O que você faria com 700 milhões de euros?

O que você faria se recebesse uma oferta para ganhar 700 milhões de euros, aproximadamente 3 bilhões e 650 milhões de reais, em um ano de trabalho? Pois essa foi a proposta recebida pelo jogador francês Kylian Mbappé, feita pelo Al-Hilal, time que pertence ao fundo soberano saudita e que eliminou o Flamengo na última edição do Mundial de Clubes da FIFA.

Para se ter uma ideia, além de oferecer 700 milhões de euros para Mbappé, a proposta saudita ainda envolve mais 300 milhões de euros para retirar o jogador de seu atual clube, o Paris Saint-Germain (PSG). Esse valor de transferência, inclusive, seria o recorde mundial, passando o que foi pago pelo próprio PSG para tirar Neymar do Barcelona. Em 2017, o time de Paris pagou uma cifra exorbitante de 222 milhões de euros pelo brasileiro.

Mbappe França Dinamarca
Kylian Mbappé durante Copa do Mundo de 2022, no Catar(Foto: Reprodução/Instagram França)

Sabe o que se dá para comprar com 1 bilhão de euros, o equivalente ao salário de Mbappé mais a taxa pela transferência do jogador? Você conseguiria comprar e ser dono de qualquer um dos 30 times mais valiosos do Brasil, de acordo com dados levantados pela revista especializada Forbes.

Ainda de acordo com a Forbes, com essa somatória você só não conseguiria comprar 14 times no futebol mundial. São eles: Real Madrid, Manchester United, Barcelona, Liverpool, Manchester City, Bayern de Munique, PSG, Chelsea, Tottenham, Arsenal, Juventus, Borussia Dortmund, Atlético de Madrid e Milan.

Situação de Mbappé

Em litígio com o PSG após dizer que não assinaria a cláusula de renovação automática com a equipe, Mbappé virou o centro das atenções do futebol mundial. Muitos dizem que o craque e possivelmente melhor jogador do mundo no futuro já teria se acertado para jogar no Real Madrid, clube ao qual o francês já foi associado inúmeras vezes nos últimos 5 anos.

Pois bem, Mbappé aparentemente disse não para a proposta de ser mais uma estrela na Liga da Arábia Saudita. Obviamente, com esse salário, o craque seria o jogador mais bem pago do mundo. Ele ultrapassaria por muito Cristiano Ronaldo, que joga no Al-Nassr, outro time do fundo soberano saudita.

Provavelmente, para Mbappé, pesa nesse momento sua posição como uma das principais estrelas do futebol mundial e do esporte. Pensando exclusivamente no ponto de vista desportivo e no prosseguimento de sua carreira, ir para a Arábia Saudita não parece ser o cenário mais estimulante. Mesmo que seja somente por um ano.

Até um ano sem jogar

Mas outro cenário muito desestimulante vivido pelo francês é sua atual situação com o PSG. O clube acredita que o jogador já assinou um acordo com o Real Madrid e se sente traído pelo craque. Por várias vezes, Mbappé afirmou que iria cumprir o seu último ano de contrato com a equipe francesa, mas que não renovaria. O que o time de Paris pretende fazer? Deixar a estrela sem jogar por toda a próxima temporada, como uma forma de puni-lo.

A situação é tensa e promete um desfecho nas próximas semanas. Até o governo francês e a Federação Francesa de Futebol (FFF) pensam em intervir na situação. O jogador será uma das referências e estrelas das próximas Olimpíadas, que serão realizadas em Paris, em 2024. Como o Mbappé irá conservar esse status se estiver fora de campo? Isso sem contar o ponto de vista da situação física do atleta.

Deu a louca no gerente

A Arábia Saudita é uma ditatura teocrática que utiliza o alcorão e os dogmas do islamismo como regras comportamentais e sociais. A sua visão perante o mundo ocidental, assim como o de qualquer país árabe e muçulmano, sempre é associada à ataque terroristas e privação de direitos humanos.

