Antes da pandemia da Covid-19, a preocupação sanitária com o lixo hospitalar já era uma realidade discutida por ambientalistas e especialistas da área da Saúde. Após da pandemia, a situação se agravou; Um relatório da OMS (Organização Mundial da Saúde) indica um alerta de risco mundial sobre a quantidade de lixo hospitalar produzido após o início da pandemia. Os números impressionam:

  • 87 mil toneladas de equipamento de proteção individual (EPI)
  • 140 milhões de kits de testes de Covid-19
  • 2,6 mil toneladas de resíduos sólidos
  • 731 mil litros de resíduos químicos
  • 8 bilhões de doses de vacina

Assista à reportagem a seguir

Em 2020, o aumento na produção de resíduos superou 70% do que era gerado antes da pandemia. Por ser um lixo que precisa de acondicionamento e tratamento especial devido ao risco de contaminação, o descarte não pode ser executado em aterros comuns. É necessário um processo de descontaminação por meio de usinas de bio resíduos. O diretor de uma destas usinas em Aparecida de Goiânia, Paulo Maia, conta como funciona o processo por meio da autoclave.

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“Nós temos o tratamento chamado autoclave, que é um sistema por pressão e vapor de água que descontamina todos os resíduos dos serviços de saúde dos grupos A e E. O material chega até a usina em caminhões com padrões determinados pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), onde é separado pelos coletores e encaminhados para a máquina de autoclave, onde fica por cerca de uma hora em descontaminação. Após isso vai para outra máquina, onde é triturado e direcionado para os aterros sanitários especiais”, explica.

Estes grupos citados pelo diretor da usina referem-se à classificação do risco de contaminação dos resíduos, veja como funciona:

  • Grupo A – Potencialmente infectante
  • Grupo B – Químicos
  • Grupo C – Rejeitos radioativos
  • Grupo D – Resíduos comuns
  • Grupo E – Perfurocortantes

Usinas de Recuperação Energética e Economia Circular

Foto: Pexels.com

Com essa quantidade de lixo gerado, os aterros sanitários estão sobrecarregados, e há uma forma de gerar energia através destes resíduos, como conta a engenheira ambiental Nathália Araujo.

“Uma forma de resolver o problema do lixo hospitalar de forma sustentável é através das usinas de biomassa, que são mais eficientes, uma vez que utilizam o composto orgânico produzido, o lixo como matéria-prima para a geração de energia elétrica. O material é encaminhado para caldeiras, onde é mergulhado em fogo. Consegue-se a partir daí a formação de gases capazes de movimentar turbinas, e consequentemente a geração de energia elétrica. Ao final do processo geram também um resíduo mais compacto, possibilitando a diminuição da necessidade de mais área para o descarte do material”, esclarece.

A engenheira ambiental Nathália Araújo (Foto: TV Sagres)

O presidente da Associação Brasileira de Recuperação Energética de Resíduos, a Abren, Yuri Schmitke, salienta que o Brasil ficou atrás na comparação com países como Alemanha e Estados Unidos.

Ele explica que estes tipos de usinas de recuperação energética são comumente inseridas na economia destes países, protegendo o meio ambiente e produzindo a economia circular, conceito criado para reduzir o impacto do mercado no meio ambiente.

Neste tipo de economia, o produto vai para o mercado, e volta quantas vezes possíveis para que não seja descartado como resíduo, mas seja convertido em matéria-prima para a cadeia de produção, formando assim um ciclo de produção sustentável.

O presidente da Abren, Yuri Schmitke (Foto: Sagres TV)

“Está faltando gestão no Brasil para melhorar o tratamento dos resíduos hospitalares, 30% dos RSS, sigla utilizada para denominar lixos gerados por serviços de saúde, vão para aterro sem qualquer tipo de tratamento. O descarte é feito em lixões, causando graves problemas de saúde pública para o país. É preciso fazer o tratamento correto, por meio de incineração, autoclave ou micro-ondas antes do descarte deste resíduo”, afirma.

Yuri destaca ainda que, só na Europa, mais de 1.500 usinas de recuperação energética estão em atividade, enquanto no Brasil, a primeira contratação de uma usina deste tipo foi em setembro do ano passado em um leilão da Aneel, a Agência Nacional de Energia Elétrica.

”Nós não temos nenhuma usina destas operando no Brasil. Esta primeira foi contratada ano passado e deverá entrar em operação comercial nos próximos 3 a 4 anos”, explica.

Pela frente resta o caminho do aprendizado. É necessário aprender com os países que já estão buscando soluções de energia limpa e renovável. A sustentabilidade não é apenas um conceito teórico, é preciso que seja inserida em nosso dia a dia. Na próxima reportagem da série especial Repense, você vai conferir como o desperdício de alimentos impacta o mercado e as pessoas.

Sinval Lopes é estagiário do Sistema Sagres de Comunicação, em parceria com o IPHAC e o Centro Universitário FASAM, sob a supervisão da jornalista Luciana Maciel.