos processos erosivos, de vários níveis, ao longo do manancial, contribuindo de forma significativa para o agravamento de processos de assoreamento, especialmente nas proximidades da foz dos afluentes e em áreas de descarte de resíduos de construção civil e de empreendimentos imobiliários em implantação.

Veja o documento completo

Responsabilidades

Além de ações no próprio Rio Meia Ponte, há também projeções para os tributários, principalmente o córrego Botafogo e o Ribeirão Anicuns, que estão entre os mais comprometidos. A situação é tão grave no Botafogo que o relatório indica que suas águas estão “enegrecidas”, tamanha a poluição.

Kátia Maria lembra que é importante que ocorra alterações no Plano Diretor de Goiânia, aprovado em março de 2022, e em vigor desde o mês de setembro.

“Uma das ações é promover a alteração do Plano Diretor, pois ele não protege a natureza. Precisamos cuidar também dos afluentes, temos de maneira bastante precária o Anicuns e Botafogo”, completou a vereadora.

Dar evidência

A reitora da Universidade Federal de Goiás (UFG), Angelita Lima destaca que ao longo da história, Goiânia virou as costas para o Meia Ponte. Ela relata que é preciso uma continuidade da integração obtida durante a expedição.

Para Angelita Lima, o modo de observar o rio precisa ser modificado. Ela defende a realização de pesquisas de forma permanente.

“É um trabalho de longo prazo, não é simples, é complexo, isso requer muitos recursos, por isso é preciso buscar parcerias e do ponto de vista da pesquisa é preciso fomentar as instituições para que colaborem na sua recomposição, promovendo um ambiente saudável para o rio e para a população.

Propostas

Várias propostas foram feitas para continuidade da expedição Rio Meia Ponte, entre elas, a da criação do “Observatório do Rio Meia Ponte” como forma de agregar conhecimento e ações, contribuindo efetivamente para a realização de trabalhos coletivos, articulados e cooperativos entre poder público, universidades empresas privadas e a Sociedade Civil Organizada.

O objetivo é a implementação de programas e projetos de monitoramento e executivos, que previnam e recuperem passivos ambientais e hídricos, como: áreas degradadas, matas ciliares, nascentes, erosões, assoreamentos, explorações/ocupações irregulares, corpos hídricos contaminados, dentre outros como:

Elaboração/atualização, aprovação e implementação do Plano Municipal de Saneamento Básico de Goiânia (PMSB), estabelecendo um cronograma de investimentos, com planos de metas.

Construção e aplicação continuada de um consistente “Plano de Educação Ambiental”, que seja trabalhado no conjunto da sociedade goianiense.

Necessidade de uma considerável e premente alteração do Plano Diretor de Goiânia, por apresentar, como ferramenta de gestão pública, diversas lacunas e inconsistências.

O que é a expedição?

A 1ª Expedição Científica do Rio Meia Ponte foi um trabalho realizado pela Câmara Municipal de Goiânia, em conjunto com outros órgãos, como: Universidade Federal de Goiás (UFG), Instituto Federal de Goiás (IFG), Saneago, Batalhão Ambiental da Polícia Militar, Corpo de Bombeiros, Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Semad), Agência Municipal de Meio Ambiente (AMMA), Centro de Zoonoses e Secretaria Estadual de Educação (Seduc).

O trabalho contou também com a participação de entidades privadas como a Fecomércio e o Secovi, além de organizações de voluntários como o projeto Guardiões do Meia Ponte e o Movimento Nacional dos Catadores e Catadoras de Materiais Recicláveis.

Meia Ponte no local onde fica a ETE Goiânia. Foto: Samuel Straioto.

Entre os dias 22 e 27 de março deste ano, o grupo de trabalho percorreu 45 km do Rio Meia Ponte, dentro do município de Goiânia, começando na Estação de Tratamento de Água (ETA) da Saneago, no Bairro Floresta (Região Noroeste) e encerrando na região do Vale das Pombas, na divisa com Senador Canedo.

O objetivo foi de colher amostras da água, solo, fauna e flora para identificar os possíveis problemas e avaliar a situação do rio para construção de um diagnóstico do Rio Meia Ponte, priorizando os limites do município de Goiânia.

A partir dos resultados, a proposta é oferecer aos gestores públicos e parlamentares, informações adequadas à criação e a implementação de políticas públicas de proteção e recuperação do manancial que contribua para o abastecimento sustentável da população.

Segundo o Ranking do Saneamento do Instituto Trata Brasil, o tratamento de esgoto em Goiânia só chega a 72,46% da água utilizada por moradores. Ou seja, cerca de 27% do esgoto da capital retorna aos rios sem tratamento.

“Encontramos captação ilegal de areia no meia ponte. Captação ilegal de areia, quantidade absurda de resíduos, mal cheiro, descarte ilegal de esgoto e muitos outros problemas estão afetando o principal rio que banha nossa capital”, destacou a vereadora Kátia Maria durante a expedição.

Metodologia do trabalho

A Expedição foi organizada em duas frentes de trabalho: embarcada e por terra. Para a realização dos levantamentos de dados, os expedicionários formaram equipes para a obtenção de informações nas seguintes áreas: recursos hídricos, resíduos sólidos, flora, fauna, uso e ocupação do solo, educação ambiental, serviço social e vigilância sanitária.

Bacia do Meia Ponte

A Bacia Hidrográfica do Meia Ponte tem enorme importância para a região Centro-Sul de Goiás, interligando 39 municípios, numa área aproximada de 12.180 km2 (SEMAD, 2023). O seu principal leito, o rio Meia Ponte, percorre da nascente (Itauçu) até a foz (próximo a Itumbiara) cerca de 471,6 km, quando deságua no rio Paranaíba, divisa entre os estados de Goiás e Minas Gerais.

A bacia do Meia Ponte é considerada a mais importante do estado de Goiás, nesta bacia concentra aproximadamente 48% da população goiana A bacia do Rio Meia Ponte é formada por cerca de 85 mananciais, sendo que na sua maior parte apresenta algum tipo de degradação

Na Região Metropolitana de Goiânia (RMG) que este rio exerce fundamental papel no abastecimento público de água, ao atender uma população superior a 2,5 milhões de habitantes, juntamente com o seu principal afluente, o ribeirão João Leite.

*Este conteúdo está alinhado com o Objetivo de Desevolvimento Sustentável (ODS) 06 da Agenda 2030 da ONU – Água Potável e Saneamento.

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