Que a Arábia Saudita está investindo pesado no futebol em uma tentativa de revitalizar a sua imagem internacional, demostrar força política e poder financeiro, isso todos já sabem. O que surpreende é a velocidade vertiginosa em que as mudanças estão sendo feitas. A atual janela de transferência foi um marco e um susto para todos aqueles que acreditavam que as investidas sauditas parariam em Cristiano Ronaldo.

Cristiano Ronaldo com camisa do Al Nassr (Foto: Divulgação/Al Nassr FC)

Karim Benzema, atual vencedor da bola de ouro, terminou a sua parceria com o Real Madrid, clube em que estava desde 2009 e que conquistou 5 títulos da Liga dos Campeões da Europa nesse período, para se transferir para Al-Ittihad, outro clube que pertence ao fundo soberano saudita. O “agravante” em toda essa situação é que Benzema vive indiscutivelmente os melhores anos de sua carreira, após passar quase 10 anos nas sombras de Cristiano Ronaldo.

Além de Benzema, Kanté, Mahrez, Henderson, Koulibaly, Brozovic, Firmino, Mendy e diversos outros jogadores da primeira prateleira do futebol mundial saíram de grandes clubes da Europa, ainda com possibilidades de se transferirem para outros times do continente, e ESCOLHERAM a Liga Saudita. Óbvio que os exorbitante salários em euros pesaram muito para essa decisão.

Eurocentrismo esportivo

A proposta por Mbappé, bem como o êxodo para o Oriente Médio tem chamado bastante atenção no mundo dos esportes. A Europa, que há anos mantem a soberania do futebol mundial, tanto na questão esportiva quanto financeira, teme pela desvalorização de seus campeonatos nacionais e internacionais. A ideia de um novo rico no pedaço que pode oferecer mais dinheiro aos jogadores é extremante preocupante para os times do velho continente.

Inclusive, na cabeça de muitos daqueles que acompanham os campeonatos europeus, o assédio saudita representa um possível fim do futebol como conhecemos. Ao longo das últimas décadas, até por uma questão de dinheiro, os clubes da Europa mantiveram uma clara hegemonia no esporte. Até por isso, o medo se “justifica”.

Desde o primórdio do esporte, não existe um cenário em que os europeus não estão no centro das conversas sobre futebol. Talvez (e só talvez) os clubes da América do Sul tenham conseguido fazer frente no século passado, principalmente nas décadas de 50, 60, 70 e 80, mas no fim o dinheiro acabou falando mais alto. Essa mudança, por razões claras, é um tiro contra o eurocentrismo esportivo.

Repercussão

Para Pep Guardiola, um dos maiores técnicos do mundo e atual campeão da Liga dos Campeões da Europa, a Liga Saudita não é uma ameaça, mas sim uma realidade. Em entrevista nesta última semana, o treinador espanhol faz uma análise de que a Arábia Saudita mudou o mercado. “No futuro, haverão mais (jogadores saindo da Europa para o Oriente Médio) e precisamos estar cientes disso”, apontou.

Já nos Estados Unidos, nomes como LeBron James, Draymond Green, Demian Lillard e Giannis Antetokounmpo reagiram à proposta salarial de Mbappé. Em tom de brincadeira (será?) nas redes sociais, os jogadores se disponibilizaram a jogar na Arábia Saudita. As declarações se estenderam para atletas de outras ligas, como a NFL, de Futebol Americano, e MLB, de beisebol.

Apesar de ser tratada como brincadeira, será que a proposta da Arábia Saudita do uso do futebol para melhorar a sua imagem poderá migrar para outros esportes? E se sim, será que grandes estrelas do basquete, do vôlei e etc aceitariam fazer esse movimento de êxodo para o Oriente Médio?

Muitas perguntas sobre o futuro da geografia mundial do esporte ficam no ar, e, de concreto, somente a frase de Guardiola: A Arábia Saudita já é o presente.

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