O Ministério da Educação (MEC) instituiu no ano passado as Diretrizes Operacionais Nacionais de Qualidade e Equidade para a Educação Infantil para começar a solucionar os problemas históricos desta etapa de ensino. Além da execução dessa política educacional, o que mais esperar da educação brasileira em 2025? Janice Mendes, professora do Uninter e especialista em educação, aponta aspectos importantes de cada etapa no ensino do país.
“Acredito que a Resolução CNE/CEB nº 1/2024 nos dá uma base sólida para avançar”, diz sobre o documento que tem caráter norteador para a primeira fase da educação básica. A educação infantil é a primeira etapa da educação básica para crianças de 0 a 5 anos de idade, oferecida nas creches e pré-escolas, em estabelecimentos educacionais públicos ou privados, define a resolução.

No Brasil, porém, a escolaridade não é obrigatória até os três anos de idade. Em contrapartida, a lei estabelece a obrigatoriedade de vagas e estabelecimentos suficientes para atender os pais que necessitam colocar seus filhos em creches. Já as crianças entre 4 e 5 anos devem obrigatoriamente frequentar a pré-escola.
Desafios da educação infantil
Dados do Censo Escolar 2023 revelaram que o país estava a cerca de 900 mil matrículas de atingir a meta de 50% da população de até 3 anos matriculada em creches em 2024. A meta é do Plano Nacional de Educação (2014-2024). Isso significa que o país tinha ano passado 4,1 milhões de crianças matriculadas.
Mendes diz que aumentar o número de vagas nas creches segue como o principal desafio da educação infantil neste ano. “O maior desafio continua sendo a ampliação do acesso. Apesar de ser um direito garantido, muitas crianças de 0 a 3 anos ainda estão fora das creches. Estima-se que mais de dois milhões de crianças nessa faixa etária não tenham acesso ao atendimento, o que é uma lacuna significativa”, afirma.
A nova política possui foco na normatização da infraestrutura para fins de garantir qualidade e equidade na gestão educacional. Bem como, infraestrutura, ambientes educativos, processos pedagógicos e condições promotoras da aprendizagem e do desenvolvimento das crianças.
Em números gerais, o Censo de 2023 destaca que há pelo menos 76,7 mil creches em funcionamento no Brasil, que atendem 66,8% das crianças na rede pública e 33,2% das crianças na rede privada. No detalhe, sabe-se que a maioria das crianças estão matriculadas em escolas municipais, um percentual de 99,8%. Enquanto isso, há 50,4% que estão na rede privada ocupam vagas de instituições conveniadas com o poder público.
Política consistente

No parágrafo acima está a quantidade de pessoas atendidas nesta etapa, mas como disse a professora, o país agora tem uma base sólida para avançar. No entanto, ela ressalta que a política por si só não será eficaz, pois para melhorar o cenário desta etapa de ensino será preciso investimento.
“Para que ela seja efetiva, será preciso superar os desafios históricos. Pois a implementação eficaz dessas novas diretrizes depende de investimentos consistentes para garantir tanto a ampliação quanto a qualidade do atendimento”, afirma.
Mendes avalia a questão da qualidade da infraestrutura como essencial para esse avanço. Além das crianças que estão na fase das creches, o país tem 5,3 milhões de alunos matriculados na pré-escola. Essa etapa é diferente porque ela faz parte da universalização da educação estabelecida pela Constituição Federal na faixa etária de 4 e 5 anos. O caminho agora é tornar a política para a educação infantil consistente e eficaz no país.
“É essencial que os educadores da educação infantil estejam bem preparados para lidar com as especificidades do desenvolvimento infantil, criando um ambiente educativo que seja tanto estimulante quanto seguro. Isso requer investimento em formação continuada e valorização dos profissionais”, argumenta.
Desenvolvimento de habilidades
A alfabetização ocorre na idade certa quando a criança sabe ler e escrever até o final do 2° ano do ensino fundamental. Esse é o primeiro desafio da segunda etapa da educação básica, que tem por finalidade o desenvolvimento dos estudantes.
“O Ensino Fundamental, de fato, ocupa uma posição fundamental no desenvolvimento dos estudantes. Embora tenhamos avançado na ampliação do acesso e na redução das taxas de analfabetismo, ainda há lacunas significativas em termos de qualidade”, diz Janice Mendes.
Esta etapa é a maior e abrange da alfabetização ao desenvolvimento de habilidades e absorção de conhecimento. Para a professora, o ensino fundamental cumpre bem parte de seu papel, mas acredita que ainda há a necessidade de fazê-lo entregar bem o estudante para a fase seguinte.
“É necessário fortalecê-lo em termos de qualidade, equidade e conexão com as fases seguintes da educação. Isso inclui uma abordagem mais interdisciplinar e contextualizada, aliada ao desenvolvimento de habilidades socioemocionais, para que os estudantes tenham uma base sólida e consigam fazer escolhas conscientes para seu futuro acadêmico e profissional”, destaca.

