Goiânia pode enfrentar uma situação crítica de desabastecimento de água caso as chuvas, esperadas para o final de outubro e início de novembro, não se regularizem nos próximos dias. De acordo com o professor e engenheiro agrônomo, dr. Antônio Pasqualetto, embora tenha ocorrido precipitação nos últimos dias, ela não foi suficiente para afastar o risco de racionamento ou rodízio no abastecimento público.
“Bem, previsão é difícil de ser feita, dado que depende das precipitações”, explicou. “Agora, o que existe sim é um cenário mais ou menos traçado de que, se a chuva não chegasse até o dia 10 de outubro, nós já poderíamos entrar num nível crítico de fornecimento de água para Goiânia”, acrescentou.
Atualmente, a situação dos mananciais que abastecem a cidade é preocupante, e as autoridades acompanham de perto a evolução das condições climáticas. Sendo assim, a expectativa é de que a regularização das chuvas ocorra até a primeira quinzena de novembro. Isso aumentaria o nível dos rios e afastaria o risco iminente de desabastecimento.
“A regularização da vazão dos cursos e também de abastecimento público vai se dar a partir da regularização das chuvas, que vai acontecer no final de outubro, início de novembro, provavelmente na primeira quinzena de novembro”, detalhou. “Porque aí o nível dos rios aumenta e a gente sai daquela situação de risco que estaria colocado para esse momento”, completou.
Mudanças climáticas e abastecimento de água
As mudanças climáticas estão afetando de forma significativa o regime de chuvas no Brasil, especialmente nas regiões centrais, como o Centro-Oeste. Enquanto o setor de energia elétrica implementou o sistema de bandeiras tarifárias, que reflete os custos adicionais de produção, o setor de abastecimento de água ainda não adota uma política semelhante, apesar de depender dos mesmos recursos hídricos.
O Brasil, historicamente, baseava sua matriz energética principalmente em fontes hídricas. “No passado, nossa matriz energética era extremamente dependente de fonte hídrica. Hoje, ela responde por aproximadamente 60% do total, já não como antigamente, quando era mais de 90%”, explicou Pasqualetto.
Apesar dessa redução na dependência de fontes hídricas para energia, ainda há a cobrança de bandeira tarifária na conta de energia. Enquanto isso, não há uma cobrança equivalente na conta de água. Então, isso levanta questões sobre a forma como o país lida com a gestão de seus recursos naturais.

“O que está se observando com o passar dos anos são extremos climáticos. Chuvas em excesso no sul e secas nas regiões mais centrais do Brasil”, destacou. Ele apontou ainda um dado alarmante: em Goiânia, por exemplo, estudos entre 1979 e 2015 mostram uma redução de 3,7 mm por ano nas precipitações. Além disso, há uma mudança no padrão das chuvas. “Estamos vendo que, além de reduzir os dias chuvosos, a chuva, quando vem, ocorre em curtos períodos de tempo, o que dificulta o armazenamento e infiltração da água no solo”, explicou.
Investimentos
As consequências disso são secas mais prolongadas e uma estação chuvosa com menor volume de água. Para lidar com esse cenário, o especialista ressaltou a importância de investimentos em infraestruturas, como reservatórios, que são soluções caras. No entanto, o ideal seria adotar medidas preventivas. Por exemplo, o aumento da infiltração de água no solo e a preservação de matas ciliares, que ajudam a regular o ciclo hidrológico.
“A grande questão é como vamos regularizar essa vazão ao longo do ano. Isso vai requerer uma série de investimentos em infraestrutura de engenharia, como reservatórios. Mas o ideal seria estocar essa água filtrando no solo e mantendo matas ciliares, de modo que as precipitações fossem mais frequentes e de menor intensidade”, apontou.
A gestão dos recursos hídricos no Brasil é um desafio que envolve múltiplos atores, desde órgãos de saneamento até comitês especializados. Segundo o especialista, as secretarias estaduais e órgãos como a Saneago têm uma responsabilidade central nesse processo, garantindo o abastecimento de água para diversos usos, como consumo humano, agricultura e atividades industriais.
De acordo com o professor, “os órgãos de planejamento e de gestão de recursos hídricos são responsabilidade tanto do Estado quanto da União. Isso acontece porque temos rios estaduais e federais, e cabe a essas instâncias a função de legislar e gerenciar esses recursos.”
Comitês
Esses órgãos, além de suas funções de planejamento, contam com o apoio de comitês de bacia hidrográfica, que são cruciais para garantir o uso sustentável da água. “Os comitês de bacia hidrográfica são estruturados dentro do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos e têm um papel muito importante, pois neles estão representados os usuários, o governo e a sociedade civil. Juntos, eles fazem uma análise diagnóstica da disponibilidade hídrica e projetam cenários futuros,” explicou.
Essas análises, feitas pelos comitês, orientam a alocação de recursos para novos projetos de captação e construção de infraestruturas hídricas. “Eles norteiam todo o processo de recuperação de áreas para aumentar a disponibilidade de água e melhorar sua qualidade. O papel desses comitês é fundamental,” acrescentou o especialista.
A Saneago, por exemplo, tem suas próprias estratégias e planejamentos para garantir a captação e distribuição de água em quantidade suficiente e dentro dos padrões de potabilidade exigidos. “O papel dos órgãos de saneamento é justamente fornecer água para a população dentro dos padrões de potabilidade e em quantidade suficiente, para não haver falta,” afirmou.
Legislação
Além do fornecimento, a legislação e a fiscalização por parte do governo federal e estadual são essenciais para garantir a implementação de forma eficiente dos planos de gestão dos recursos hídricos.
“O papel dos órgãos do Estado, tanto federal quanto estadual, é serem propositivos em legislações e fiscalizações, de tal maneira que os planos de recursos hídricos possam ser implementados. E, com isso, você não tenha problemas de racionamento ou escassez hídrica, não apenas para o abastecimento público, mas também para as atividades comerciais, industriais e agrícolas,” concluiu.
Essa abordagem integrada é essencial para enfrentar os desafios atuais e futuros relacionados à água, garantindo que esse recurso vital esteja disponível de forma sustentável para todos os setores da sociedade.
*Este conteúdo está alinhado ao Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS), na Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU). ODS 06 – Água Potável e Saneamento