No dia 9 de setembro, o julgamento de André de Camargo de Aranha chegou ao fim. A blogueira Mariana Ferrer o acusou de estupro enquanto estavam em um beach club, em Florianópolis (SC), em 2018. O réu acabou absolvido. No começo do mês de novembro, o site The Intercept divulgou imagens inéditas da audiência. De acordo com o portal de notícias, a sentença foi uma espécie de ‘estupro culposo’.

Para falar sobre esse assunto, o Debate Super Sábado dessa semana teve a participação de Bárbara Camargo Alves, delegada da Casa da Mulher Brasileira de Campo Grande, Ariana Garcia, presidente da Comissão da Mulher Advogada e Cida Alves, psicóloga e co-fundadora do bloco Não é Não. As convidadas também abordaram as falhas da justiça no caso.

De acordo com Cida Alves, a vítima não cometeu nenhum erro durante a audiência. “Infelizmente, o que aconteceu com a Mariana Ferrer é uma rotina que a gente acompanha diariamente. Quando a vítima consegue unir força para denunciar, ela recebe da sociedade uma culpabilização. O caso dela [Mari] foi de violência psicológica tremenda, eu espero que esteja bem assistida por um profissional da área da psicologia,” complementou.

Nas redes sociais, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) se manifestou sobre a audiência. “As cenas da audiência de Mariana Ferrer são estarrecedoras. O sistema de Justiça deve ser instrumento de acolhimento, jamais de tortura e humilhação. Os órgãos de correição devem apurar a responsabilidade dos agentes envolvidos, inclusive daqueles que se omitiram”, publicou o ministro.

Julgamento por quatro homens

As debatedoras lembraram que pela Lei Maria da Penha, as varas de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e a Promotoria Especializada em Atendimento à Violência Doméstico são titularizadas por mulheres. No entanto, o caso de Mariana não se enquadra nessas varas porque aconteceu fora do ambiente doméstico. “Não tem como garantir se a promotoria ou o juiz serão do sexo feminino”, disse Bárbara.

“Eu acho que faltou sensibilidade da defensoria pública de defender a vítima. De colocar uma outra mulher na função de defesa. É muito grave falar que a vítima foi colocada na frente de quatro homens para ser acusada por eles. A parte mais interessante do vídeo é perceber o interrogatório do André e comparar como ele foi tratado e como ela foi”, resumiu.

Segundo Ariana Garcia, nessas situações, o que se espera da mulher é o silêncio, e que fique com uma postura de perdedora. Entretanto, não viram a Mariana como indefesa pelo fato de esta se posicionar diante da omissão do juiz. Além disso, que a audiência foi um palco de erros e é preciso rever as posturas do profissionais do Direito.

Formato do julgamento

A saber, em Santa Catarina, as audiências presenciais estão suspensas por conta da pandemia. Dessa forma, o caso de Mariana, que aconteceu de forma virtual, foi uma exceção. Segundo… o formato do julgamento foi mais delicado.

“A justificativa do juiz de que ela foi privilegiada por ter tido o julgamento, não convence. Do que adianta fazer uma sessão para torturar a vítima? Então não aceitamos essa fala”, afirmou Cida Alves.

Por outro lado, Bárbara acredita que se o julgamento fosse presencial, as atitudes do advogado seriam bem mais intensas.

“Esse tipo de comportamento de colocar a vítima no banco dos réus é antigo. A gente vê isso acontecer décadas e décadas a fio. É muito importante que tenha acontecido essas manifestações, porque a gente precisa retirar esse debate do âmbito jurídico e colocar no colo da sociedade, discutir na sociedade como um todo para que os homens consigam tratar sobre isso”.

A advogada comentou que o formato da audiência deveria tanto fazer. Sendo assim, o que deveria mudar é a postura dos homens perante a vítima Mariana Ferrer. Ainda, mudar no geral as estratégias de defesa, não colocando a mulher como culpada.

As convidadas finalizaram mandando uma mensagem para as mulheres não desistirem. Olhar a audiência e não se intimidarem, mas sim encorajadas.

Mariana Tolentino é estagiária do Sistema Sagres de Comunicação, em parceira do Iphac e a Unialfa, sob supervisão do jornalista Johann Germano