Investimentos em educação
As melhorias na educação brasileira passa por investimentos. Um relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) lançado no ano passado com dados de 2015 a 2021 mostrou que o Brasil está entre os dez países dos 40 que compõem a organização que menos investem em educação.
A média anual gasta por aluno de escola pública no país, segundo o relatório, é de R$ 20,5 mil. A maior parte dos estudantes do país estão no ensino público que se propõe a ser de qualidade, mas ao pensar o que seria um investimento ideal para atingir essa qualidade, Mendes argumenta que o fator qualidade vai além de um número fixo.
“Não se trata apenas de aumentar os valores. O investimento precisa ser estratégico, focado na valorização e formação continuada de professores, infraestrutura adequada, acesso a tecnologias, material pedagógico de qualidade e políticas públicas que reduzam as desigualdades regionais e sociais”, diz.
Segundo a professora, os países que alcançam os melhores desempenhos em indicadores educacionais internacionais, como os relatórios do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), possuem investimento anual por aluno bem superior ao registrado no Brasil.
Implementação do novo ensino médio
Cada fase escolar tem seus próprios desafios, mas os problemas de uma sempre reverberam na outra. De acordo com o Censo Escolar de 2023, há 26,1 milhões de alunos matriculados no ensino fundamental em cerca de 121,4 mil escolas. No ensino médio, a última etapa da educação básica são pelo menos 7,7 milhões de matrículas, além de 2,5 milhões de estudantes na educação de jovens e adultos (EJA).
Esses estudantes enfrentam desafios socioeconômicos e questões ligadas a adolescência, além de estar em meio as mudanças que o governo tenta há nos implementar na etapa.
As mudanças no Novo Ensino Médio foram aprovadas no ano passado e geraram um novo cronograma de implementação a partir de 2025. Será de forma gradual e com suporte técnico para garantir uma transição estável, diz o MEC. A perspectiva é de que não haja mais mudanças na lei e que o foco seja a implementação.
“A proposta é revisitar as diretrizes curriculares, em colaboração com o Conselho Nacional de Educação, redes estaduais e especialistas e delinear claramente os itinerários formativos”, diz Janice.
Celular nas escolas

Para este ano, uma novidade já prevista no final do ano passado é a restrição do uso de celulares nas escolas. O Projeto de Lei 104/2015 foi aprovado nas duas casas do Congresso Nacional no final do ano passado. Ele restringe o uso de aparelhos eletrônicos portáteis, sobretudo de telefones celulares, nas escolas dos estabelecimentos públicos e privados de ensino infantil e médio de todo o país.
Agora é lei. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou o projeto na segunda-feira (13). Agora, então, fará um decreto em até 30 dias para regulamentar a nova legislação que passa a valer no início do ano letivo, em fevereiro. Janice Mendes aponta que há muitas vantagens no uso de celulares no contexto do ensino médio.
“É urgente pensar na inclusão tecnológica, no desenvolvimento das habilidades digitais para o mundo do trabalho, no acesso a recursos educativos, aplicativos e plataformas. Integrar o celular às práticas escolares pode ajudar a desenvolver essas competências”, afirma.
No entanto, ela também aponta desvantagens quando os estudantes usam o aparelho de forma descontrolada, sem fins pedagógicos e educativos. “Isso [o descontrole] tem um efeito negativo na tecnologia no contexto escolar. Não podemos negar que a tecnologia faz parte da vida, e com isso o que deveríamos pensar seria em como usá-la em sala de aula, como ferramenta para promover o acesso ao conhecimento”, pontua.
Leia mais: Lula sanciona lei que restringe uso de celular em escolas
Profissões e suas possibilidades
Todo o ciclo escolar da educação básica deve contribuir para o desenvolvimento pleno das pessoas ao dar para elas o conhecimento de mundo e inteligência socioemocional para entender e utilizar as suas habilidades pessoais na vida adulta. No Brasil, já se discute há anos se os estudantes do ensino médio saem da educação básica prontos para fazerem as melhores escolhas para o futuro.
Uma dessas discussões é o que fortalece o entendimento da necessidade dos itinerários formativos e de formação técnica já no ensino médio. “É essencial avançarmos na implementação de cursos profissionalizantes no ensino médio. Mas não podemos perder de vista a importância de uma educação superior de qualidade, que fomente o desenvolvimento humano e prepare o indivíduo para a crítica e complexidade do mundo contemporâneo”, destaca Janice.
A formação para o mercado de trabalho compreende o ensino superior e o ensino técnico e profissionalizante. Janice Mendes diz que o modelo de ensino superior do Brasil tem grande potencial para fomentar o desenvolvimento de habilidades pessoais que impactam diretamente a produção e a criação no mercado de trabalho. Mas diz que para maximizar esse potencial, é necessário aprimorar em aspectos como:
1 – Estratégias que integrem tanto o desenvolvimento acadêmico quanto às habilidades socioemocionais e criativas dos alunos;
2 – Aproximar mais das realidades do mercado de trabalho e das necessidades sociais e culturais dos estudantes;
3 – Oportunizar para que os estudantes apliquem o conhecimento de forma prática e criativa;
4 – Habilidades pessoais, como criatividade, liderança e colaboração, devem ser integradas ao currículo;
5 – E desenvolvimento de habilidades empreendedoras.

Desenvolvimento das capacidades
Mendes destaca que o ensino superior precisa estar mais conectado com a prática da atividade no mercado de trabalho, fomentar a colaboração, promover a autonomia do futuro profissional e promover a inovação naquela área. Nisto, para ela, não precisa fazer diferença entre ensino superior e o técnico, já que em suas definições essas diferenças já estão estabelecidas. Mas para ela, sim, é importante falar das diferenças entre ensino técnico e superior.
“O ensino técnico contribui para a formação de profissionais especializados para atuar em áreas específicas, muitas vezes atendendo às demandas imediatas de setores industriais e tecnológicos. Já o ensino superior, vai muito além da preparação técnica para uma profissão, pois tem como foco a construção do conhecimento teórico e prático de áreas específicas, desenvolvimento das capacidades de inovação, pesquisa, conhecimento crítico e reflexivo, liderança e tomada de decisões”, finaliza.
*Este conteúdo está alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), da Agenda 2030, da Organização das Nações Unidas (ONU). Nesta matéria, o ODS 04 – Educação de Qualidade.
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